Reforma administrativa, realismo fantástico
A reforma administrativa enviada ao Congresso Nacional em 4 de setembro nos remete imediatamente ao realismo fantástico em que secularmente vive a América Latina. Em nossa região há sempre uma distorção do tempo, que é dissociado da racionalidade e da realidade presente. Vivemos o tempo cíclico, em vez do tempo linear e sequencial. O presente se repete infinitamente ou se parece com o passado, sempre na busca de um futuro imaginário.
Brasil, país do futuro (há 500 anos). Brasil potência (Geisel). Estados Unidos do Brasil (Constituição de 1891). Cinquenta anos em cinco (Juscelino). A classe pobre virou classe média (Lula). Pátria educadora (Dilma). A cloroquina, e não a vacina, nos salva da covid-19 (Bolsonaro).
Os nossos países balançam entre populismos de esquerda e de direita, que vão do peronismo, do getulismo, do castrismo, do chavismo, do janismo, do lulismo ao bolsonarismo. No entanto, somos sempre governados por oligarquias atrasadas e arquicorruptas – como o Centrão, faça sol, faça chuva.
Como lembra Moacyr Scliar, fundado na obra do notável autor de Acerca do Real-Maravilhoso Americano, Alejo Carpentier, “a América é o único continente onde diferentes eras coexistem, onde os avanços tecnológicos da modernidade convivem com o primitivo. Esta situação configura o choque cultural do qual nasce a fantasia que alimentará (...) o realismo mágico latino-americano (...). Ele não apenas funde a narrativa realista com elementos fantásticos; vai mais além, sobretudo por causa do quadro político, econômico e social vigente na América Latina (...). É então que o atraso da região fica mais evidente”.
A tragédia histórica, cultural e, sobretudo, social dos países latino-americanos é fartamente retratada nos romances e crônicas de Asturias, Carlos Fuentes, Cortázar e Mario Vargas Llosa. Mas é na obra-prima de Gabriel García Márquez, Cem Anos de Solidão, que melhor temos esse retrato, em sua descrição da vida em Macondo, o território mítico que espelha esse quadro de nossa doentia visão do mundo e de nossas ações e condutas que nunca levam a nada, de que nenhum progresso resulta, em que nenhuma oportunidade é aberta ao povo, cada vez mais pobre e miserável.
A retumbante Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 32/2020, da reforma administrativa, é o espelho desse realismo fantástico. Mudam-se inúmeros artigos da Constituição de 1988, porém sem tocar nos direitos adquiridos dos atuais servidores públicos.
Trata-se de uma reforma que pretende resolver o problema do monumental déficit público causado pela folha de pagamento dos mais de 11 milhões de servidores estáveis, mas sem tocar em um centavo dessa mesma folha de pagamento. Procura-se diminuir a “participação” dessas fabulosas despesas no produto interno bruto (PIB), atualmente de 13,8%, para algo em torno de 9%, mas isso somente daqui a uns 50 anos, quando alguns dos atuais servidores ativos e inativos e suas viúvas e viúvos já não estiverem neste mundo.
Haverá, assim, segundo a PEC, no futuro, duas classes de servidores: de um lado, os milhões de funcionários atuais, com sua estabilidade plena, progressivos e inesgotáveis direitos adquiridos intocados, e, de outro, uns gatos-pingados que ingressarão no serviço público sob as novas regras de “paridade” com os trabalhadores do setor privado.
E, cinicamente, a “reforma administrativa”, ao alterar dezenas de dispositivos do artigo 37 da Constituição de 1988, incluído seu caput, passa olimpicamente pelo parágrafo 11, que permite o estouro do teto de R$ 39 mil para os proventos dos servidores. Por força desse parágrafo, os servidores poderão receber ad infinitum verbas indenizatórias pelo fato de trabalharem nos serviços públicos. E essas verbas – que chegam a cinco vezes o teto – são isentas do Imposto de Renda, pois são indenizatórias!
Puro realismo fantástico. Ademais, a citada PEC do futuro é inteiramente errática e omissa. Não determina o regime de trabalho dos novos servidores. Estarão submetidos à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), terão um outro regime especial ou ingressarão no regime único atual?
Essa PEC mágica, ademais, não trata da questão do direito adquirido dos futuros servidores. Deixa para legislação posterior os pontos da reforma que daqui a 50 anos deverão surtir algum efeito no déficit fiscal.
Enquanto imaginamos como será no futuro o serviço público no Brasil, o drama fiscal, decorrente da folha de pagamento dos servidores, continuará a engordar o déficit, que em 2021 será de R$ 230 bilhões. Os tetos estabelecidos para municípios, Estados e União há muito foram estourados. As prefeituras despendem em média 80% de suas receitas próprias e de repasses no pagamento da folha dos ativos e inativos.
Pergunta-se: de que essa “reforma administrativa” valerá para mitigar os problemas fiscais do Estado e a disfuncionalidade dos serviços públicos, responsáveis pela nossa persistente decadência econômica e, com ela, pela desagregação social e pela degeneração política?
Votação da reforma tributária é adiada
Por: Redação Gazeta do Sul
A expectativa do governador Eduardo Leite (PSDB) de ter aprovada ainda esta semana, na Assembleia Legislativa, a proposta de reforma tributária acabou frustrada. Embora o governo tenha anunciado na segunda-feira, 14, uma série de alterações no texto para atender a algumas das reivindicações da sociedade e de deputados, a votação prevista para ocorrer nesta quarta-feira, 16, foi adiada para a semana que vem. A decisão foi tomada depois que a base aliada constatou que talvez ainda não tenha os votos suficientes. O líder de governo, Frederico Antunes (PP), afirmou que ainda é possível acolher sugestões – ou seja, a proposta poderá ser alterada novamente até a próxima quarta.
Na terça, 15, o MDB, que tem a maior bancada governista, fechou posição contra a proposta do governo. Os emedebistas se negam a apoiar a reforma enquanto houver previsão de qualquer aumento de carga tributária.
Também na terça, Leite entregou à Assembleia a proposta de Lei Orçamentária Anual (LOA) para 2021 (foto), com previsão de déficit de R$ 8 bilhões, o pior da história. A projeção não considera as medidas previstas na reforma tributária – que, se aprovada, reduzirá o déficit em R$ 2,8 bilhões. Também não há previsão de receita vinda das privatizações da CEEE, CRM e Sulgás, que foram aprovadas pela Assembleia no ano passado. A arrecadação deve ter uma queda de 5%.
Classe contábil se posiciona contra mudanças no Estado
A classe contábil no Estado divulgou nessa terça manifestação com posicionamento contrário à aprovação do projeto da reforma tributária, na forma em que se encontra. O Conselho de Contabilidade do Rio Grande do Sul criou um grupo de trabalho (GT) para análise e estudo da proposta do governador Eduardo Leite, com a participação de representantes de entidades da classe.
A equipe identificou cinco pontos críticos que baseiam a oposição à medida. Segundo o Conselho de Contabilidade, a análise foi de caráter técnico, com isenção, comprometida apenas com os interesses da sociedade gaúcha e da competitividade empresarial.
O primeiro ponto foi o limitado prazo de análise da proposta, uma vez que o projeto suscita profundas alterações na legislação tributária. Outro item é o aumento da carga tributária com a extinção de benefícios fiscais. Conforme análise da classe contábil, a revisão pretende retirar benefícios para produtos específicos (hortifrutigranjeiros, leites pasteurizados, ovos, pão francês, massa congelada, flores naturais e preservativos) que hoje não pagam ICMS. Com a reforma, passarão a uma alíquota de ICMS de 17% ao final de três anos.
O Estado pretende extinguir parcialmente algumas isenções e reduções de base de cálculo, colocando, na regra geral, itens da cesta básica de alimentos, de medicamentos, carnes, erva-mate e outros, evoluindo progressivamente para 17% ate 2023. Conforme o manifesto do Conselho de Contabilidade e delegacias regionais, talvez esse seja o ponto de maior atenção, pois o ICMS será adicionado ao preço dos produtos – o que causará aumento no valor ao consumidor final, possível redução no consumo e destinação desse custo para a população de baixa renda. A compensação desse custo imediato dependerá de sistemática que ainda não foi testada, portanto, sem eficácia comprovada.
MAIS PONTOS CRÍTICOS
– Oneração das empresas do Simples Nacional: com a proposta de limitar a faixa de faturamento de R$ 180 mil por ano, a partir de 2022 – atualmente, em R$ 360 mil por ano –, ocorrerá um aumento da carga tributária dessas empresas, já fragilizadas pela crise econômica e pelos efeitos da pandemia.
– Risco de implementação da redução do prazo de creditamento: uma das propostas para compensar a maior tributação de alguns produtos e setores é a redução do prazo de creditamento do ICMS na compra de máquinas e equipamentos, de 24 meses (dentro do Estado) e 48 meses (fora do Estado) para um mês. Contudo, esse benefício depende de autorização do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Caso não se obtenha êxito nessa proposta, não é apresentada alternativa para que o aludido equilíbrio entre aumentos e reduções seja mantido.
– Oneração de alguns setores: a criação do Fundo Devolve-ICMS será, em essência, com o aporte de recursos dos contribuintes de ICMS proporcional aos incentivos recebidos do Estado, em montante correspondente àquele definido em ato do Poder Executivo. No entanto, a proposta prevê oneração do setor produtivo em um montante que ainda não pode ser estimado. Isso dependerá de regulamentação específica, o que gera insegurança jurídica para os empresários.
É constitucional vedação da alíquota zero sobre PIS/Cofins a optantes do Simples
Decisão unânime foi tomada em julgamento com repercussão geral realizado em sessão virtual.
Por unanimidade de votos, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão virtual, julgou constitucional o parágrafo único do artigo 2º da Lei 10.147/2000, que excluiu as pessoas jurídicas optantes pelo Simples Nacional de usufruir da redução a zero da alíquota de contribuição do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) incidentes sobre a receita bruta da venda de determinados produtos e destinada aos que optaram pelo regime de tributação monofásica. A decisão seguiu o voto do relator, ministro Marco Aurélio, e foi tomada na análise do Recurso Extraordinário (RE) 1199021, com repercussão geral (Tema 1050), que foi desprovido.
Pequenas empresas
No processo, uma empresa de cosméticos questionava decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que entendeu constitucional a vedação imposta a optante pelo Simples Nacional de se beneficiar com a alíquota zero do PIS/Cofins. No recurso ao STF, a empresa sustentava que a vedação contida na Lei 10.147/2000 quanto às microempresas e empresas de pequeno porte seria anti-isonômica e significaria aumento real da carga tributária.
Regime simplificado
Para o ministro Marco Aurélio, a alegada contrariedade ao princípio da isonomia tributária não pode “servir de alavanca para a criação de regimes híbridos, colhendo o que há de melhor em cada sistema”. Isso porque o regime simplificado de recolhimento de tributos, previsto na Lei Complementar 123/2006, que institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, não é invalidado pela restrição prevista na Lei 10.147/2000.
Essa norma estabelece o regime monofásico, com recolhimento em separado das contribuições, desonerando varejistas e atacadistas com a alíquota zero, porém elevando a carga tributária de industriais e importadores. As empresas inscritas no Simples, por sua vez, submetem-se ao regime unificado de recolhimento de tributos mediante a incidência de determinada alíquota sobre a receita bruta, conforme previsto na Lei 106/2003, em respeito ao artigo 146, inciso III, alínea “d”, da Constituição Federal, que prevê tratamento diferenciado a essas pessoas jurídicas.
“O fato de o incentivo não se aplicar às optantes pelo Simples não implica inobservância à cláusula voltada ao tratamento favorecido das empresas de pequeno porte. A aferição deve ser realizada considerada a tributação como um todo”, ponderou o ministro. Ele esclareceu que o critério previsto no parágrafo único do artigo 2º da Lei 10.147/2000 veda o benefício da alíquota zero a quem já está sujeito a uma circunstância diferenciadora e respeita a ordem constitucional, uma vez que preserva a unicidade e a simplificação no tratamento às micro e pequenas empresas. “Há a facultatividade de submissão ao regime especial. À pessoa jurídica, é dado escolher entre a sistemática da Lei Complementar 123/2006 e o cumprimento das obrigações em separado”, concluiu.
Tese
A tese de repercussão geral firmada foi a seguinte: “É constitucional a restrição, imposta a empresa optante pelo Simples Nacional, ao benefício fiscal de alíquota zero previsto no parágrafo único do artigo 2º da Lei nº 10.147/2000, tendo em conta o regime próprio ao qual submetida
Fonte: Contabilidade na TV
Planos de saúde dizem que reforma tributária vai elevar preço ao consumidor

A reforma tributária proposta pelo governo federal elevará a cobrança de impostos de hospitais privados, clínicas de diagnósticos e planos de saúde, segundo estudos produzidos pelo setor. Esse aumento resultará em repasse sobre as mensalidades dos convênios e preços cobrados de pacientes que utilizam os serviços de saúde da rede particular.
O estudo, encomendado pela CNSaúde (Confederação Nacional de Saúde) à consultoria LCA, calculou o impacto do projeto de lei 3887/20 sobre o setor. A proposta substitui o PIS/Pasep e Cofins por outro tributo, a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), com consequências diferentes para hospitais e laboratórios, de um lado, e planos médicos, de outro.
Planos de saúde
"A carga tributária dos planos de saúde aumentaria 131% com a proposta", diz o estudo. A nova alíquota de 5,82% é maior que à anterior (4,65%) e seria cobrada em cascata (aplicada sobre a nota fiscal em todas as etapas da cadeia de operações), elevando a carga tributária das operadoras dos atuais 4,23% para 9,8%.
Para compensar a perda, as operadoras de saúde reajustariam em cerca de 5,2% a mensalidade dos convênios. O estudo dá o seguinte exemplo: se um plano familiar custa hoje R$ 2.087, R$ 87 são tributos. Com a mudança, esse valor passaria a R$ 2.196, repasse de R$ 109.
O aumento trará uma redução de demanda por serviços de saúde da ordem de R$ 4,6 bilhões, o que equivale a perda potencial de até 500 mil beneficiários de planos de saúde, que passarão a depender do SUS (Sistema Único de Saúde)."
Estudo Reforma Tributária e Impactos ao Consumidor de Saúde Privada
Superintendente do IESS (Instituto de Estudos de Saúde Suplementar), José Cechin admite que o aumento dos custos "ao longo da cadeia" pode resultar em repasses aos pacientes, resultando em perda de clientes e consequente redução nas receitas de hospitais, laboratórios e operadoras.
O aumento promoverá fortes mudanças em todo o setor e rearranjo das empresas que contratam planos de saúde para seus colaboradores, seja deixando de ofertar o benefício, trocando fornecedores ou ainda fazendo downgrade [rebaixamento] dos produtos contratados. O setor público deverá absorver a demanda. Se por um lado o setor público ganha com receita de impostos, de outro, aumentam as despesas do SUS "
José Cechin, superintendente da IESS
Hospitais e laboratórios
Já a alíquota para hospitais e laboratórios saltaria de 3,65% para 12%, elevando a carga tributária de 9,9% para 17,7%. Para esses casos, a cobrança não será em cascata, mas "o repasse do aumento provocaria reajuste de 7,4% para serviços hospitalares e laboratoriais", diz a pesquisa.
No exemplo do estudo, o paciente arca com R$ 205 em tributos quando precisa pagar uma conta de R$ 2.205 por algum serviço hospitalar. "Com a reforma do governo, a família iria pagar R$ 2.368, aumento de R$ 162."
Para o presidente do SindHosp (sindicato de clínicas e hospitais privados), Francisco Balestrin, o repasse pode ser ainda maior. "O aumento de carga provocará uma elevação dos preços ao consumidor entre 7% e 8% mais a CBS que virá embutida nas compras de medicamentos, materiais e insumos", calcula.
Em estudo próprio, a Abramed (Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica) estimou aumento de 40% nos tributos, "R$ 3,6 bilhões ao ano para laboratórios e clínicas de imagem". Para o paciente, "exames até 10% mais caros".
"Cada laboratório e clínica de imagem terá liberdade para decidir como reorganizará suas contas", diz Priscilla Franklim Martins, diretora-executiva da entidade. "Poderão ocorrer cortes na força de trabalho, aumento do preço de exames individuais e de alta complexidade, redução da oferta, incremento no custo geral de todos os procedimentos."
O projeto do governo aguarda a formação de uma comissão especial na Câmara dos Deputados. Procurados, os ministérios da Saúde e da Economia não responderamaté o fechamento da reportagem. Se enviados, os posicionamentos serão incluídos neste texto.
Governo do RS apresenta mudanças à proposta de reforma tributária
Alíquota do ICMS para alimentos também passará por transição
Após rodadas de negociações, o governo do Rio Grande do Sul apresentou na noite desta segunda-feira uma série de mudanças à proposta de reforma tributária, que está em tramitação na Assembleia Legislativa. A previsão é que a votação comece nesta quarta-feira.
Uma das mudanças está relacionada à alíquota de ICMS sobre energia elétrica, álcool, gasolina e telefonia. Com a majoração, aprovada em 2015 e renovada em 2018, ela passou de 25% para 30%. Agora, o governo estabelece alíquota de 27% até 2025.
Outra alteração ao projeto é que o ICMS passa a ter uma terceira alíquota, de 12%. Ela vai valer para os alimentos atualmente isentos, que vão passar por uma fase de transição. Em 2021, ela passa a ser de 7% e, em 2022, de 12%. A cesta básica, que atualmente tem redução de base de cálculo com alíquota de 7% passará para 12% no ano que vem. Será retirada a contribuição de 10% dos insumos agrícolas para o Fundo Devolve ICMS. Sobre o Simples, está mantida a isenção até R$ 360 mil de forma permanente e não somente em 2021. Outra mudança é a alíquota de 25% para bebidas (exceto água, suco e refrigerantes), cigarro, perfumaria e cosméticos.
Entenda
Em setembro de 2015, durante o primeiro ano de governo de José Ivo Sartori (MDB), a Assembleia Legislativa aprovou, em uma votação apertada (diferença de um voto) e após debates acirrados, a majoração de alíquotas de ICMS por tempo determinado: três anos. A majoração entrou em vigor em 2016, com validade para aquele ano e os de 2017 e 2018. E deveria ter acabado em 2019. Com ela, a alíquota básica de ICMS, aplicada a todas as operações e prestações de serviços sem alíquota específica, subiu de 17% para 18%. As alíquotas sobre energia elétrica, álcool, gasolina e telefonia subiram de 25% para 30%.
Em dezembro de 2018, ao final do governo Sartori e com Eduardo Leite (PSDB) já eleito governador a partir de 2019, a Assembleia Legislativa aprovou um projeto que estendeu o aumento de alíquotas de ICMS por mais dois anos, ou seja, com validade para 2019 e 2020. A partir de 2021 elas deveriam voltar aos patamares que vigoravam até o início de 2016. Para estender a majoração das taxas por mais dois anos o governador eleito, na época, costurou um acordo que incluiu bancadas de oposição, o que possibilitou que a prorrogação passasse por margem larga no Legislativo: 40 votos a favor e 10 contra.
A partir de 1º de janeiro de 2021 as alíquotas do ICMS no RS voltam a cair. O Executivo argumenta que não tem como arcar com a queda na arrecadação resultante do fim da majoração e apresentou um pacote de três projetos de reforma tributária que, defende, não só compensa suas perdas, mas também promove maior justiça tributária.
O pacote, protocolado em 10 de agosto, tem pontos contestados não apenas pela bancada do Novo. Também é alvo de questionamentos entre siglas de oposição e gera dúvidas entre parte dos aliados. O Executivo, contudo, utilizou a prerrogativa de urgência na votação, o que significa que, se os textos não forem apreciados pelos deputados em 30 dias, passam a trancar a pauta a votação a partir de 16 de setembro.
Estados e os nós da reforma tributária
Quem está otimista com a aprovação da reforma tributária deve prestar atenção no que disseram cinco governadores. Ronaldo Caiado, de Goiás, alerta que o relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro será “o Judas a ser malhado” e que os impasses começarão assim que o texto for apresentado. Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, diz que o governo federal dificulta a tramitação do projeto, pela sua postura de confronto e má comunicação. Renato Casagrande, do Espírito Santo, acha a proposta da equipe econômica tímida. Helder Barbalho e Rui Costa temem que os estados percam autonomia sobre as suas receitas, com a criação de um fundo único de repasse dos recursos.
São muitos os nós da reforma tributária, e a visão dos governadores, que participaram de um evento promovido pela Febraban semana passada, mostra que o tema continua longe de consenso para votação. Além das dificuldades usuais de se passar uma PEC dessa natureza, há outros agravantes: o texto terá que ser votado em momento de crise, quando todos os entes da federação estão com perda de receitas, o governo federal não enviou sua proposta na íntegra, e uma coleção de projetos de emendas à constituição foi enviada ao mesmo tempo ao Congresso.
— Estamos todos de acordo com a necessidade da reforma tributária. Mas na hora que se redigir a primeira lauda será cada um para um lado. Já não concordo aqui, já não concordo acolá. A disputa começa mesmo quando se coloca no papel — alertou Ronaldo Caiado.
Os governadores se dizem traumatizados com as perdas que sempre alegaram ter tido com a lei Kandir, de 1996. A exportação foi desonerada, mas a União se comprometeu a compensar os estados pelas perdas com ICMS. Os estados foram ao STF por entender que a União pagou menos do que deveria, em uma disputa bilionária ainda em aberto. Por isso, veem com desconfiança a criação de um fundo para recolher o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que seria repassado aos estados, simplificando impostos e acabando com a guerra fiscal.
— É preciso discutir a autonomia dos estados no comitê de gestão desse fundo. A proposta dá peso exagerado à União. Já que a maioria dos recursos é de ICMS, não é possível que os estados fiquem ainda mais reféns de um posicionamento da União — disse Rui Costa, governador da Bahia.
Helder Barbalho, governador do Pará, defende que a emenda 192, apresentada pelos secretários de fazenda estaduais, seja incorporada à PEC 45, ampliando a participação dos estados no fundo. Ele teme que o conselho sofra interferência política e lembra perdas que teriam tido com a lei Kandir:
— A compensação da lei Kandir chegou ao STF. O governo federal chegou a dizer que não devia nada, e os estados chegavam na conta de R$ 40 bilhões desde 1996. Se continuar no modelo de conta única, com repasse aos estados, isso pode se transformar em imbróglio institucional, podendo regredir o projeto e não avançar.
O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, diz que o estado perderá R$ 1 bilhão por ano se a cobrança do IBS passar ao local de consumo. Lembra que seu estado começou a fazer o ajuste fiscal antes dos outros e que por isso é o único com classificação máxima no ranking fiscal do Tesouro. Não poderia se desestruturar financeiramente com a reforma.
— Tem que ter um fundo para apoiar as regiões, porque nem todos os estados têm a mesma capacidade de atrair empreendimentos. O incentivo fiscal hoje é muito criticado, mas é um instrumento para que possam atrair atividade econômica para os seus estados — justificou.
Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, cobra liderança do governo federal na condução de uma proposta que mexe com interesses tão conflitantes.
— Nossos secretários de fazenda se mostraram favorável às PECs do Congresso, a disposição conjunta de governadores existe. Mas quem deve liderar é o governo federal. A postura belicosa do governo acaba sendo uma dificuldade adicional para uma reforma que já é difícil.
Tudo isso é sobre as propostas articuladas no Congresso — uma na Câmara, uma no Senado — sem a presença do governo federal, que discorda desse fundo. Até agora, o governo enviou apenas a fusão do PIS com a Cofins. E disse que outras mudanças virão em fatias. Com a desconfiança geral, e o governo federal arredio, é difícil acreditar que a reforma será aprovada.
Com Alvaro Gribel (de São Paulo)
LGPD: Como garantir a segurança dos dados no home office?
Especialista em segurança de dados dá dicas de como se adaptar à LGPD no home office.
A sanção da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) completou dois anos em 14 de agosto e o Senado votou no último dia 26 de agosto a medida provisória 959/20, que propôs o adiamento da LGPD. Mas, na prática, a lei ainda não está em vigor e o início de sua vigência depende da sanção do presidente da República.
Com isso, muitas empresas estão correndo para se adaptar, assim como diversos sites e aplicativos estão atualizando as suas políticas de privacidade nos últimos dias.
O fato é que, cedo ou tarde, a vai começar a valer. Mas em tempos de pandemia e home office, a nova lei traz consigo mais um desafio: manter a informação segura também na casa do colaborador.
Um estudo da consultoria Betania Tanure Associados, em março deste ano, mostra que 43% das empresas brasileiras adotaram o trabalho remoto, desde então. Mesmo com a retomada, esse número aumentou, isso porque, algumas companhias decidiram seguir no home office. E como cuidar dos dados nesse novo cenário? Juliane Borsato Beckedorff Pinto, consultora de pós-venda da ao³, exemplifica a situação.
“Vamos imaginar que um funcionário enviou um atestado ao RH por e-mail e o responsável precisou imprimir - porque ainda utiliza um modelo físico de arquivamento - e deixou o papel na impressora por alguns minutos. Nesse meio tempo, outro morador da casa foi buscar uma impressão e acabou vendo que o João, o tal funcionário, ficou três dias afastado porque estava com gripe. Para a nova lei, esse dado é sensível e se ele vazar, a empresa será penalizada - não importa se ele estava no escritório ou na casa do colaborador.
Segundo a especialista, o exemplo acima, que parece exagero, mostra na prática o nível de cuidado que a LGPD exige. Uma saída será apostar cada vez mais em soluções digitais, que não usam papel, têm total rastreabilidade e rigorosos protocolos de segurança. Porém, algumas medidas podem ajudar neste novo momento e a especialista separou as principais para que você possa compreender.
Treinamentos
Conscientize sobre a importância da segurança da informação no dia a dia de cada um. Informe por que as medidas estão sendo tomadas e quais os seus impactos para tornar o ambiente mais seguro, mostrando os riscos de cada área e trazendo o contexto da proteção para atividade diária. O profissional do RH precisa saber que deixar o atestado na impressora é um risco.
Políticas
Crie protocolos para evitar que pessoas não autorizadas acessem a rede interna da organização. Atualize a sua política de proteção e se for o caso, o contrato de confidencialidade dos seus contratados. Além disso, não se esqueça de outros documentos essenciais como a política de privacidade e a política e cronograma de retenção de dados.
Tecnologia segura
Acesse a rede da empresa por uma VPN (sigla em inglês para rede privada virtual), que permite um nível de segurança maior para a rede interna por ser criptografada. Também disponibilize antivírus licenciado e atualizado para todos. Esse tipo de solução protege contra alguns tipos de ransomware, software malicioso que infecta o computador e sequestra as informações.
Bloqueio
Crie a cultura do bloqueio de tela. Oriente o colaborador sobre a importância de bloquear o computador quando estiver longe, mesmo que seja para pegar um café. Com o home office, o tempo daquela parada para fazer um lanche pode ser o suficiente para, por exemplo, uma criança enviar sem querer aquele e-mail incompleto.
Juliana reforça que a entrada em vigor da LGDP segue aguardando a sanção presidencial, mas já há uma certeza: a nova regulamentação virá, e com todos trabalhando de casa, as companhias precisam prover proteção e treinar as pessoas para que ferramentas e processos estejam em compliance.
Vale lembrar que a liderança também precisa se engajar e dar o suporte necessário para a propagação da cultura de segurança e cumprimento da lei.
Guedes, o açougueiro gourmet
Guedes é uma espécie de açougueiro gourmet. Sem saber o que fazer com a administração pública, Guedes prefere fingir que está cortando na carne, e vende gato por lebre chamando-a de picanha.
PEC da reforma administrativa renomeia o que já existe (cargo de liderança), joga para escanteio debate que importa (avaliação de desempenho, avaliação e gestão de processos), mantém intactos os privilégios das carreiras do alto funcionalismo, e corrói a estabilidade que separa, já com falhas, funcionalismo de pressões políticas e econômicas.
Que fique claro, o país precisa de uma reforma administrativa, mas a de Guedes não é digna deste nome, de tão genérica que é. Como lembrou Lotta (da FGV), uma reforma deveria tratar melhor de gestão de pessoas, estrutura organizacional e relação com organizações não estatais que fornecem serviços. A de Guedes não o faz.
Ao focar em servidores e não em gestão pública, a reforma do CEO Guedes é a faceta "farialimer" de um presidente que une corporativismo de farda com histórico desprezo por políticas sociais.
Por que então mercado, parte da imprensa e governo compram a picanha de gato de Guedes?
Hipótese 1: reforma proposta mantém intactos os incentivos à corrupção dentro do Estado. Literatura internacional esclarece que estabilidade é uma barreira à corrupção (ver Robert Wade sobre Índia e Sarah Brierley sobre Gana). No Brasil, Bugarin e Meneguin mostram que, embora falte inovação, entre 2002 e 2013 maior corrupção ocorreu nos ministérios com maior percentual de cargos de confiança.
Hipótese 2: reforma proposta facilita concentração de poder, logo ineficiência. Cabe a Guedes explicar por que dar mais poder ao presidente para extinguir órgãos e carreiras públicas, sem precisar de lei. Erra a Folha em editorial neste domingo (13) ao escolher um mau exemplo (EUA), para apoiar a reforma, porque é justamente a burocracia dos EUA que protegeu o país dos desmandos de Trump (ver Lewis no livro "O Quinto Risco").
Por aqui, são Ibama, ICMBio e Funai e seus servidores que não deixam a nossa democracia ou as florestas pegarem ainda mais fogo.
Hipótese 3: reforma atual alimenta fetiche por menos Estado, sem se dar ao trabalho de explicitar com dados o que de fato torna o Estado ineficiente. Reestruturar carreiras para criar incentivos à eficiência, regulamentar avaliação de desempenho, implodir penduricalhos podem ser feitos por lei, não PEC, nos lembra Sundfeld (FGV). Da lei à gestão, ineficiência mora, em parte, na burocracia ocupada por gestores comissionados que não monitoram ou avaliam políticas, nos lembra Graziane (FGV). No primeiro ano do governo Bolsonaro, aliás, dobrou o número de comissionados filiados ao PSL e ao Novo no governo federal segundo dados de agosto divulgados na Piauí.
Hipótese 4: precarizar o Estado é projeto de país. De um lado, nos distrai dos privilégios fardados e togados mantidos pela reforma, nos lembra Grisa (IFRS). De outro lado, precariza os serviços públicos sociais, onde os salários são baixos, criando incentivos para que a população utilize alternativas privadas. Para o PIB que ocupa o Estado, mais planos de saúde e mais escolas privadas de baixa qualidade são melhores do que investir em custo-qualidade do serviço público, debate ao qual o governo é refratário.
Precarização dos sistemas de saúde e educação municipalizados, debate sobre o lado da receita, pouco controle sobre organizações não estatais, muitas delas de cunho religioso, não estão na mesa de Guedes. Modernizar o Estado, para Guedes, é tornar a burocracia pré-moderna.
Mitos e ideologias por trás da reforma de Guedes dirão que o debate é entre Estado maior e engessado, de um lado, e Estado menor e mais eficiente, de outro, num exemplo de "doisladismo" improdutivo. O corte desta carne é mais profundo: há muitos interesses políticos no espectro da esquerda à direita e interesses privados por trás da picanha que é o Estado.
As classes mais pobres, e negras, amargam os ossos que sobram.
4 sinais de que a comunicação com o seu cliente está falha
O seu negócio pode comercializar produtos de qualidade, oferecer um ótimo atendimento, ter um ambiente agradável e promoções competitivas. Mas, se estas informações não chegarem ao público que você quer atingir, todo o seu esforço pode ser em vão.
Por isso, a qualidade do marketing e das ações de relacionamento deve ter atenção constante na gestão da empresa. As estratégias de divulgação variam conforme segmento, objetivos e perfil do público. Mas, os sinais para identificar falhas na comunicação com o seu público são semelhantes em qualquer área.
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Confira quais são:
- Desconhecimento de produtos ou serviços: é mais comum do que se imagina, mas são frequentes os casos em que um cliente, habituado a contratar determinado serviço ou comprar produtos específicos da sua empresa, desconheça outras opções oferecidas. Essa falha na comunicação resulta na perda de oportunidades de negócios;
- Ações promocionais com baixa procura: se o seu negócio costuma oferecer descontos, promoções temáticas, pacotes, concursos culturais ou sorteios atrativos, mas a procura é baixa, é possível que não esteja havendo divulgação suficiente, ou que as estratégias não estejam corretas. Além de desperdiçar tempo e esforço com o planejamento dessas ações que tiverem divulgação falha, pouca procura gera frustração na equipe envolvida;
- Baixa fidelização: se você percebe que boa parte dos clientes que fizeram pelo menos uma compra na sua empresa não costuma retornar, é possível que eles não tenham ficado satisfeitos, mas também pode ser falta de estratégias de relacionamento para fidelização. De todo o modo, é importante avaliar as ações de comunicação, porque, mesmo nos casos em que há insatisfação com produtos, uma pesquisa de pós-venda ajuda muito a mapear os problemas;
- Dificuldade de identificar seu público: quando não se tem controle real sobre informações como idade, gênero e interesses do público, é impossível desenvolver ações personalizadas. Esse gap também tem a ver com comunicação, tanto por não criar formas de relacionamento que possibilitem extrair informações relevantes do público, quanto por perder oportunidades de se relacionar de maneira customizada, a partir desses dados.megofon
Contribuição previdenciária sobre o terço de férias e segurança jurídica
No dia 28 de agosto, foi encerrado o julgamento virtual do Recurso Extraordinário nº 1.072.485 pelo Supremo Tribunal Federal, no qual se declarou a constitucionalidade da incidência da contribuição previdenciária patronal sobre o terço constitucional de férias; em decisão por maioria, houve divergência apenas do ministro Edson Fachin.
Embora o RE aguardasse julgamento com repercussão geral reconhecida desde fevereiro de 2018, até a última sexta-feira a não incidência da contribuição sobre o terço de férias era assunto pacificado em favor do contribuinte, já que o Superior Tribunal de Justiça, afirmado a sua tradicional jurisprudência (iniciada no ano 2009), fixou o entendimento no julgamento do REsp 1.230.957, realizado no ano de 2014 e submetido à sistemática dos recursos repetitivos. Ainda, como apontou o ministro Fachin em seu voto, havia inúmeros precedentes em que o STF apontava que a discussão da incidência específica da contribuição não gozava de repercussão geral, uma vez que a sua análise, deveria ser feita apenas à luz lei criadora do tributo, e não da repartição constitucional da competência.
A posição do ministro Fachin está calcada no fato de que tese militada pelos contribuintes nunca esteve fundamentada em aspectos constitucionais, mas apenas nos critérios determinados pela Lei nº 8.212/91 para a incidência do tributo. A constitucionalidade dessa lei é pressuposta na discussão, o que afastava a natureza constitucional da discussão, investindo o STJ da competência para a última palavra sobre a controvérsia.
A recente decisão do STF causa ruptura em um sistema que desde 2009 proferia decisões em um sentido diferente do que será doravante praticado, submetendo milhares de contribuintes à difícil situação de ter que recolher tributo que podem não estar pagando há mais de dez anos.
Isso nos causa uma reflexão que não se refere, exatamente, ao mérito da decisão, mas ao papel jurídico-político-social da nossa Suprema Corte e a forma do seu exercício.
Isso porque ao Supremo Tribunal Federal não é permitido escolher as matérias sobre as quais os seus julgadores queiram decidir. Considerando questões tributárias de natureza federal, há na Constituição Federal uma clara repartição de competências entre o STF, que deverá decidir sobre infrações a normas constitucionais, e o STJ, que deverá decidir sobre infrações à lei federal.
Essa regra básica, per si, já traz à tona uma impropriedade deste julgamento pelo Supremo Tribunal Federal. Sendo amplamente sabido que a Constituição Federal não cria tributos, mas apenas autoriza os entes federados a criá-los — o que pode ser feito usando-se apenas uma parcela do fato econômico autorizado pela CF, de maneira que a lei federal não precisa tributar a totalidade da "folha de salários e demais rendimentos do trabalho" —, reconhecer que à luz da norma constitucional o terço de férias pode sofrer a incidência não significa, necessariamente, que à luz da lei essa incidência deverá acontecer, já que a Lei nº 8.212/91 estabelece base de cálculo absolutamente reduzida se comparada à totalidade da "folha de salários".
Assim, afirmar, aos olhos da Constituição, que a verba pode ter incidência, não exclui o dever de o STJ analisar essa incidência à luz da Lei específica. Não cabe admitir a "avocação" da competência do STJ pelo STF para avaliar o assunto à luz de lei federal. Sobrepor a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal à decisão tomada pelo Superior Tribunal de Justiça significa, neste caso, desrespeitar a distribuição constitucional de competência entre essas cortes.
Entendemos, contudo, que o debate mais importante a ser travado está na respeitabilidade de que o Poder Judiciário deve gozar perante os cidadãos brasileiros. O contribuinte brasileiro pode confiar no Judiciário que tem?
O Poder Judiciário estabelecido pela Constituição Federal é uno, de maneira que a sua organização entre tribunais é realizada para que a prestação jurisdicional seja realizada de maneira mais eficiente e isenta, limitando o dever-poder outorgado aos juízes que compõem o sistema. O contribuinte, portanto, não apresenta um pedido a um juízo específico, ao STJ ou ao STF, mas ao Poder Judiciário.
Dessa forma, cada órgão julgador deveria exercer a jurisdição com a ciência de que a sua atuação representa, apenas, o funcionamento da uma engrenagem de um magnífico sistema, que ao final entregará a prestação jurisdicional definitiva, protegida pelo trânsito em julgado.
Isso significa que é esperado que o cidadão avalie as manifestações do Poder Judiciário e nelas confie, seja para praticar condutas, seja para executar provisoriamente as decisões jurisdicionais que lhe favoreçam. Na outra mão, cabe ao Judiciário a responsabilidade de manter a coerência entre as suas decisões e a estabilidade da jurisprudência, de maneira a uniformizar o entendimento sobre as normas constitucionais e legais.
Veja-se, nesse contexto, que a principal finalidade constitucional do STF e do STJ é a uniformização de entendimentos divergentes sobre a constituição e sobre a lei federal.
A grande questão que envolve a decisão do STF sobre o terço de férias está em saber se o contribuinte que confiou, por anos, na jurisprudência do Poder Judiciário, formada pelo posicionamento de mérito do STJ e pelas recorrentes negativas de repercussão geral em temas análogos, poderá ser prejudicado.
Vale frisar: a resposta oficial do sistema judiciário para a questão, praticada desde 2009, acaba de ser alterada, prejudicando, potencialmente, milhares de contribuintes que nela confiaram.
Terá vez, então, a primeira grande discussão envolvendo a aplicabilidade do artigo 23 da LINDB, que estabelece efeitos jurídicos para as alterações jurisprudenciais que agravem direitos dos particulares em favor da segurança jurídica. Ainda, será importante a pouco comentada decisão do STJ no REsp nº 1.596.978 que, apesar de posteriormente reformada, protegeu o contribuinte que pautou sua conduta pela "jurisprudência vigente".
Assim, em pouco tempo, caberá ao próprio Poder Judiciário dizer sobre como nós, contribuintes, devemos nos relacionar com as suas manifestações, nelas confiando ou delas desconfiando.

