Maia chama novo imposto de 'jeitinho' e diz que votará contra se governo enviar proposta
Presidente da Câmara afirmou que governo deve reduzir despesa, e não aumentar tributos. Paulo Guedes sugeriu imposto sobre pagamentos eletrônicos para desonerar folha.
Por Luiz Felipe Barbiéri, G1 — Brasília
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, chamou de “jeitinho” a criação de um novo imposto para bancar a desoneração das folhas de pagamento das empresas.
Nesta quinta-feira (30), ele participou de um evento sobre a reforma tributária promovido pelo jornal "Folha de S. Paulo" em parceria com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o Sesi e o Senai.
A equipe econômica do presidente Jair Bolsonaro estuda enviar ao Congresso uma proposta de criação de um novo imposto sobre pagamentos eletrônicos, com alíquota de 0,2%. Parte das sugestões do governo para a reforma tributária foi enviada na semana passada (veja no vídeo abaixo).
Uma comissão mista do Senado e da Câmara discute propostas de deputados, senadores e do governo para o sistema tributário.
A proposta de criar um novo tributo é capitaneada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e já tinha recebido apoio do setor industrial. Porém, a ideia segue enfrentando resistências no Congresso Nacional. Parlamentares criticam o novo imposto por considerá-lo semelhante à antiga Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).
Segundo Guedes, a intenção é ampliar a base de cobrança, ou seja, a variedade de itens sobre a qual o imposto incide. Com isso, diz o ministro, seria possível reduzir a cobrança sobre outras bases, como a folha de pagamentos.
Para Maia, a desoneração da folha de pagamento deve ser bancada pela redução dos gastos públicos, e não pela criação de novos impostos.
“O Brasil vai ter muitas oportunidades se o Brasil conseguir reorganizar o Estado brasileiro. Se a gente achar que vamos dar mais ‘jeitinho’, criando mais um imposto, nós vamos estar taxando mais a sociedade e vamos ter de discutir a despesa pública”, disse Maia no evento desta quinta.
O presidente da Câmara declarou voto contra a proposta e disse que vai trabalhar para influenciar os pares contra a ideia.
“O presidente vai mandar a proposta [de um novo imposto]? Então, encaminha a proposta. Estou dando a minha opinião. Não vai passar. Eu sou um voto. Em PEC, eu voto. Vou votar contra. Eu jogo muito transparente na política. Não jogo pelas costas. Quando eu negocio, falo: 'Eu sou contra isso e meu voto vai ser assim'. Aqueles poucos que eu influencio, vou tentar influenciar também para votar contra”, afirmou o presidente da Câmara.
'Erros do passado'
Maia criticou integrantes da equipe econômica que propõem a criação de um novo imposto para permitir a desoneração da folha de pagamento das empresas. Segundo ele, isso já foi feito no passado e não deu certo.
“A gente vê: ‘Vamos desonerar a folha, mas vamos criar um imposto novo’. É a mesma equação de 1996 a 2008, acho eu. Onde estávamos querendo dar solução para o Brasil, criava um imposto. Aumentava uma alíquota, aumentamos 9% do PIB nossa carga tributária e continuamos com os problemas mais graves do que tínhamos antes”, destacou o presidente da Câmara.
Maia afirmou que a desoneração da folha no modelo já feito durante o governo da ex-presidente Dilma Rousseff não gerou “um emprego”. Segundo ele, é preciso debater novas estratégias.
“Se queremos desonerar a folha, vamos olhar as despesas públicas. Onde cortar despesa para poder desonerar a folha. Não será aumentando mais impostos que vamos resolver nossos problemas”, disse.
Reforma ampla
Durante o debate, Affonso Celso Pastore, economista e ex-presidente do Banco Central (BC), defendeu uma reforma tributária ampla, nos moldes da proposta apresentada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP) em discussão no Congresso.
O governo enviou na semana passada ao Congresso um projeto de unificação do PIS/Cofins (impostos federais), com uma nova alíquota de 12% para as empresas e de 5,8% para instituições financeiras.
A proposta foi considerada tímida se comparada aos dois textos em tramitação no Congresso. A sugerida por deputados propõe a unificação de cinco impostos. Senadores propuseram unificar nove tributos.
“O que nós precisamos, na verdade, é de uma reforma tributária corajosa sobre bens e serviços que realmente introduza um IVA [Imposto sobre Valor Agregado] verdadeiro, com alíquota única, que seja cobrado no destino do bem, e não na origem, e termine com a guerra fiscal entre os estados”, defendeu Pastore.
O presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, e o relator da reforma tributária na comissão mista que discute o assunto, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), seguiram a mesma linha.
“O que eu defendo é uma reforma ampla, de se mudar sobretudo essa tributação. Na PEC 45 [proposta por deputados], estamos de fato trazendo um 'IVA 5.0', na comparação com 5G”, afirmou Ribeiro.
“Nós apoiamos principalmente a reforma da PEC 45 porque entendemos que ela é uma proposta que abrange não só os impostos federais, mas os municipais e estaduais. é importantíssimo que tenhamos uma simplificação no pagamento de tributos, não só para a União mas para os entes da federação”, declarou Braga.
Primeira etapa da reforma tributária deve gerar aumento de preços no setor de serviço
Análise de especialistas em tributação ouvidos pelo HuffPost indica que proposta do governo que unifica PIS e Cofins pode sair cara ao consumidor.
É praticamente consenso a necessidade de uma reforma tributária no Brasil. Muito se fala sobre a carga elevada de impostos no País e sobre as barreiras geradas por todos os tributos que o contribuinte tem de pagar para o crescimento do País. É nesse contexto que o governo do presidente Jair Bolsonaro iniciou a apresentação de sua proposta. A primeira parte entregue ao Congresso Nacional busca simplificar a cobrança de tributos, mas, segundo especialistas ouvidos pelo HuffPost, pode gerar aumento de preço nos serviços ao consumidor.
Essa primeira fatia da reforma unifica dois impostos pagos por empresas, o PIS (Programa de Integração Social) e o Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), em um só: a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), com uma alíquota única de 12%.
A princípio, não haverá impacto para empresários inscritos no Simples Nacional e sobre os produtos da cesta básica. Entidades beneficentes, templos de qualquer culto, cooperativas e condomínios também estão entre as organizações que não pagarão a CBS. A nova alíquota incidirá sobre a receita decorrente do faturamento empresarial — a receita bruta — e não mais sobre todas as receitas.
Segundo o governo, o novo imposto “contribui para um sistema mais simples, neutro e homogêneo que tornará a reorganização das atividades empresariais mais eficiente”. “O que impulsionará a produtividade e o crescimento econômico”, ressalta. Economistas e advogados ouvidos pelo HuffPost apontam como fatores positivos a simplificação e o fim da cumulatividade dos impostos, mas alertam para possíveis consequências.
O pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia, da FGV (Fundação Getulio Vargas), Matheus Rosa Ribeiro ressalta que há previsão de que essa etapa da reforma aumente a carga tributária sobre serviços e gere leve aumento de preço no setor. “Mas declarações recentes de participantes da formulação da proposta de reforma tributária do governo sinalizam que o fim da cumulatividade faria que o efeito final fosse uma redução da carga tributária paga pelo setor, o que não geraria pressão para aumento de preços dos serviços”, pondera.
O advogado e especialista em Estratégias Societárias, Sucessórias e Tributação pela FGV Eduardo Natal corrobora a análise. Segundo ele, de forma geral, essa primeira parte da reforma aumenta os custos para as empresas, e elas vão repassar para os bens e serviços no consumidor final.
“O consumidor vai ter, pela característica de cobrança dos impostos nos municípios, estados e na União, provavelmente um aumento de carga tributária. Esse aumento de carga tributária para as pessoas jurídicas vai impactar no preço dos bens e serviços. Para a população em geral, a princípio, a forma como foi divulgada a proposta do governo de criar a CBS deve encarecer os bens e serviços.”
Para a população em geral, a princípio, a forma como foi divulgada a proposta do governo de criar a CBS deve encarecer os bens e serviços.Eduardo Natal, especialista em Tributação pela FGV
Isso ocorre porque quando você tem um tributo não cumulativo, via de regra, você acaba repassando o montante para o consumidor final, explica o professor de planejamento tributário do MBA em Marketing da Fundação Instituto de Administração, da USP (Universidade de São Paulo), Caio Bartine. Ele acrescenta que outro setor que será afetado é o que envolve cobrança nas plataformas de intermediação de serviços, compras digitais, internet. “E quem acaba mais uma vez sendo o mais onerado é o consumidor final”, diz.
Para ele, a reforma apresentada é tímida. “Entendo que é um passo para que o texto seja aprovado, mas esperava mais”, diz. A expectativa dele é que haja sequência na reforma com debate sobre impostos como o ICMS, o ISS. “Essa reforma apresentada exige que haja continuidade. Ainda temos alta burocracia em questões administrativas e só vai se falar em reduzir carga tributária quando o governo reduzir despesa pública. Enquanto a despesa estiver alta, o governo não vai poder abrir mão da arrecadação”, adverte.
Próxima fase
A promessa do governo é continuar a enviar ao Parlamento as próximas etapas da reforma. Mais uma fatia é esperada para o início do próximo mês. Apesar de as propostas ainda não terem sido dissecadas, Matheus Rosa Ribeiro, da FGV, afirma que uma reforma tributária poderia gerar ganhos na produtividade.
“O que se pode dizer é que uma redução dos encargos trabalhistas e da pejotização, prometida pelo governo, poderia ser importante estímulo ao emprego formal. Além disso, uma tributação sobre pagamentos, também não detalhada, poderia incidir sobre transferências cotidianas e afetar o cidadão comum”, diz o pesquisador da FGV.
Ainda sobre a pejotização, o pesquisador afirma que o ideal, e que o governo está prometendo, é reduzir os incentivos tributários desse método de contratação, “que gera muitos problemas, entre os quais uma maior dificuldade no financiamento do sistema previdenciário”.
Em relação à expectativa de criação de um novo imposto, aos moldes da antiga CPMF, Eduardo Natal acredita que pode ter impacto negativo para o desenvolvimento do País. “Não é um modelo de tributação interessante para o Brasil se formos ver a reforma tributária como algo para alavancar o modelo orgânico de tributação. A CPMF é um imposto regressivo, incide sobre todas as etapas da cadeia produtiva e operacional, encarece o preço de todos os bens e serviços”, destaca.
Segundo ele, assim como deve ocorrer com a nova CBS, se implantado, o imposto deve ser repassado para o contribuinte. “Além disso, dificulta a exportação, porque impacta desde a cadeia primária até desenvolvimento da exportação, ainda que se desonere na etapa final.”
O presidente Jair Bolsonaro tem negado que o governo pretenda criar uma nova CPMF. No último dia 18, ele afirmou que o novo imposto sobre transações a ser proposto pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, não é igual ao antigo “imposto do cheque”. “O que o Paulo Guedes está propondo não é CPMF, é uma tributação digital pra financiar um programa”, disse o presidente. Segundo ele, é uma compensação. “É eliminar um montão de encargo em troca de outros.”
Não vejo home office permanente como uma grande revolução, diz presidente do Santander
Sergio Rial informa que 60% dos funcionários administrativos já voltaram ao trabalho presencial e defende que decisão permanente deve ser feita por cada área.
Por Valor Online
O presidente do Santander Brasil, Sérgio Rial, afirmou que 60% dos funcionários da área administrativa já voltaram ao trabalho presencial nas últimas semanas e que as agências estão operando com “normalidade”, apesar do horário ainda restrito.
Segundo ele, as pessoas que se julgam grupo de risco permanecem em casa. Outras ainda estão em trabalho remoto para que os escritórios cumpram o distanciamento necessário.
Rial disse que as discussões sobre um home office permanente pertencem a cada área. “Não tem resposta que se aplique a todos’, afirmou o executivo em entrevista a jornalistas. “Não vejo isso como uma grande revolução. Não é a panaceia nem algo tão transformador como se imagina.”
O executivo afirmou que grande parte dos desligamentos realizados pelo Santander nas últimas semanas é de funcionários terceirizados. O banco encerrou junho com 46.348 colaboradores, uma redução de 844 pessoas. “Nos próprios, a gente fez o que sempre faz, que é a busca por melhor produtividade”, disse.
Houve também o fechamento de 50 agências entre março e junho, levando o total para 2.209. De acordo com Rial, não há uma “agenda” de fechamentos de unidades físicas, mas ajustes onde há proximidade.
Sérgio Rial, presidente do Santander Brasil, sobre o trabalho remoto: "Não é algo tão transformador como se imagina".
Agronegócio é único setor da economia a aumentar vagas de trabalho no 1º semestre, diz CNA
Enquanto os dados gerais de emprego no país mostram queda de 1,2 milhão de postos, agropecuária abriu 62,6 mil novas vagas no período.
Por G1
O agronegócio foi o setor que mais gerou empregos com carteira assinada no primeiro semestre de 2020, segundo levantamento da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), com base nos dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
Nos 6 primeiros meses do ano, o setor foi responsável por 62,6 mil novas vagas, sendo a única atividade que gerou empregos no período. Enquanto isso, os dados gerais mostraram saldo negativo, de -1,2 milhão de vagas.
Dados em junho
No mês passado, o setor teve saldo positivo de 36,8 mil postos de trabalho. No comportamento mensal, apenas o agro e a construção civil contrataram mais do que demitiram, segundo a CNA.
Das 36,8 mil vagas criadas pelo agro em junho, as culturas permanentes geraram 14,1 mil novos postos, com destaque para laranja, café e uva. As lavouras temporárias tiveram saldo positivo de 10,6 mil empregos formais, onde a produção de soja liderou a contratação de mão-de-obra.
As atividades de apoio à agricultura (9,8 mil), a criação de bovinos (1,2 mil) e de aves (792) também ajudaram a gerar novos empregos.
São Paulo foi o estado com o maior número de novos empregos (23 mil), onde a laranja, o café e a soja se destacaram. Em seguida vêm Mato Grosso, com mais de 3 mil vagas, principalmente nas lavouras de soja e algodão, e Minas Gerais, com mais de 2 mil postos, sendo a maioria na cafeicultura.
Discutir reforma tributária na epidemia pode distorcer objetivos, dizem juristas
Uma crise sanitária causada pela covid-19 e diretamente responsável por graves problemas econômicos e sociais, ocorrências que aumentam os embates federativos, levando a maior distensão entre União e estados municípios. É nesse cenário que o governo federal escolheu enviar sua primeira proposta para reforma tributária. Seria mesmo o momento apropriado para discutir uma transformação estrutural do aparato de arrecadação brasileiro?
Para juristas especialistas em Direito Tributário convidados a participar do 1º Congresso Digital da OAB, encaminhar a reforma tributária durante a pandemia pode levar à distorção de seus objetivos fundamentais. A opinião foi dada em painel na tarde desta terça-feira (28/7), com o tema “Tributação, Pandemia e Reforma Tributária”, mediado pelo advogado Igor Mauler Santiago.
Para o presidente da Comissão Especial de Direito Tributário da OAB Nacional, Eduardo Maneira, embora a necessidade de fazer a reforma seja inconteste, a epidemia o faz colocar o pé no freio. Em sua opinião, não há ambiente para criar o pacto federativo necessário para discutir e implementar as mudanças, enquanto que a situação fiscal da União deve se agravar por conta das consequências da crise.
“Se temos que abrir o caixa, fazer a reforma tributária agora pode levar à necessidade de aumento da carga, que é o que não queremos. Precisamos de uma reforma ampla, que seja neutra no sentido de não aumentar a carga tributária, mas de simplificar a tributação do consumo sem prejuízo de atacar outras questões pontuais que merecem ser atacadas, mas não necessariamente na Constituição Federal”, opinou.
“A gente tem que ponderar se este é o momento ideal para fazer a reforma ou debater sobre”, concordou a professora da FGV, Tathiane Piscitelli. Ela destacou que a epidemia, além de exacerbar as desigualdades, instalou uma crise de confiança entre os entes federativos que dificilmente vai ser superada no contexto de uma discussão legislativa sobre o sistema tributário. Além disso, todas as propostas incorrem em aumento de tributos.
“A gente deveria usar o momento da pandemia, que mostra efetivamente que tipo de país a gente é — desigual, com pobreza e que precisa de reforma, mas uma que reflita uma mudança estrutural do sistema numa perspectiva redistributiva. Precisamos olhar para o sistema e tornar mais justo, em vez de aprovar emendas que agravem a desigualdade. A simplificação de tributos é um valor tão absoluto que deve estar acima de todos os outros?”, indagou.
O distanciamento político da União para com estados e municípios no contexto do combate à Covid-19 também foi destacado pelo procurador tributário da OAB Nacional, Luiz Gustavo Bichara, como um entrave a discussões sobre reforma tributária.
“O governo não quer fazer reforma tributária. Se quisesse, teria participado do debate das PECs que tramitam no Congresso ou teria enviado projeto antes. Por que quer fazer agora? Porque mais uma vez quer avançar sobre recursos que cabem aos outros entes federados, tornando federação ainda mais complexa e mais injusta”, opinou.
“A pior postura é ser contra a reforma tributária no sentido de que, se você fica contra, não é convidado ao debate. Essa vontade política não depende muito da gente. Temos que ir de acordo com aquilo que a classe política vai conduzindo. Talvez não seja o melhor momento, mas se o Congresso conduzir, temos que participar e colaborar”, relevou Eduardo Maneira.
Proposta governamental
O Ministério da Economia enviou sua primeira proposta em 21 de julho: a substituição de PIS e Cofins pela Contribuição sobre receita decorrente de operações com Bens e Serviços (CBS), cuja alíquota seria única e de 12% para empresas. A ideia se restringe aos tributos federais e foi pensada no contexto de ser anexada à PEC 45, já em tramitação.
“A proposta do governo, eu li com decepção. É novidade com cheiro de naftalina. A ideia da fusão de PIS e Cofins com leve aumento de alíquota é coisa debatida desde o governo Dilma. Nunca foi feito por uma razão simples: a ideia é péssima. A CBS, tal qual colocada, é péssima. Estamos falando pura e simplesmente de aumento de tributo”, opinou Luiz Gustavo Bichara.
Tathiane Piscitelli fez duas críticas. A primeira é que o imposto proposto não comportaria incentivo fiscal, sendo a alíquota única como forma de combate à guerra fiscal. “Imaginem hoje, no contexto de pandemia, se não tivéssemos nenhum tipo de benefício tributário para, por exemplo, a cesta básica”, indagou. A segunda é que a majoração da tributação de serviços pode estimular a terceirização, precarização do trabalho e agravamento de desigualdades.
Segundo Eduardo Maneira, o aumento da carga tributária sobre serviços é inevitável. “Neste ponto, os formuladores das PECs estão sendo transparentes. Eles querem que haja aumento, Cabe a nós, prestadores de serviço, propor algo que seja realista. Trazer o mundo ideal para a nossa realidade”, disse.
Maioria tem dificuldade de equilibrar vida pessoal e profissional no home office
Estudo da FGV mostra que 56% dos profissionais tem problemas para conciliar os dois universos
Ainda segundo o levantamento da consultoria, 86% das empresas brasileiras mandaram suas equipes inteiras, ou parte delas, trabalhar em casa. Em meados de março, o Banco Pine colocou todos os seus 402 funcionários em home office. Segundo a superintendente de RH da empresa, Jussara Penhalbel, a produtividade das equipes superou as expectativas –atualmente, só 10% deles voltaram a dar expediente na empresa.
"Acabou funcionando bem. As reuniões se tornaram mais curtas, pontuais e produtivas. Mas, para que o modelo dê certo, organização e disciplina se tornaram competências fundamentais." Profissional da área de investimentos do banco, Maria Claudia Prado, 36, estreou no trabalho remoto durante a pandemia e logo descobriu que, sem muita organização doméstica, não conseguiria dar conta do recado.
Casada e mãe de um menino de dois anos, que deixou de ir para a escola, ela dispensou diarista e babá e precisou escalonar o tempo levando em conta a agenda do marido. "Tenho horários definidos para cada tarefa profissional e pessoal. Mas nem sempre funciona muito bem. Afinal, há dias caóticos."
Mas conciliar os afazeres domésticos e profissionais não foi o único problema trazido pelo home office. Pesquisa interna do Banco Pine demonstrou, por exemplo, que a maioria dos colaboradores enfrentava dificuldades com a internet doméstica de baixa velocidade.
Segundo a superintendente de RH, foi preciso fornecer ajuda de custo provisória de R$ 100 para que todos melhorassem seus pacotes de dados, e desenvolver uma cartilha com dicas de produtividade. "Ensinamos que tipo de mesa e cadeira usar, como é importante trocar a roupa antes de começar a trabalhar e como usar ferramentas de gestão à distância", diz Penhalbel.
Não foi diferente nas empresas de pequeno porte. Dono de um escritório de arquitetura com 15 funcionários, o arquiteto Bruno Moraes, 34, pôs toda e equipe em trabalho remoto em meado de março, tão logo começou a quarentena. A infraestrutura tecnológica estava pronta. "Já tinha toda a operação online, das compras à gestão financeira, e os funcionários tinham acesso por meio de um aplicativo. Esta parte foi fácil", conta.
Só que faltavam, a boa parte da equipe, espaços domésticos adequados para trabalhar. Para resolver o problema, Moraes emprestou cadeiras do escritório e permitiu que todos levassem os seus computadores. A medida foi fundamental para que a arquiteta Mariam Ayde, 37, cumprisse suas funções de forma remota. Mas ela passou por alguns apertos.
"Moro em uma casa pequena de três dormitórios, com meus pais, um casal de irmãos e três cachorros. Com todos trabalhando em casa, fizemos uma escala para dividir os ambientes, mas foi um mico só. Como sou a caçula, ficava movendo o computador de um lado para outro."
Assim que o escritório reabriu, em julho, Mariam devolveu a cadeira e passou a alternar dias de trabalho remoto e presencial, sempre levando o computador embaixo do braço. Mas ela não pretende deixar de fazer home office, pelo contrário. "Quero morar sozinha para montar uma estrutura melhor e passar a trabalhar mais em casa. Como levo 40 minutos para chegar ao escritório, vou aproveitar esse tempo."
Varejo não vai aceitar aumento de impostos, diz Luiza Trajano, do Magazine Luiza
“O governo precisa criar medidas para modernizar e desburocratizar o país e elas precisam ser imediatas", disse Trajano em entrevista à CNN. "Precisamos de facilidades no crédito para pequenas empresas e simplificar o sistema tributário através da modernização. A respeito do aumento de impostos, não quero nem saber se é CPMF, mas esqueça. O setor produtivo não irá tolerar isso.”
Ela defende uma modernização no sistema de pagamento de impostos através da digitalização dos processos. Disse também que o governo precisa se atentar a não onerar mais a cadeia produtiva. A reclamação de Trajano não foi à toa: o setor de serviços seria um dos mais onerados pela reforma tributaria proposta pelo governo.
Saúde financeira
Enquanto o Brasil pena para sair da crise, o Magazine Luiza está indo muito bem, segundo Trajano. Um dos exemplos que a empresária deu foi a contratação de 300 pessoas em plena pandemia. De acordo com ela, isso só ocorreu porque a companhia está passando um por processo de digitalização contínuo – e que foi muito acelerado na pandemia.
Os investidores também estão contentes com o que a empresa vem mostrando até agora. Desde o início do ano, as ações do Magazine Luiza negociadas na bolsa de valores de São Paulo, a B3, já tiveram um salto de 67%. Enquanto isso, no mesmo período, o Ibovespa, que é o principal índice da B3, caiu 9,6%.
“O varejo foi atingido, porém nosso segmento se saiu melhor na pandemia especialmente aqueles que estavam preparados para o comércio digital", diz Trajano.
"Sempre acreditei que o digital é uma cultura e que ia demorar para ser implementada, mas a pandemia acelerou este processo. As lojas físicas não vão acabar, mas vão se tornar um complemento do e-commerce.”
A empresária também está à frente do grupo Mulheres do Brasil que, entre outras bandeiras, o combate à violência contra a mulher, igualdade social da mulher negra, inserção de refugiados na sociedade e o empreendedorismo.
Não por acaso, Trajano disse que sua atuação nos últimos meses foi focada na tentativa de evitar demissões por parte de pequenas e médias empresas, que segundo ela gera 85% dos empregos no país.
“Um país em desenvolvimento vive de renda e crédito, e quem garante isso é o emprego. Se você tira o emprego você acaba com seu próprio consumo. Tentei ao máximo fazer com que empresas não demitissem.”
Vale a pena voltar a taxar dividendos? Para ex-secretário da Receita, não
Os dias de dividendos livres de impostos podem estar acabando. O Brasil está entre os poucos países do mundo onde os dividendos, que são o pedaço do lucro das empresas repassado para os acionistas, têm taxação zero.
O fim da isenção, entretanto, entrou de vez para os debates econômicos e também já está listado para entrar na reforma tributária planejada pelo governo ainda este ano.
É um dos poucos pontos que parece unir economistas e políticos de um espectro que vai de Paulo Guedes ao Partido dos Trabalhadores: para uns, é uma maneira de dividir com os acionistas um peso tributário que recai inteiro sobre as empresas. Para outros, cobrar investidores e empresários hoje isentos nesta parte de sua renda é também uma questão de justiça.
Para o ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel, entretanto, esse consenso é uma ilusão. De acordo com ele, voltar a tributar os dividendos cria uma série de distorções que traz mais prejuízos do que ganhos para o país, como novos tipos de sonegação e a necessidade de tributos ainda mais altos para manter a mesma arrecadação.
Maciel chefiou a Receita Federal durante todo o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), e foi sob sua gestão que os impostos sobre os dividendos foram zerados. A medida foi parte de uma grande reforma do imposto de renda das empresas feita em 1995.
“Taxar o dividendo aumenta o planejamento tributário abusivo das empresas, limita a liberdade do investimento, demanda uma alíquota muito elevada para não perder arrecadação e abre caminho para um dos tipos de sonegação mais difíceis de ser percebidas”, defendeu o ex-secretário, em entrevista ao CNN Business.
Maciel não só justifica porque optaram por essa solução à época, como segue até hoje defendendo ser este o caminho mais eficiente para taxar os lucros das empresas. Veja a seguir os principais argumentos elencados por ele.
Queda de arrecadação
O ponto de partida é que a conta não fecha: ou a arrecadação cai, ou o imposto sobre o dividendo tem quer ser muito mais alto do que o inicialmente imaginado para manter a mesma receita de hoje.
Isso porque, em qualquer lugar do mundo, o imposto de renda (IR) sobre os lucros pode ser recolhido em duas frentes: no lucro total apurado, ainda dentro da empresa, ou no pedaço deste lucro que é distribuído para os donos, sócios e investidores, que é o dividendo. Neste caso, o IR é pago pela pessoa física, já do lado de fora da companhia.
Na maior parte dos países essa tributação é dividida: uma parte é descontada do lucro total, paga pela empresa, e a outra é retirada do dividendo, paga pelos acionistas (veja tabela ao fim). No Brasil, o imposto total – de 34% – é até parecido com o de outros países, mas, desde a reforma de 1995, recai inteiro só na empresa. Isto, de acordo com os críticos, colabora para engordar a alta carga tributária que dificulta fazer negócios no país.
A ideia já defendida pelo ministro da Economia Paulo Guedes é que, com a reforma tributária, se baixe um pouco os 34% da empresa (para 20%, por exemplo) e aumente o zero do dividendo (para algo próximo de 15%). Ao final, seriam mantidos os mesmos 34%.
Por lógica, aponta Maciel, a arrecadação será menor. “A base do dividendo é mais estreita, porque ele é um pedaço do lucro”, diz. “Se a tributação final ficar menor, eu estarei perdendo arrecadação em uma situação de grave crise fiscal. Se ficar maior, eu enganei as pessoas e só aumentei imposto. E se ficar igual, para que mudar e gerar uma série de problemas?”, questiona.
Novo imposto muito mais alto
Como o dividendo é só um pedaço do lucro todo, a conta não é tão simples quanto tirar 10% de um e colocar os mesmos 10% no outro.
De acordo com Maciel, cálculos da Receita Federal estimam que, para cada 1% retirado de IR do lucro da empresa é preciso acrescentar 4% no dividendo para que o Fisco receba o mesmo tanto ao final. É a chamada alíquota de equilíbrio.
“Se eu reduzo a alíquota de 34% da empresa em 1 ponto, para 33%, eu tenho que tributar o dividendo em 4%”, explica o ex-secretário, “se baixar em 10%, tenho que botar 40% no dividendo; apenas para ficar igual".
Além disso, as empresas podem alterar as proporções do que hoje retêm do lucro do lado de dentro e do que distribuem. Se, com uma nova cobrança sobre os dividendos, elas passarem a distribuir partes menores, o bolo total de dividendos sobre o qual vai recair o novo imposto também diminuiu.
Sonegação invisível
De acordo com o ex-secretário, um dos principais problemas criados pela taxação no dividendo – e justamente o que se quis combater com a criação da isenção em 1995 – é o surgimento de formas sofisticadas de evasão fiscal dentro das empresas.
São caminhos que os sócios encontram para continuar recebendo a sua remuneração do lucro, mas desviando da cobrança do imposto. Quando toda a taxação fica apenas na empresa, esses desvios, defende Maciel, ficam praticamente impossíveis, porque o imposto é retirado do lucro antes de qualquer uso, diretamente na fonte.
“Fazer a tributação no dividendo cria um tipo de infração fiscal de dificílimo controle que é a distribuição disfarçada de lucros, ou DDL, e que no Brasil deixou de existir”, diz ele.
“Se o proprietário de uma empresa quer comprar um carro, ele faria a distribuição do lucro, receberia o dividendo e compraria. Mas ele deixa de distribuir e passa a comprar as suas coisas no nome da empresa, e assim não paga o imposto. É preciso uma fiscalização brutal em cima disso e é muito difícil verificar: como definir se aquele carro é pessoal ou da empresa?”
Outra forma de evasão, diz, é o chamado planejamento tributário abusivo. São mecanismos extremamente sofisticados de alocação das rendas, elaborados pelas empresas e seus advogados, que encontram brechas dentro da própria lei para que o dinheiro chegue aos donos por caminhos diferentes, sem passar pela tributação. Compras disfarçadas de bens, empréstimos forjados e remessas para o exterior são alguns desses caminhos.
“O sócio não distribui os dividendos, mas faz as mesmas coisas que faria se distribuísse”, disse Maciel. “Por isso [a taxação dos dividendos] é errada; é ela a maior injustiça fiscal, porque estimula a sonegação, o planejamento abusivo, para não arrecadar nada. Vai na direção contrária do que se quer resolver.”
Por que taxar
Reduzir a carga de impostos sobre o setor produtivo – as empresas –, que paga muito, e aumentar sobre a renda, que paga relativamente pouco no Brasil, é um dos principais argumentos dos defensores da volta da taxação sobre os dividendos no país.
Um estudo feito no começo do ano pela Unafisco, associação que reúne os auditores da Receita Federal, estimou um potencial de arrecadação de R$ 59,8 bilhões ao ano com a taxação de dividendos – já consideradas possíveis perdas com sonegação. Isso abriria um espaço deste mesmo tamanho para cortar no imposto das empresas ou em algum outro lugar.
É metade do que o Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica (IRPJ) levantou em 2018, um total de R$ 119 bilhões, de acordo com os dados mais recentes da Receita Federal. A simulação da Unafisco levou em consideração a aplicação de um IR progressivo sobre o dividendo, de zero a 27,5%, de acordo com a faixa de renda da pessoa.
A entidade destaca a baixa incidência de impostos que recai sobre a renda das faixas mais ricas do país, enquanto consumo e produção têm cargas pesadas. Em sua nota, a Unafisco apontou que, das 25 mil pessoas que têm renda mensal superior a 320 salários mínimos (R$ 334.400 ao mês em 2020), quase 20 mil declaram receber lucros e dividendos como parte de sua renda.
Em 2017, este grupo recebeu um total R$ 182 bilhões dessas remunerações isentas de imposto. É uma média de R$ 9,2 milhões ao ano por declarante. Os dados utilizados são da Receita Federal.
Artigo – Reforma tributária: proposta do Governo prejudica o setor de serviços, o grande motor da economia brasileira
Por Zulmir Breda,
Presidente do Conselho Federal de Contabilidade
Nesta semana, o Governo federal encaminhou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei (PL) nº 3.887/2020, que prevê a substituição do Programa de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep) e a Contribuição sobre o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) pela Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS).
Primeira parte da contribuição do Governo para a reforma tributária que tramita no Congresso Nacional, o PL tem como virtude o fato de tentar simplificar a complexidade do sistema tributário brasileiro, eliminando a maioria dos sistemas de tributação e regimes especiais, com o objetivo de alcançar uma desejada tributação transparente, neutra e uniforme.
Com alíquota de 12% sobre a receita decorrente da atividade principal da empresa, sem a inclusão da própria CBS e de demais impostos em sua base de cálculo, e com créditos sobre todas as aquisições que tenham sido anteriormente tributadas, a CBS traz algumas exceções ao regime geral, mantém poucos regimes especiais e estabelece uma pequena lista de isenções.
Com direito a crédito amplo da CBS paga nas etapas anteriores, o Projeto permite que a CBS seja recolhida ao longo da cadeia produtiva pelo valor agregado em cada etapa, sem deixar grandes resíduos.
Assim, a majoração da alíquota de 3,65% (regime cumulativo) ou 9,25% (não cumulativo) de PIS e Cofins para 12% de CBS não tende a representar efetivo aumento de preço nas transações, enquanto realizadas entre contribuintes abrangidos pela CBS.
Por outro lado, em determinadas transações com não contribuintes, a CBS com alíquota uniforme de 12% representará, de fato, um significativo aumento do preço dessas transações. Além disso, temos que ressaltar também o impacto sobre muitas empresas que estão no Simples Nacional, porque elas provavelmente comprarão insumos de empresas que serão contribuintes da CBS, causando, por conseguinte, aumento de custos para si mesmas. Isso vai gerar impacto também no preço de seus produtos, que são adquiridos por consumidores finais.
Esse quadro nos leva a crer que poderá haver aumento da informalidade ou das demissões, uma vez que dificilmente as empresas terão condições de refletir esses aumentos de custos nos preços de seus produtos e serviços.
É possível depreender, diante desse cenário, que os maiores afetados por essa nova Contribuição serão os consumidores finais e as empresas com quem eles transacionam, notadamente, as sujeitas ao Simples Nacional e ao regime cumulativo do PIS e da Cofins.
A menos que se verifique um ajustamento relativo dos demais preços, de bens e serviços provenientes de empresas atualmente sujeitas ao regime não cumulativo de PIS e Cofins, a proposta contida nesse PL poderá onerar ainda mais o orçamento das famílias brasileiras.
Nesse sentido, entendemos que o Projeto de Lei nº 3.887/2020 deveria ser inserido em uma reforma tributária ampla, apresentada de forma consolidada, incluindo, entre outros pontos, a unificação dos demais impostos federais, estaduais e municipais sobre o faturamento, a desoneração da folha de pagamento, a correção da tabela do imposto sobre a renda da pessoa física e o da pessoa jurídica, a não retroatividade e demais ajustes da legislação específica, visando promover o incentivo ao aumento da competitividade das empresas brasileiras.
Três problemas na reforma tributária do PIS e da Cofins
O ministro Paulo Guedes entregou ao Congresso a primeira das quatro fases em que se desdobrará sua proposta de reforma dos tributos federais. Esta primeira tem 54 páginas de mudanças normativas , sem considerar a exposição de motivos, e tramitará em regime de urgência como PL 3.887, visando unificar o PIS e a Cofins sob o nome de CBS — Contribuição sobre operações com Bens e Serviços. As demais, a serem apresentadas, são (2) a reforma do IPI, transformando-o em um imposto seletivo, (3) a reforma do IRPF e IRPJ, com tributação de dividendos, e (4) a desoneração da folha de salários, com a criação de um tributo sobre transações. Essas propostas de alteração da legislação devem ser acopladas às propostas de alteração da Constituição já em curso no Congresso (PEC 45 e PEC 110), embora a tramitação legislativa de cada qual seja diferente.
Não descerei a detalhes da proposta já apresentada, pois,ou o espaço não seria suficiente, ou acabaria torturando o raro leitor. Comentarei apenas alguns aspectos gerais, apontando os principais pontos positivos e negativos.
Os pontos positivos são claríssimos e de fácil percepção em face do pandemônio tributário em que vivemos. Visa simplificar o sistema acabando com vários formulários (obrigações acessórias) desnecessários e unificar duas contribuições que, na prática, são superpostas. A proposta, porém, é mais ambiciosa, pois, além de unificar, visa reformar o sistema criando as bases de um IVA — Imposto sobre o Valor Agregado nacional, ao qual deverão ser futuramente somados o ICMS (estadual) e o ISS (municipal). Para isso, alega-se que (1) toda aquisição de bens e serviços gerará crédito a ser compensado, e que (2) não haverá aumento de carga tributária, a despeito de ser proposta uma alíquota de 12%.
Os pontos negativos são vários, mas me concentrarei em apenas três, que possuem mais destaque em meu ponto de vista, e que, de certa maneira, estão entrelaçados: (1) o timing, (2) a alíquota proposta e (3) o sistema de compensação de créditos.
Primeiro, sobre o timing. Estamos em plena crise econômica decorrente da pandemia sanitária. Apenas a arrecadação de tributos federais teve queda real de 33% no mês de maio/20 e em abril já havia caído 29%. Considere-se que ano passado, base para essas comparações, a atividade econômica já não era boa. Nesse sentido, há receio que qualquer proposta no âmbito tributário aponte para maior carga tributária do que seria adequado para o desenvolvimento econômico.
Para ultrapassar a presente crise, que é distinta de todas as anteriores, o correto é olhar para a solução adotada pela União Europeia, que acabou de criar um Fundo no valor de 750 bilhões de euros, fruto de endividamento, para soerguer a atividade econômica daqueles países confederados a ser pago em 30 anos. No Brasil estamos buscando uma saída que possibilita o aumento da carga tributária para já (prazo de seis meses), gerando insegurança jurídica e econômica, o que espanta os investimentos. Seria melhor adotarmos a alternativa europeia, e a União se endividar e organizar um plano de recuperação da economia, apoiando empresas e combatendo o desemprego, de forma federativamente organizada, conforme escrevi antes da Lei Complementar 173/20, a qual se revela insuficiente.
Quem sabe se, ao invés das 54 páginas de projeto de lei visando a reforma do sistema, não fosse melhor apenas umas poucas páginas para unificação do PIS e da Cofins, limpando os excessos? A segurança jurídica sairia fortalecida.
Segundo, sobre a alíquota. A proposta apresentada unifica duas contribuições que, somadas, possuem hoje duas alíquotas básicas: 3,65% para a incidência cumulativa, e 9,25% para a incidência não-cumulativa. A alíquota proposta é única, de 12%. Só isso já aponta para dois fatos: (1) haverá aumento da carga tributária, pois a alíquota de 3,65% desaparecerá; e (2) a nova alíquota sugerida empurra o problema para Estados e Municípios, pois invade seu espaço de tributação, uma vez queestes deverão encolher suas alíquotas para se chegar a algum valor adequado para o futuro IVA, que comporá a tributação integral sobre o consumo.
A equipe tributária do Ministro Guedes aponta para dois aspectos acerca desse ponto: que a alíquota será por fora, e não como é hoje, por dentro; e que toda aquisição de insumos gerará crédito.
Concentremo-nos, por ora, no primeiro argumento. Até agora não foi apresentada a fórmula financeira que comprove o alegado. Como uma alíquota de 9,25%, por dentro equivale a 12% por fora. Seria importante que essa comprovação técnica aflorasse para poder comprovar a alegação. Cálculos de padeiro não apontam para isso, considerando ainda que o sistema “por fora”nãosignificaaadoção do sistema norte-americano, mas o afastamento da superposição de bases de cálculo. Até prova técnica em contrário, a alíquota está majorada — sem considerar a questão da extinção do regime cumulativo, com alíquota atual de 3,65%.
Terceiro ponto, a questão do amplo creditamento na compra de insumos. Este é o argumento principal para se alegar que não haverá aumento de carga tributária — o que não condiz com o que se verifica em concreto. Registre-se que a própria equipe tributária vem variando o discurso. Inicialmente dizia-se, de forma peremptória, que não haveria aumento de carga tributária, e que o setor de serviços "não entendeu como funciona o imposto", para, após, dizer que "não existe em lugar nenhum do mundo reforma tributária nula", o que é completamente diferente, pois, o "nula" aponta para a macroeconomia, afirmando que alguns ganharão e outros perderão — o que está correto.
Já está identificado quem vai perder: o setor de serviços. O aumento da carga tributária será brutal. Isso foi bem apontado pelo economista e Presidente do Insper, Marcos Lisboa. O exemplo dele é didático. Olha para um escritório de advocacia que presta serviços no valor de R$ 100, e que hoje, após recolher PIS e Cofins, fica com pouco mais de R$ 96.Depois da reforma, com o tributo a 12%, o serviço passará a custar R$ 112, e "o desembolso da empresa contratante continuará sendo de R$100, pois poderá descontar R$ 12 dos seus tributos devidos". Nesse caso, "o escritório vai receber R$ 112, irá recolher R$ 12 ao Fisco e ficará com R$ 100, mais do que ganha atualmente". E arremata, "aparentemente, há advogados que não entendem como funciona o IVA, imposto adotado em mais de 160 países".
Como disse, o exemplo é didático — porém esconde diversos aspectos em sua simplicidade e na soberba ao afirmara ignorância de advogados. Desloquemos o olhar para o setor de educação. Será que o Insper, qualificada instituição de ensino superior presidida pelo economista Marcos Lisboa, conseguirá transferir o acréscimo de 12% do novo tributo para as mensalidades escolares aos alunos? Se caro leitor for aluno do Insper, ou de qualquer outra instituição de educação, aceitará o aumento do preço?
O que está oculto no exemplo é que o setor de serviços não trabalha apenas para empresas, que tomarão esse crédito. E ainda, nem todas aceitarão o aumento de preços. E se aceitarem, isso tem nítida conotação inflacionária.
O fato é que o setor de serviços, exatamente por prestar “serviços”, não tem créditos a serem compensados. Olhemos para os escritórios de advocacia – o que se adquire para prestar serviços advocatícios? Papel, tinta, energia elétrica, água, aluguel, condomínio? Mesmo que tudo isso gere crédito, o que é duvidoso, ainda assim será grande o impacto fiscal, pois o principal insumo de qualquer prestador de serviços é a mão-de-obra — que não gerará crédito, segundo a proposta. Seguramente o Insper tem como principal custo os salários de seu qualificado corpo docente. Aqui está o problema.
Como solucioná-lo? Duas alternativas me ocorrem, a serem testadas: ou se utiliza para o setor de serviços a mesma alíquota proposta para o setor financeiro, de 5,8% (o que já representa aumento da carga tributária); ou se concede crédito (pleno ou presumido) para o custo de mão-de-obra, principal insumo do setor de serviços — e também do setor financeiro.
Enfim, mantenho o que já afirmei anteriormente. Não é hora de fazer reforma tributária, embora meros ajustes sejam sempre bem vindos, em face da atual complexidade do sistema. Mexer nessa casa de marimbondos sempre acaba em aumento de carga tributária, embora isso seja negado, como de hábito.
No passado inflacionário brasileiro, de triste memória, dizia-se que os ministros da Economia (ou da Fazenda) tinham o direito de mentir a cada vez que lançavam mais um pacote para conter a inflação. Usa-se agora deste expediente para as reformas tributárias, que são necessárias, mas inoportunas, alegando-se que não haverá aumento de carga tributária — é ver para crer.
