Reforma do IR vai aumentar impostos para maioria das empresas, diz especialista
Daniel Nogueira criticou projeto aprovado na Câmara e a falta de debate sobre o tema com a sociedade
O texto-base da proposta de reforma no Imposto de Renda aprovado na Câmara dos Deputados nesta semana prevê aumento de tributos para a maioria das empresas, avalia o especialista em IR, Daniel Nogueira.
Em entrevista à CNN, ele afirmou que a reforma tributária é apenas uma alteração na legislação do imposto de renda vigente, e criticou a falta de debate com especialistas e sociedade sobre o tema.
“Tem uma série de pontos que esperamos que o Senado reveja e faça essas alterações, não só pelos impactos para as prefeituras e estados, mas também para a sociedade como um todo”, disse.
Estados e municípios reclamam da reforma tributária, aprovada pela Câmara com apoio do governo federal, por causa da perda de arrecadação provocada pela correção da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF).
Para Nogueira, além do prejuízo aos governos estaduais e municipais, empresas também serão impactadas caso o texto passe no Senado sem alterações.
“Inicialmente ninguém ganha. Algumas empresas, que estão no regime do Simples Nacional ou de lucro presumido e faturam até R$ 4,8 milhões por ano, terão redução na carga tributária”, disse. “Porém, para grande maioria das outras empresas, que faturam mais que isso, na realidade haverá um aumento na carga tributária, e não uma redução”, completou.
“Essas empresas hoje pagam, em média, 34% de renda e contribuição social. O texto reduz isso pra 26%, mas, por outro lado, cria-se o imposto de renda sobre lucros e dividendos de 15% — então sai de 34% e, no final, acaba recolhendo 37%”, detalhou o especialista.
Com governo 'fraco', liberais defendem que Guedes abandone reformas: 'vai piorar o que está ruim'
Essa é a avaliação de economistas que viam como positiva a agenda de reformas proposta pela equipe econômica e que, agora, enxergam risco de retrocesso diante da fragilidade de Bolsonaro e da influência das eleições de 2022 nas decisões do governo.
Pelo menos dois elementos hoje tornam o ambiente em Brasília desfavorável à aprovação de reformas, pontua o economista sênior da MCM Consultores Mauro Schneider.
Primeiro, um governo enfraquecido — como é o caso de Bolsonaro, com índice de aprovação na casa dos 24% — é menos propenso a desagradar determinados setores e, por isso, é mais permeável a pressões.
É o que parece ter acontecido com a reforma do Imposto de Renda, ele exemplifica. Depois de um vai-vem com pressões feitas por diversos grupos, o texto aprovado nesta quarta-feira (1/9) na Câmara dos Deputados cria ainda mais distorções no sistema tributário, segundo especialistas.
Para além da piora da proposta inicial, a própria decisão de pautar a reforma do IR seria um indicativo de que o ciclo eleitoral é de fato a prioridade do governo, já que há outras propostas no Congresso consideradas mais importantes para o esforço de simplificação do sistema tributário, como a reforma dos impostos sobre consumo, como ICMS e PIS/Cofins.
"Aqueles que têm criticado dizem que o IR entrou na frente porque geraria o benefício de agradar a classe média", diz Schneider à BBC News Brasil.
Em relatório enviado a clientes da consultoria no fim de agosto, o economista avalia que seria melhor paralisar a agenda de reformas "para se evitar o risco de aprovação de medidas que provoquem uma piora do ambiente econômico no país".
O ex-secretário do Tesouro Carlos Kawall, hoje diretor do ASA Investments, faz avaliação semelhante. Se o "normal", com a proximidade do calendário eleitoral, seria já não termos um momento favorável para a aprovação de reformas, diante da atual conjuntura ele acaba se tornando desfavorável.
"Temos riscos de aprovar reformas que não só não sejam um avanço na direção que a gente quer — do ponto de vista da consolidação da aceleração do crescimento econômico, geração de emprego —, mas que retrocedam em coisas que já foram conquistadas", pontua o economista.
"O que está se buscando agora é menos fortalecimento do arcabouço institucional e mais a aprovação de medidas de alívio fiscal com intuito eleitoral", acrescenta, mencionando a reforma do IR e a PEC dos precatórios, que propõe parcelar dívidas da União constituídas por decisões judiciais com trânsito em julgado para que o governo possa acomodar uma expansão do gasto com seu novo Bolsa Família.
Os sinais preocupantes, contudo, são anteriores e já apareciam desde a tramitação do Orçamento de 2021, diz Kawall. A peça foi aprovada em março, com três meses de atraso, uma série de despesas subestimadas e cerca de 22% do total de investimentos direcionados para o Ministério da Defesa.
O valor previsto para as emendas parlamentares, que os deputados e senadores utilizam para gastar em obras em seus redutos eleitorais, bateu recorde e atingiu R$ 48,8 bilhões. Após a sanção presidencial, o custo das emendas caiu para R$ 33,8 bilhões, que ainda assim é recorde: quase três vezes o total aprovado em 2019, no primeiro ano do governo Bolsonaro, R$ 13 bilhões.
"A gente está discutindo o 'meteoro' [termo usado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes] dos precatórios, mas a gente tem que lembrar que houve um 'meteoro' das emendas parlamentares também neste ano, né?", comenta Kawall.
"Se a gente tivesse resolvido aquele meteoro anterior de outra maneira — e ainda podemos pro ano que vem —, talvez o dos precatórios não fosse tão problemático."
O 'risco jabuti'
Schneider relembra o caso mais recente da capitalização da Eletrobras, outra evidência de que a fragilidade do governo pode se materializar em distorções importantes nas propostas que tramitam pelo Congresso.
"O caso foi muito simbólico porque a MP acabou levando junto na sua aprovação os famosos 'jabutis'", diz ele, referindo-se aos adendos feitos no texto que não têm relação com o tema da proposta.
Entidades do setor elétrico avaliam que os jabutis da MP que abre caminho para a privatização da estatal podem aumentar ainda mais o preço da energia consumida no país — contrariando o discurso do governo de que a proposta poderia baixar as contas de luz em 7,36%.
Um dos pontos incluídos traz a previsão de contratação obrigatória de termelétricas a gás natural em diferentes regiões do país, medida que exigiria investimento para aumentar a infraestrutura de gasodutos existente. Outro prevê uma reserva de mercado para energia produzida por pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), o que, na prática, vai na contramão da livre concorrência.
"O caso da Eletrobras não foi um jabuti, foi um Projeto Tamar inteiro, né?", brinca o economista José Roberto Mendonça de Barros, ex-secretário de Política Econômica.
No fim de maio, em artigo publicado do jornal O Estado de São Paulo e intitulado Reformas à Moda do Centrão, ele dizia julgar prematuro e exagerado o otimismo que o mercado financeiro demonstrava naquele momento com a tramitação das reformas após a aliança entre governo e o Centrão — um amálgama de partidos que tradicionalmente se aproximam do Executivo na tentativa de colher vantagens, seja na forma de cargos na administração pública ou de recursos que possam injetar em seus respectivos redutos eleitorais para garantirem suas reeleições.
"O que eu queria dizer [no texto] era, ora, aprovar alguma coisa eles vão, mas a qualidade do que vai ser aprovado, se de fato vai valer a pena, é que é o problema."
A reforma do Imposto de Renda, diz ele, é uma das que mais urgentemente merecia ser descartada: "É tão inconsistente que é melhor não sair nada".
A aprovação do texto na Câmara nesta semana foi alvo de duras críticas por parte tanto de economistas liberais quanto dos chamados desenvolvimentistas, dois grupos que em geral estão em polos opostos das discussões.
Sócio-fundador da Macro Capital Gestão de Recursos e ex-economista-chefe do banco Credit Suisse, Nilson Teixeira lembra que ainda antes de começar a ser discutida pelos deputados a proposta já era frágil.
Depois de entregar o projeto, Paulo Guedes chegou a afirmar em entrevista que os cálculos da Receita Federal haviam sido muito conservadores, gerando erro na calibragem das alíquotas propostas — o que levou a uma alteração no texto.
"Eles estavam há dois anos para soltar uma proposta e soltaram aquilo. Qual a confiança que se tem quando eles mesmos não tinham convicção no projeto?", disse à BBC News Brasil.
A esse elemento ele acrescenta a "fraca participação" do Executivo, incluindo o presidente, na coordenação da tramitação no Congresso, para costurar a negociação entre as diferentes vozes (e interesses) envolvidas no processo.
Em um artigo publicado no jornal Valor Econômico na última semana, intitulado Como Não Fazer Uma Reforma, Teixeira descreve em 11 pontos porque a proposta de reforma do IR é um "roteiro quase perfeito de como não agir para implantar um sistema tributário eficaz e sem distorções".
O economista diz que valeria a pena discutir e aprovar novas reformas, mas de forma diferente do modus operandi nos últimos meses. Ele admite, contudo, que os "incentivos" vão no sentido contrário de uma mudança, com a antecipação do debate eleitoral e o nível alto de polarização política.
"Aprovar por aprovar não me parece bom, principalmente se for para aumentar ou perpetuar privilégios", diz ele, mencionando a reforma administrativa, que mexe nas carreiras do funcionalismo público e também tramita na Câmara.
Fim de ICMS sobre transações da mesma empresa pode começar em 2022, diz Fachin
Decisão do STF derrubou cobrança de imposto no deslocamento de produtos de um estado para outro quando feito dentro de empresa com a mesma titularidade
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin votou para que o fim da cobrança do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) no deslocamento de produtos entre estabelecimentos de um mesmo dono, em estados diferentes, passe a valer em 2022.
A mudança deve resultar em alguma redução na carga de impostos paga pelas empresas que têm operações em mais de uma região. Por outro lado, preocupa os estados, que têm no ICMS a sua principal fonte de receitas e temem a queda de arrecadação.
Ela diz respeito a uma decisão tomada pelo STF em abril: a Corte considerou inconstitucional a cobrança de ICMS que é feita quando uma empresa transporta uma mercadoria para outras unidades suas, em estados diferentes.
É isto o que estava previsto na lei de 1996 que disciplinou o imposto estadual, conhecida como Lei Kandir. Desde então, porém, o tema é fonte de conflito entre empresas e estados no Judiciário, com entendimentos difusos.
A conclusão definitiva do STF foi de que o ICMS só deve ser aplicado quando há uma transferência jurídica dos produtos, ou seja, quando passa de um dono para outro, e não apenas na transferência física, entre estabelecimentos de uma mesma titularidade.
Agora, os ministros têm até 14 de setembro para votar os recursos abertos (embargos de declaração) e definir quando a medida deve passar a valer. Fachin é o relator da ação e apresentou seu voto nesta sexta-feira (3).
Mesmo dono
Esta cobrança interestadual do ICMS, de acordo com o diretor tributário da consultoria Mazars, Luis Carlos dos Santos, costuma ser de 7% a 12% do valor da mercadoria, e é paga ao estado de origem.
Entre os grandes contribuintes que hoje pagam o ICMS interestadual na transferência de bens para outras partes da mesma companhia estão empresas de e-commerce e outras que têm centros de distribuição em diferentes estados, além de indústrias com unidades espalhadas, que transportam, por exemplo, peças de uma fábrica para outra.
“Os estados que devem ser mais prejudicados são aqueles que concentram as maiores empresas, como São Paulo, Rio Grande do Sul ou Santa Catarina”, disse Santos.
Os estados pedem que o fim da cobrança passe a valer apenas em 2023, para terem mais tempo de adaptação em suas receitas.
De acordo com o diretor da Mazars, algumas empresas podem acabar perdendo benefícios tributários que têm hoje e terão que refazer as contas, mas, para a maior parte delas, o fim da cobrança deve ser positivo.
“Muitas empresas acabaram se adaptando à lei e foram para outros estados onde ganharam benefícios para essas transferências [de mercadorias de um estado para o outro]”, disse Santos. “Mas, no geral, é uma mudança excelente para as empresas.”
Receita Federal não se dá por vencida na exclusão do ICMS da base do PIS/Cofins
Ainda sobre a exclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base do Programa de Integração Social/ Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (PIS/Cofins), a Receita Federal editou o Parecer Interno Cosit nº 10, de 1º julho [1], agora exigindo que na apuração de créditos a compensar o contribuinte deve excluir o ICMS destacado na nota fiscal, sob o argumento de que o imposto não compõe o preço da mercadoria.
Porém, essa nova tese da Receita Federal não deverá prosperar.
Isso porque a decisão do STF no RE 574.706 determinou apenas a exclusão do ICMS destacado da nota fiscal da base de cálculo para incidência do PIS/Cofins [2], vez que o ICMS não integra o conceito de faturamento, e, consequentemente, não se sujeita à incidência dessas contribuições, cuja decisão é definitiva e deve ser cumprida. É importante destacar: o STF nada disse sobre as normas que tratam da apuração de créditos de PIS/Cofins.
A par disso, observa-se que a legislação vigente sobre o PIS/Cofins trata em distintas oportunidades sobre a base de cálculo e tomada de créditos, conforme se vê na Lei nº 10.833/2003 [3]. Especificamente, a incidência, que delineia a base de cálculo, e que é a única matéria afetada pela decisão do STF, está baseada nos artigos 1º e 2º da referida lei. Diferentemente, as regras de tomada de créditos, que constituem autorizações expressas na mesma lei, está baseada no artigo 3º. E o que se extrai do artigo 3º é que o contribuinte pode tomar crédito sobre toda a despesa incorrida com serviços e mercadorias adquiridas como insumo, sem que haja qualquer determinação legal para exclusão do valor destacado de ICMS. E, insista-se, sobre tomada de crédito não se manifestou o STF.
Portanto, de acordo com a legislação vigente, especificamente o artigo 3º da Lei nº 10.833/2003, não há espaço para a interpretação do Parecer Interno Cosit nº 10, cujo entendimento, para prevalecer, depende de uma modificação na legislação, ou seja, depende de uma lei nova, com o objetivo de alterar o artigo 3º, cuja lei nova, se e quando for promulgada, não poderá retroagir.
Daí nosso entendimento de que a tese sustentada pela Receita Federal no Parecer Interno Cosit nº 10 não se sustenta.
E como esse novo parecer da Receita Federal já teve o respaldo da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, resta claro que, para fazer valer seu direito, reconhecido pelo STF, o contribuinte, infelizmente, ainda terá de enfrentar o Fisco no âmbito administrativo ou judicial.
[1] Parecer disponível em https://garciadelima.adv.br/wp-content/uploads/2021/09/Exclus%C3%A3o-do-ICMS-do-PIS-Cofins-PARECER-INTERNO-COSIT-10-DE-01-JULHO-DE-2021.pdf.
[2] Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=2585258&numeroProcesso=574706&classeProcesso=RE&numeroTema=69.
[3] Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.833.htm.
Teles criticam reforma tributária e afirmam que alta da carga comprometerá 5G
As empresas de telecomunicações criticaram o teor da reforma tributária que os deputados aprovaram na Câmara. Em nota, a Conexis Brasil Digital, que reúne as maiores operadoras do País, afirmou que o texto vai resultar em aumento da carga sobre a conectividade e comprometer investimentos bilionários que serão necessários para implantar o 5G no País. A votação da proposta pelos deputados foi concluída nesta quinta-feira, 2, mas ela ainda precisa passar pelo Senado para entrar em vigor.
"A implantação de 5G no Brasil e a ampliação da conectividade exigirá investimentos bilionários nos próximos anos. A aprovação da medida traz o risco de mais aumento na carga tributária para a conectividade, num País que já é líder em tributação nos serviços de telecomunicações e internet. O setor, que contribui significativamente na arrecadação de tributos, geração de renda e emprego, acesso à internet e educação, deveria ser desonerado para o país poder avançar na economia do 5G", diz a nota.
"A medida aprovada pela Câmara agravará a tributação, atingindo fortemente os investimentos, a chegada do 5G e as perspectivas que a tecnologia pode trazer para o desenvolvimento econômico e social do País. O setor privado não pode pagar ainda mais pelas ineficiências do setor público."
Câmara aprova texto-base de projeto que altera regras do Imposto de Renda
Votação da proposta prossegue nesta quinta-feira (2)
A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (1º) o texto-base do projeto que altera regras do Imposto Renda (PL 2337/21). Por 398 votos a 77, foi aprovado o substitutivo do relator, deputado Celso Sabino (PSDB-PA). Nesta quinta-feira (2), os deputados votarão os destaques apresentados pelos partidos na tentativa de mudar o texto.
De acordo com o substitutivo, os lucros e dividendos serão taxados em 20% a título de Imposto de Renda na fonte, mas fundos de investimento em ações ficam de fora. Na versão anterior, a alíquota era de 5,88% para os fundos.
Já o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) será reduzido de 15% para 8%. Na versão anterior, a redução levava o tributo para 6,5%.
A Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) diminuirá 0,5 ponto percentual em duas etapas, condicionadas à redução de deduções tributárias que aumentarão a arrecadação. Após o fim das deduções, o total será de 1 ponto percentual a menos, passando de 9% para 8% no caso geral. Bancos passarão de 15% para 14%; e demais instituições financeiras, de 15% para 14%.
“A correção proposta na faixa de isenção da tabela do Imposto de Renda será a maior desde o Plano Real. Os contribuintes perceberão redução significativa no IR devido. E cerca de 16 milhões de brasileiros – metade do total de declarantes – ficarão isentos”, disse o relator.
Desconto mantido
Um dos pontos para os quais as negociações evoluíram a ponto de a oposição apoiar o texto é a manutenção do desconto simplificado na declaração de ajuste anual.
Atualmente, o desconto é de 20% dos rendimentos tributáveis, limitado a R$ 16.754,34, e substitui todas as deduções permitidas, como gastos com saúde, educação e dependentes.
Pela proposta inicial, esse desconto somente seria possível para aqueles que ganham até R$ 40 mil por ano, limitado a R$ 8 mil (20%). Após as negociações, o limite passou para R$ 10,5 mil.
Lucros e dividendos
Quanto à tributação de lucros e dividendos distribuídos pelas empresas a pessoas físicas ou jurídicas, o projeto propõe a tributação na fonte em 20%, inclusive para os domiciliados no exterior e em relação a qualquer tipo de ação.
A maior parte dos países no mundo realiza esse tipo de tributação. Entre os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), apenas a Letônia não tributa lucros e dividendos.
Entretanto, ficam de fora as micro e pequenas empresas participantes do Simples Nacional e as empresas tributadas pelo lucro presumido com faturamento até o limite de enquadramento nesse regime especial de tributação, hoje equivalente a R$ 4,8 milhões, contanto que não se enquadrem nas restrições societárias de enquadramento no Simples.
Outras exceções são para:
- as empresas participantes de uma holding, quando um conglomerado de empresas está sob controle societário comum;
- as empresas que recebam recursos de incorporadoras imobiliárias sujeitas ao regime de tributação especial de patrimônio de afetação; e
- fundos de previdência complementar.
Debate em Plenário
O projeto é a segunda fase da reforma tributária encaminhada pelo governo. Parlamentares de oposição, no entanto, manifestaram apoio à votação da proposta devido às alterações feitas pelo relator.
Segundo o deputado Afonso Florence (PT-BA), o texto agora “é um projeto da Câmara, em favor da reforma tributária justa e solidária”. Ele elogiou a redução do IR para a pessoa física e a taxação de lucros e dividendos.
O deputado Marcelo Ramos (PL-AM) elogiou o acordo obtido pelos líderes partidários, mas defendeu mudanças no projeto por meio de destaques. “Precisamos ter coragem de enfrentar o desafio de desonerar a tributação sobre o consumo, que pesa mais no bolso do trabalhador, do desempregado, do pai de família.”
Já o deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP) disse que a reforma no Imposto de Renda é necessária, mas criticou o texto ao apontar distorções a partir do porte das empresas, em favor das pequenas. “É uma espécie de regressividade para pessoas jurídicas, e assim as empresas não vão querer crescer, faturar”, disse.
O deputado Ivan Valente (Psol-SP) criticou a rapidez na discussão do projeto. “Falamos de reforma tributária há mais de dez anos, e o substitutivo não aborda taxação de grandes fortunas ou sobre valor agregado”, disse. “É um pequeno passo, faltou regressividade”, afirmou, cobrando tributação menor sobre os mais pobres.
O líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), disse que, com o aval do Poder Executivo, a proposta dará origem a uma nova forma de tributar no País. “Esta nova forma de tributar vai ser mais justa, mais equânime para a sociedade: aqueles que ganham mais pagarão mais, aqueles que ganham menos pagarão menos.”
Durante a votação, Barros anunciou que, exceto por razões jurídicas, não deverá haver veto presidencial quanto ao fim dos juros sobre capital próprio ou à taxação de lucros e dividendos. “Se, por algum acaso, houver veto, o governo fará acordo para derrubá-lo”, disse.
Saiba mais sobre a tramitação de projetos de lei
Reportagem – Eduardo Piovesan e Ralph Machado
Edição – Pierre Triboli
Fonte: Agência Câmara de Notícias
'Simplifica Já' resultaria num sistema mais complexo do que a criação do IBS
Na discussão sobre a reforma da tributação do consumo, as entidades representativas dos municípios de maior porte, assim como algumas entidades empresariais, têm defendido uma proposta conhecida como Simplifica Já (ver meu artigo Os municípios na reforma tributária, publicado neste espaço em 15/9/2020).
Ao contrário da proposta de reforma tributária ampla do consumo, que propõe a unificação do imposto municipal sobre serviços (ISS) e do imposto estadual sobre circulação de mercadorias (ICMS) em um imposto sobre bens e serviços (IBS), o Simplifica Já propõe a manutenção da segmentação entre o ISS e o ICMS. O apoio ao Simplifica Já resulta, de um lado, do desejo dos grandes municípios em continuar cobrando o ISS e, de outro, da pressão de alguns setores pela menor tributação do consumo de serviços.
Ainda que a reforma tributária ampla mantenha a carga tributária total, uma de suas consequências é a redistribuição da tributação, com alguns setores pagando menos que hoje e outros pagando mais. É natural que setores que acham que serão prejudicados, como alguns segmentos de serviços, defendam a manutenção de uma tributação menor, ainda que isso seja socialmente injusto – pois ricos consomem proporcionalmente muito mais serviços do que pobres.
Também é natural que municípios que acham que serão prejudicados (na maior parte dos casos equivocadamente) sejam contra a unificação do ISS com o ICMS.
O problema é que o Simplifica Já é a pior forma possível de estes setores e municípios se protegerem dos efeitos da reforma. E isso por vários motivos.
Por um lado, a segmentação na tributação de mercadorias e serviços é um desastre para o crescimento do País. Na economia moderna, a produção e os investimentos são cada vez mais intensivos em serviços. Isso significa que a manutenção de um tributo cumulativo sobre serviços não apenas onera os investimentos e prejudica a competitividade da produção nacional, como tende a tornar o Brasil cada vez mais defasado em relação ao resto do mundo na incorporação de novas tecnologias. Não por acaso, o Brasil é o último país economicamente relevante do mundo que ainda tributa separadamente mercadorias e serviços.
Por outro lado, a proposta do Simplifica Já aumenta, e muito, a carga tributária. Isso se deve a três motivos. O primeiro é a redução das alíquotas interestaduais do ICMS prevista na proposta, cujo resultado é a cobrança no Estado de destino do imposto que hoje não é cobrado no Estado de origem, por causa de benefícios fiscais. O segundo motivo são o aumento da base de incidência e a mudança na forma de cobrança do ISS, que inevitavelmente resultarão em aumento de carga. O terceiro é a limitação do número de alíquotas do ICMS e o consequente reenquadramento nas novas alíquotas que, muito provavelmente, resultará em maior tributação. Ao contrário da reforma ampla, cuja transição foi desenhada para manter a carga tributária, a aprovação do Simplifica Já levaria a um aumento da carga tributária de um a dois pontos porcentuais do PIB.
Por fim, apesar do nome, o Simplifica Já resultaria num sistema muito mais complexo que o IBS cobrado com regras uniformes.
Caso o Simplifica Já fosse aprovado, o País inteiro pagaria uma conta extremamente pesada, na forma de menor crescimento e maior carga tributária. O pior é que o próprio setor de serviços seria prejudicado: de um lado, porque é o maior beneficiário do aumento do PIB e da renda das famílias; de outro, porque a não cumulatividade plena do IBS é muito melhor para os prestadores de serviços que estão no meio da cadeia que o ISS.
A demanda de alguns setores por menor tributação e de alguns municípios por maior participação na receita faz parte da política. O problema não está nessa demanda, mas sim na forma proposta para seu atendimento. Com o Simplifica Já, o custo para a sociedade tende a ser muito maior que o pretenso benefício para os municípios e setores que defendem a proposta.
*DIRETOR DO CENTRO DE CIDADANIA FISCAL
Presidente do Senado diz que não pode permitir reforma tributária que aumente impostos
BRASÍLIA — O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e o ministro da Economia, Paulo Guedes, devem se reunir nesta segunda-feira para tratar do andamento das pautas econômicas no Congresso, assunto que causou discórdia pública entre eles na semana passada.
Em entrevista ao GLOBO, Pacheco disse que não vai permitir que o governo aumente impostos para o contribuinte na proposta de reforma tributária e afirmou que sente falta do Ministério do Planejamento.
— Eu não posso permitir que haja, a pretexto de uma reforma tributária, um projeto que simplesmente aumente impostos para o contribuinte. Devemos evitar isso — declarou Pacheco.
Na semana passada, o ministro da Economia cobrou publicamente Pacheco sobre a tramitação de reformas no Congresso. Em uma de suas críticas, Guedes ironizou o fato de o presidente do Senado ser cotado como candidato à Presidência da República no ano que vem.
— Estão até lançando o presidente do Senado como candidato (a presidente da República). É um pouco antes da hora. Inclusive para ser candidato tem que ser alguém com liderança, primeiro para aplacar essa disputa entre Poderes, e o Pacheco tem tentado fazer isso. Mas segundo para acionar a agenda de reformas também — disse Guedes, durante evento do setor varejista.
Ao ser indagado sobre os planos do governo para turbinar o programa social Bolsa Família às vésperas das eleições em 2022, Pacheco afirmou apoiar a iniciativa, que considera uma prioridade, mas aproveitou para fazer uma crítica à falta de planejamento do governo na área econômica:
— Ressinto a falta de um Ministério do Planejamento independente da Economia, para termos um planejamento nacional de políticas dos ministérios, políticas públicas. Política econômica é algo muito amplo, que deve ser feito por especialistas, mas que não possa ser despida de sensibilidade social.
A recriação do Ministério do Planejamento tem sido alvo de cobiça de diferentes partidos. Antes de ser incorporada à Economia no início do governo Bolsonaro, a antiga pasta era responsável pelo controle do Orçamento federal. Parlamentares de diferentes legendas têm pressionado o presidente Bolsonaro para desmembrar a estrutura sob o comando de Guedes.
Ao GLOBO, Pacheco também questionou a falta de um plano de ação do Executivo para enfrentar a crise hídrica. Para ele, este é um problema gravíssimo que precisa ser resolvido "para ontem":
— Terei também uma conversa com o ministro Bento Albuquerque, de Minas e Energia, sobre um problema gravíssimo: precisamos de um planejamento para a crise hídrica e energética. Por que não se discutir antecipadamente isso para poder conscientizar a população de que precisa economizar água e economizar energia? Precisa entender qual é o planejamento de governo desse enfrentamento para a crise hídrica e no que se insere o Senado para dar solução também de forma colaborativa.
Contra golpes: Transações no Pix ficam limitadas a mil reais na madrugada
O presidente do Senado disse ainda que tem falado pouco o presidente Jair Bolsonaro, mas que o seu diálogo com o Palácio do Planalto tem ocorrido por meio do ministro-chefe da Casa Civil, o senador licenciado Ciro Nogueira (PP-PI). Indagado se Nogueira tem conseguido desempenhar o papel de "amortecedor", Pacheco respondeu que ele "vai conseguir" em algum momento.
— Ele vai conseguir. O Ciro Nogueira é habilidoso. É um bom político e tem bons fundamentos. Acredito, sim, que ele possa desempenhar um papel importante em ajudar nessa pacificação do país.
Como a gasolina a R$ 7 pode afetar os seus investimentos
O preço do litro da gasolina chegou a ultrapassar R$ 7 em algumas cidades do País nos últimos dias. Segundo a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o crescimento no mês já é calculado em 0,60%. Além de afetar o dia a dia, o aumento também impacta a situação de empresas e setores com papéis listados na Bolsa de Valores, seja para o lado positivo ou negativo.
Por outro lado, o preço do petróleo teve pico em julho, quando chegou a custar cerca de R$ 77. Em agosto, o Petróleo Brent futuro acumula queda de 7,70%, mas os combustíveis no Brasil sentem a máxima do mês anterior nas bombas dos postos de gasolina. Outras commodities marcaram fortes baixas comparadas ao ápice que tiveram no começo do ano.
Vale ressaltar que das treze empresas do setor de transporte da B3, apenas uma tem acumulado positivo no mês, a Trevisa (LUXM4), voltada ao transporte aquático. Tegma (TGMA3) e Hidrovias (HBSA3) registraram os maiores tombos: 21,47% e 18,08%, respectivamente.
Quem deve subir ou descer?
De acordo com Paula Zogbi, analista da Rico Investimentos, a influência pode ser observada tanto no lado positivo quanto negativo. Petrobras (PETR3 e PETR4), PetroRio (PRIO3), além das distribuidoras BR (BRDT3) e Ultrapar (UGPA3), que podem ser beneficiadas com a capitalização, são companhias que tendem a ganhar com o aumento dos preços.
Guilherme Tiglia, sócio da Nord Research, aponta que o impacto para as distribuidoras acontece de forma indireta. “As empresas de distribuição de combustíveis, como é o caso da BRDT, são favorecidas no curto prazo, uma vez que o estoque havia sido comprado por um preço inferior se valorizou, explica Tiglia.
Com o aumento do petróleo, outras fontes de energia podem ser beneficiadas por conta da procura de alternativas mais baratas. “Também no lado positivo vemos empresas de açúcar e etanol como São Martinho (SMTO3), BrasilAgro (AGRO3) e Cosan (CSAN3). Quando a gasolina está cara, o etanol fica mais barato, então as empresas podem ter receitas maiores”, explica Zogbi.
Por outro lado, as empresas mais prejudicadas, segundo Zogbi, são aquelas que gastam com transporte, ou seja, desde as produtoras de bens de consumo, varejistas e do setor de logística. “Mesmo que possa ser um custo repassado ao consumidor, lojas do e-commerce tendem a absorver os custos para ganhar mercado”, complementa.
A analista da Rico complementa que empresas de aviação também podem ser afetadas, mas as brasileiras do segmento possuem boa posição de hedge. “É claro que existem outros impactos, estamos vivendo uma situação atípica, com a pandemia e as questões político-econômicas o cenário fica bastante nebuloso”, explica.
“É mais um efeito marginal do que uma oportunidade”, define Luis Sales, estrategista-chefe da Guide Investimentos. Para Sales, as aéreas estão entre as mais prejudicadas, junto de empresas do setor de logística como JSL (JSLG3) e Tegma (TEGMA3).
Segundo a Ágora Investimentos, a informação é negativa para o setor de aluguel de carros, especialmente se considerar o maior custo por afetar o número de motoristas de aplicativo.
Além do preço do combustível, as locadoras ainda enfrentam dificuldades na compra de carros por conta do fechamento de fábricas e montadoras durante a pandemia. Situação que amplia o impacto para as locadoras.
Ministro diz preferir não ter reforma tributária se sistema piorar
Guedes reforçou compromisso em evitar perda para estados
Em meio a mudanças na reforma tributária inseridas pelo Congresso, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse hoje (20) preferir que não haja nenhuma reforma a ter uma proposta que resulte em piora do sistema atual. Ele deu a declaração em audiência pública no Senado.
“Tem muita gente gritando que está piorando, mas é quem vai começar a pagar. Temos que ver mesmo se vai piorar ou não. Se chegarmos mesmo a conclusão que vai piorar, eu prefiro não ter”, disse o ministro.
Guedes reforçou o compromisso em não aumentar a carga tributária e em evitar perda de receitas para estados e municípios. “E piorar, para mim, é aumentar imposto, tributar gente que não pode ser tributada, é fazer alguma coisa que prejudique estado ou município, que eu acho que não está prejudicando”, acrescentou.
O ministro repetiu que acredita que a proposta do governo não resultará em prejuízo para os cofres públicos. Na avaliação dele, o crescimento da economia elevará a arrecadação, o que abriria espaço para a redução do Imposto de Renda das empresas. Além disso, as receitas com vendas de imóveis e privatizações poderiam compensar eventuais perdas de receita para a União.
“Ninguém vai perder. Não vamos perder também e, se perder, prefiro perder um pouquinho. Porque o ritmo de negócios para o ano que vem nós já vamos arrecadar de novo com essa reforma também. Vai ter uma boa base. Porque estamos trazendo gente que nunca pagou para atualizar, tem atualização de imóveis, tem uma porção [de medidas]”, declarou.
Nas últimas semanas, o mercado financeiro tem expressado dúvidas em relação as mudanças recentes feitas pelo relator da reforma do Imposto de Renda e de investimentos financeiros, deputado Celso Sabino (PSDB-BA). Entidades de prefeitos e de governadores também têm rejeitado o texto atual, por temerem perdas, já que o Imposto de Renda é partilhado com os governos locais.
Interesses
Segundo o ministro, a proposta atual mexe com interesses, principalmente de quem ganha mais. Apesar disso, ele voltou a defender o corte na taxação das empresas após a tributação dos dividendos (parte dos lucros das empresas distribuídas aos acionistas) em 20%. “Tem muito interesse em jogo. [A reforma do Imposto de Renda] é relativamente simples. No mundo inteiro os impostos estão caindo. Nós vamos para a média do mundo. De 34% [a alíquota no Imposto de Renda da Pessoa Jurídica] para 24%”, afirmou.
A diminuição da alíquota do Imposto de Renda Pessoa Jurídica, para Guedes, significa uma aposta no crescimento do país. “[A alíquota] vai cair. Isso é uma aposta. Uma aposta no vigor, na recuperação econômica, aposta de que os impostos, baixando para as empresas, [farão] os investimentos aumentar. Mas a hora de fazer essa aposta é agora. A arrecadação está crescendo, as empresas estão batendo recordes de resultados”, comentou.
Fatiamento
O ministro disse considerar impossível fazer uma reforma ampla e que prefere fatiar a reforma tributária, com a apresentação de diversas propostas sobre pontos específicos. Mesmo assim, ele prometeu aos senadores apresentar, em 30 ou 60 dias, um texto mais amplo, que abranja a reforma de outros tributos, não apenas do Imposto de Renda.
No entanto, impôs condições, como evitar compensações bilionárias da União para cobrir eventuais perdas de estados e de municípios e isenções indevidas para setores empresariais. “Se não for um expediente para fazer a União pagar recursos, quero ver acontecer”, declarou Guedes.