Promessa de vida de luxo e retorno rápido do investimento fazem quem quer lucrar fácil cair numa armadilha. Os envolvidos nos negócios fraudulentos até recebiam as primeiras parcelas, mas acabavam perdendo tudo

 

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Polícia Civil apreendeu veículos importados dos responsáveis pela moeda falsa Kriptacoin, numa operação que condenou 13 pessoas(foto: Ed Alves/CB/D.A Press )

As características são sempre as mesmas. Milhares de pessoas atraídas por promessas de rendimento rápido dos seus investimentos e pela possibilidade de ter uma vida de luxo. A popularização de investimentos na Bolsa de Valores, em fundos de renda fixa e em criptomoedas deu munição para que golpistas de todo o país aumentassem seu poder de persuasão. Até outubro deste ano, a Unidade de Inteligência Financeira (UIF), ligada ao Ministério da Economia, registrou 11 casos suspeitos de esquema de pirâmide financeira. No ano passado, foram 10. Em 2017, ao todo, foram 12 e, em 2016, apenas 5, o que revela uma atividade ilegal em ascensão. Uma empresa com sede em Taguatinga, no Distrito Federal, com 10 mil clientes cadastrados, está na mira das autoridades, que suspeitam de envolvimento com essa atividade ilícita (veja na página 9).



Este ano, a Comissão de Valores Mobiliários, entidade responsável pela fiscalização do mercado financeiro, vai bater recorde de multas aplicadas contra fraudes, o que inclui pirâmide, concorrência desleal, lavagem de dinheiro, entre outros. Somente até o segundo trimestre deste ano, foram aplicados R$ 770 milhões em multas, mais que o dobro dos R$ 350 milhões de todo o ano passado. Na modalidade de pirâmide, as vítimas aplicam recursos e são convencidas a levar mais pessoas para o “negócio”. A promessa é de que, com a entrada de mais clientes, o “associado” recebe uma comissão por quem ele indicou, e assim, quanto mais gente ele convencer a aderir ao programa, mais dinheiro cairá na sua conta.



O “investidor” até chega a receber algumas parcelas, como forma de mascarar o esquema. No entanto, logo o negócio perde sustentação e apenas quem está no topo da pirâmide, ou seja, os fundadores, adquirem um patrimônio milionário. O primeiro sinal do golpe é o fato de a empresa se preocupar mais em atrair novos integrantes para o sistema financeiro de fachada do que elevar a qualidade de seus produtos. É comum que a venda de algum tipo de serviço ou produto seja oferecido para dificultar o trabalho das autoridades e enganar mais pessoas.

Há pouco mais de um mês, a Polícia Federal deflagrou uma operação contra a companhia gaúcha Unick Forex, acusada de montar um esquema de pirâmide, e que era investigada por atuar no mercado financeiro sem autorização das autoridades competentes, com a captação ilegal de recursos de cerca de 1 milhão de clientes.



O inquérito policial foi instaurado em janeiro deste ano e apurou que os clientes do grupo eram atraídos pela promessa de retorno de 100% sobre o valor investido, no prazo de seis meses, ou um retorno de até 3% ao dia. Com o apoio da Receita Federal, a corporação identificou captações que chegaram a R$ 40 milhões por dia desde 2017 pela Unick, que usava as redes sociais e aplicativos como o WhatsApp para enviar vídeos e ofertas.



A estimativa da Polícia Federal é que as captações da Unick chegaram a R$ 2,4 bilhões. Ficou constatado durante as investigações que a empresa cometeu, além da captação irregular de poupança popular, evasão de divisas e lavagem de dinheiro. O grupo tinha um escritório no paraíso fiscal de Belize e planos de expansão para o exterior. O dinheiro dos investidores era aplicado no chamado mercado de Foreign Exchange (Forex), de compra e venda de moedas, operações somente autorizadas às instituições financeiras oficiais — hoje, não há instituição brasileira autorizada a atuar em Forex.

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Golpistas ostentavam relógios, joias e carros nas redes sociais (foto: Reprodução – 21/9/17 )

Kriptacoin 

Em Brasília, um dos casos mais emblemáticos de pirâmide financeira culminou na condenação de 13 pessoas por crime contra a economia popular, ocultação de bens, falsidade ideológica, organização criminosa e lavagem de dinheiro. O grupo Wall Street Corporate, que iniciou as operações em 2017, induzia as vítimas a aplicar dinheiro em uma moeda virtual falsa, intitulada Kriptacoin, com a promessa de 1% de lucro ao dia. Os envolvidos ostentavam uma vida de luxo nas redes sociais e transitavam pela cidade em veículos importados, com o objetivo de atrair novos clientes. A estimativa é de que mais de 40 mil investidores foram prejudicados e os criminosos tenham lucrado aproximadamente R$ 250 milhões em seis meses de atuação. A Kriptacoin chegou a inaugurar uma sede em Vicente Pires-DF.



Parte do dinheiro arrecadado era direcionado para pagar os investidores, mas, como os rendimentos eram prometidos apenas após um ano, os clientes não receberam nenhum retorno. A maioria dos recursos, na verdade, era utilizada pelos líderes e subordinados do esquema, como para a compra de bens de luxo em nome de laranjas. A organização criminosa foi desmontada em outubro de 2017 pela Polícia Civil de Brasília. Grande parte das pessoas só descobrem que foram enganadas quando não conseguem mais contato com a empresa para retirar o dinheiro que haviam aplicado. Nestes casos, mesmo com o esquema sendo desbaratado, as autoridades podem ter dificuldades em localizar onde está o dinheiro. O prejuízo das vítimas pode nunca ser recuperado, mesmo com a prisão dos organizadores do esquema.

 

Correio Braziliense 

AF Augusto Fernandes RS Renato Souza