Em longa discussão, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) voltou a analisar se os gastos com fretes na aquisição de veículos de fábrica por concessionárias para posterior revenda geram créditos de PIS e Cofins no regime monofásico. Está em pauta a possibilidade de a turma alterar entendimento já consolidado pela 1ª Seção, que em 2012 decidiu pelo creditamento.
Os produtos sujeitos ao regime monofásico de tributação do PIS e da Cofins são, por exemplo, óleo diesel, biodiesel, produtos farmacêuticos, produtos de perfumaria ou de higiene pessoal e veículos. A sistemática de recolhimento é semelhante à substituição tributária do ICMS, e concentra o pagamento dos tributos em um único elo da cadeia produtiva.
O caso foi iniciado em fevereiro, e suspenso após pedido de vista do ministro Gurgel de Faria. Nessa terça-feira (10/4) o magistrado divergiu do relator Napoleão Nunes Maia Filho, ao entender não ser possível o creditamento.
Segundo Gurgel de Faria, apesar de a 1ª Seção já ter firmado precedente pelo creditamento, o tema está aberto novamente, já que embargos de divergência foram admitidos e podem levar à rediscussão da matéria.
No caso, a Fazenda Nacional sustenta a existência de vedação legal ao creditamento. Já a concessionária afirma que a Lei 10.833/2003 permite o desconto de créditos relativos ao frete suportado pelas revendedoras de veículos nas operações de venda de veículos novos.
A discussão ficou por conta da possibilidade de a 1ª Turma não seguir o precedente sobre o tema da 1ª Seção do tribunal, responsável por unificar as discussões de Direito Público.
Segundo a ministra Regina Helena Costa, o tribunal tem a obrigação de manter a jurisprudência estável, íntegra e coerente, como prevê o artigo 926, caput, do novo Código de Processo Civil. A norma foi chamada pela ministra como “um puxão de orelha no Judiciário”.
“A gente pode evoluir, mas isso precisa ser feito como previsto em lei. Por mais que a gente não goste da decisão, não podemos deixar de observar o precedente. A rediscussão deve ocorrer na 1ª Seção, enquanto isso não acontece, não vejo como dar de ombros a um precedente válido. Como justificar alteração se não houve debate próprio? Não se pode tentar alterar na turma aquilo que não se conseguiu na seção”, ressaltou.
A discussão foi interrompida com o pedido de vista do ministro Benedito Gonçalves. Os ministros Sérgio Kukina e Regina Helena Costa ainda não votaram no caso.
Decisões
Em agosto de 2012, a 1ª Seção consolidou o entendimento de que na apuração do valor do PIS/Cofins permite-se o desconto de créditos calculados em relação ao frete também quando o veículo é adquirido da fábrica e transportado para a concessionária – adquirente – com o propósito de ser posteriormente revendido (REsp. 1.215.773).
A própria 1ª Turma seguiu, por unanimidade, o entendimento consolidado na seção em março deste ano ao julgar o REsp 1.583.876. No entanto, a 2ª Turma do tribunal afetou o REsp 1.668.907, que trata sobre o mesmo tema, à 1ª Seção para possivelmente reanalisar a matéria.
Produtos farmacêuticos
A mesma discussão, isso é, o direito de crédito no regime monofásico, também atinge o setor farmacêutico. Em março de 2017, a 1ª Turma do STJ, permitiu a aplicação da Lei 11.033/04 a contribuintes não integrantes do Reporto, regime tributário diferenciado para incentivar a modernização e ampliação da estrutura portuária nacional.
No caso analisado no Resp 1.051.634/CE, a distribuidora atacadista revendedora de produtos farmacêuticos (Empreendimentos Pague Menos S/A) pedia o reconhecimento de que pode aproveitar créditos de PIS/Cofins pelas suas entradas independentemente de suas saídas estarem submetidas à alíquota zero e ao regime de incidência monofásica.
Na ocasião, a maioria dos ministros seguiu o voto da ministra Regina Helena Costa, para quem o fato de os demais elos da cadeia produtiva estarem desobrigados do recolhimento dos tributos – à exceção do produtor ou importador responsáveis pelo recolhimento a uma alíquota maior -, não é óbice para que os contribuintes mantenham os créditos sobre todas as aquisições por eles efetuadas.
Até então, a jurisprudência do tribunal pendia para a impossibilidade do contribuinte se apropriar dos créditos de PIS e Cofins no sistema monofásico.
A 2ª Turma do tribunal, ao julgar o AREsp 537.105, por exemplo, negou o direito ao crédito ressaltando que a técnica do creditamento visa afastar a incidência do tributo em cascata, o que não ocorre no regime de tributação monofásica, segundo o qual a incidência do tributo é concentrada no produtor ou importador do produto.
Livia Scocuglia – Brasília