Coronavírus: empresas poderão cortar jornadas e salários pela metade

Medidas são temporárias, em troca da manutenção do emprego

Publicado em 18/03/2020 - 20:40 Por Wellton Máximo – Repórter da Agência Brasil - Brasília

Além de permitir o adiamento do pagamento de tributos e contribuições, o governo quer permitir que as empresas afetadas pela crise do coronavírus cortem temporariamente metade da jornada e dos salários dos trabalhadores. Nos próximos dias, uma medida provisória (MP) deve ser editada para flexibilizar normas trabalhistas durante o estado de calamidade pública.

Segundo o Ministério da Economia, a medida é importante para evitar demissões e a perda de empregos provocada pela queda da atividade econômica. A negociação será individual.

“É preciso oferecer instrumentos para que empresas e empregados superem esse período de turbulência. O interesse de ambos é preservação de emprego e renda”, disse o secretário de Trabalho da pasta, Bruno Dalcolmo.

O salário-hora do trabalhador não pode ser reduzido, de forma que a diminuição da jornada seja proporcional à redução do salário. As empresas também deverão continuar a pagar pelo menos o salário mínimo.

“Não é algo simples, mas a ideia é preservar o emprego. Muito mais grave, diante de uma crise dessa, é a pessoa perder o emprego e sobreviver sem salário”, justificou o secretário especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco. Segundo ele, a ideia é que o trabalhador tenha uma renda de subsistência durante o estado de calamidade.

Férias e feriados

A medida provisória também prevê a simplificação de diversos itens, como o trabalho remoto, a antecipação de férias individuais e de feriados não religiosos e a decretação de férias coletivas (tanto num setor como em toda a empresa). O trabalhador com horas a mais trabalhadas poderá usar o banco de horas para tirar folgas, em troca da reposição depois do fim da calamidade pública, limitada a duas horas por dia.

Em entrevista coletiva para detalhar as novas medidas para a preservação dos empregos, a equipe econômica informou que cogitava em incluir, na medida provisória, um dispositivo que permitia a suspensão do contrato de trabalho, nos moldes de alguns países europeus. Nesse caso, o trabalhador não teria o salário reduzido a zero, mas receberia uma parte da remuneração, conforme explicou Dalcomo.

Na segunda-feira (16), o ministro da Economia, Paulo Guedes, tinha anunciado uma série de medidas para ajudar empresas afetadas pela crise do coronavírus. As ações incluíam o adiamento, por três meses do pagamento das contribuições do patrão ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), dos tributos relativos ao Simples Nacional e a redução, pelo mesmo período, das contribuições para o Sistema S. O governo também destinou uma linha de crédito de R$ 5 bilhões do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

Edição: Liliane Farias


Coronavírus: Receita avaliará se há necessidade de estender prazo para declaração do IR 2020

Por Alexandro Martello, G1 — Brasília

O secretário da Receita Federal, José Barroso Tostes Neto, afirmou nesta quarta-feira (18) que o órgão avaliará se há necessidade de estender o prazo de entrega das declarações do Imposto de Renda 2020. O prazo termina em 30 de abril.

Atualização: No dia 1º de abril, a Receita Federal anunciou a decisão de adiar para o dia 30 de junho o prazo para envio da declaração. Antes previsto para terminar em 30 de abril, o prazo foi estendido em 60 dias devido à crise provocada pela pandemia do coronavírus.

De acordo com o secretário da Receita, o fluxo de entrega das declarações está bom. Até esta segunda-feira (16), foram recebidos mais de 4,63 milhões de documentos, contra 3,2 milhões no mesmo período de 2019.

"Vamos avaliando como se comporta esse fluxo e se há alguma dificuldade par que os contribuintes preparem e enviem suas declarações. Iremos considerar um aspecto importante que, para um número expresso de contribuintes, há um interesse em receber suas restituições, que só poderão ser feitas se as declarações forem entregues", disse.

Restituição do IR

O pagamento das restituições é feito de acordo com a ordem de entrega das declarações, priorizando os idosos, pessoas com alguma deficiência física ou mental ou moléstia grave e aqueles cuja maior fonte de renda seja o magistério.

Neste ano, as restituições serão pagas em cinco lotes, e não mais em sete, e o primeiro lote do IR será liberado em maio – até o ano passado, os lotes começavam a ser liberados em junho. Os outro quatro lotes de restituição neste ano serão pagos em junho, julho, agosto e setembro.

Tostes Neto observou que os valores das restituições representam "importante montantes" que serão alocados na economia. "Tudo isso erá avaliado, e vendo o impacto da crise, decidiremos no momento adequado, e com antecedência, se haverá necessidade dessa medida [postergar o prazo final]", concluiu ele.


Novas medidas anticoronavírus devem contemplar empresas do Simples

Fontes afirmam que governo vai suspender temporariamente o pagamento de impostos

Novas medidas anticoronavírus devem contemplar empresas do Simples e trabalhadores 

Fontes afirmam que governo vai suspender temporariamente o pagamento de impostos de empresas do Simples e de contribuintes que usam regime de lucro presumido

Adriana Fernandes, O Estado de S.Paulo

A nova etapa de medidas que o governo vai tomar contra os efeitos do novo coronavírus na economia devem contemplar suspensão temporária de pagamento de tributos de empresas do Simples e de contribuintes do setor de serviços que usam o regime de lucro presumido.

O governo também deve tomar  ações para ajudar trabalhadores no momento em que se espera o auge da pandemia no Brasil, nos meses de abril, maio e junho, informou um integrante da equipe econômica.

Fonte da equipe econômica, que participa da elaboração das ações de combate, informou que as medidas serão “potentes”, mas “pontuais”.

A ideia é que as medidas sejam temporárias e não passem de 2020. A fonte disse que serão transitórias para evitar que o choque atual se transforme num problema permanente para as contas públicas.

A equipe econômica avalia anunciar primeiro o tamanho do bloqueio necessário para o cumprimento da meta fiscal de resultado das contas do governo. O Estadão/Broadcast antecipou que o governo deve pedir ao Congresso para que o rombo neste ano seja maior que os R$ 124 bilhões da meta atual. A mudança da meta fiscal já é dada praticamente como certa diante do cenário adverso.

Plano anticoronavírus

Na última quinta-feira (12), o Ministério da Economia anunciou as primeiras medidas de enfrentamento aos impactos do novo coronavírus no País. Haverá antecipação de 50% do 13º de aposentados e pensionistas do INSS para o mês de abril, com injeção de R$ 23 bilhões na economia, além de redução nas taxas de juros de empréstimos consignados para esse público e extensão do prazo de pagamento.

O governo também vai propor ao Congresso a ampliação da margem do benefício que pode ser comprometida com desconto em folha, hoje em 30% para empréstimos e 5% para cartão de crédito.

Hoje, o Conselho Monetário Nacional (CMN) aprovou na manhã desta segunda-feira, 16, em reunião extraordinária, duas medidas para facilitar a renegociação de até R$ 3,4 trilhões em empréstimos por famílias e empresas e ainda ampliar a capacidade de crédito do sistema financeiro em até R$ 637 bilhões.

Estadão/Broadcast apurou que outras medidas estão em estudo, entre elas a ampliação de recursos para o Bolsa Família num momento de maior fragilidade das camadas mais pobres da população. A área econômica também avalia suspender pagamentos da contribuição sobre a folha de salários para evitar que empresas comecem a demitir funcionários.

O que já foi anunciado

  • Antecipação da primeira parcela do 13º dos segurados do INSS para abril (injeção de R$ 23 bilhões na economia).
  • O governo facilitou a renegociação de dívidas pelas empresas e pessoas físicas e facilitam a concessão de crédito pelos bancos.
  • Redução do limite de taxa de juros e aumento de prazo para empréstimos consignados em folha de pagamento dos beneficiários do INSS.
  • Uma proposta será enviada ao Congresso para ampliar a margem do salário que pode ser comprometida com a parcela do financiamento. Hoje essa margem é de 30% em caso de empréstimo e 5% para cartão de crédito.
  • Suspensão por 120 dias da prova de vida dos beneficiários do INSS para evitar ida às agências.
  • Incremento das linhas de crédito dos bancos públicos, principalmente capital de giro. Há recursos disponíveis também para a compra de carteiras de crédito de bancos pequenos e médios.
  • Crédito extra de R$ 5 bilhões para a saúde. Outros R$ 5 bilhões podem ser liberados nas próximas semanas.
  • Isenção de imposto de importação sobre produtos médicos hospitalares.

Em estudo

  • Ampliação do Bolsa Família;
  • Liberação de uma nova rodada de saques do FGTS;
  • Regulamentação do consignado com garantia do FGTS;
  • Adiamento de pagamento da contribuição sobre a folha de pagamento e outros tributos para empresas do Simples;
  • Suspensão temporária do pagamento de dívidas de Estados e municípios com a União;
  • Auxílio para a área da educação também está sendo estudado para evitar alastramento da pandemia nas escolas públicas;
  • Medidas voltadas para micro, pequenas e médias empresas;
  • Acionamento de “arma secreta” do ministro Guedes para ajuda à população mais pobre, a ser acionada assim que avançarem os projetos mais importantes;
  • Nova rodada de liberação de depósitos compulsórios;

O coronavírus chegou ao Brasil: quais são as implicações legais para as empresas?

Fonte: Daniel Bijos Faidiga e Vinícius Laureano - LBZ Advocacia

 

Reprodução: pixabay.com

 

É fato, o coronavírus chegou ao Brasil e, além de todas as questões médicas envolvidas, surgem diversas dúvidas em relação às implicações legais para as empresas.

 

Aspectos Trabalhistas:

 

Em relação aos empregados, como proceder? Fazer ou não home office? Se algum empregado foi contaminado, devo informar aos demais? Afasto o empregado contaminado? E o suspeito de contaminação? E se afastar o empregado, quem paga sua remuneração? Posso obrigar os empregados a fazer o exame médico?

 

Recentemente tivemos a publicação de duas normas para nos ajudar a responder essas perguntas: a Lei 13.979/20 e a Portaria MS 356/2020, que trouxeram os conceitos jurídicos de “isolamento” e “quarentena”:

 

·       Isolamento de pessoas contaminadas: somente pessoas contaminadas poderão ser isoladas, por prescrição médica ou por recomendação do agente de vigilância epidemiológica, e pelo prazo máximo de 14 dias, podendo se estender por igual período se comprovado o risco de transmissão via teste laboratorial;

 

·       Quarentena para casos suspeitos: pode ser adotada pelo prazo de 40 dias ou o tempo necessário para minimizar a transmissão comunitária e garantir a manutenção dos serviços de saúde no território, mas depende de ato formal e devidamente justificado, emitido pelo Secretário de Saúde de cada Estado ou Município – o Distrito Federal e o Rio de Janeiro já publicaram normas sobre o assunto.

 

Mas como saber se o empregado é um caso suspeito ou uma pessoa contaminada? É o médico ocupacional da empresa que deverá examinar o empregado, garantindo o sigilo médico do paciente, e decidir pela submissão ou não aos exames médicos necessários, não cabendo ao empregado a recusa do exame por se tratar de uma hipótese em que o interesse público prevalece sobre o interesse individual, podendo a recusa, inclusive, gerar a aplicação de medidas disciplinares pela empresa.

 

Caso o empregado seja isolado ou entre em quarentena por conta do coronavírus, o afastamento do trabalho será considerado como falta justificada e, portanto, o trabalhador não terá o desconto dos dias e a empresa arcará com o salário do empregado durante todo o período de afastamento/quarentena, mesmo que ultrapasse 15 dias – que, em outros casos, seria de responsabilidade do INSS a partir do 16º dia de afastamento.

 

Adicionalmente, como a empresa é responsável pela saúde de seus empregados, é recomendado informar aos demais colaboradores sobre a existência de suspeita ou confirmação da doença entre seus colaboradores.

 

Dessa forma, para evitar prejuízos à empresa é recomendável a adoção do trabalho à distância (home office), já prevista pela Reforma Trabalhista. Caberá à empresa fornecer os meios de trabalho (computador, acesso à internet e telefone, por exemplo) e fiscalizar a jornada de trabalho, mas, por outro lado, poderá deixar de pagar o vale-transporte uma vez que o empregado não precisará de deslocar.

 

Ainda, diante do cenário de home office, é recomendável a adoção de medidas para evitar o vazamento de dados e documentos. A segurança de dados deve ser uma preocupação real, uma vez que mesmo sem a Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD ter entrado em vigência, já há casos de investigações, instauração de processos administrativos e, até mesmo, de aplicação de multas pela Secretaria Nacional do Consumidor – SENACON, tudo com base no Marco Civil da Internet e no Código de Defesa do Consumidor.

 

Aspectos Contratuais:

 

E as obrigações contratuais? Como a empresa deve proceder caso não consiga cumprir suas obrigações? 

 

Destaca-se a importância de as empresas avaliarem seus contratos vigentes, reestruturando seus cronogramas de obrigações e projeções de recebíveis e pagamentos, tendo em vista os efeitos já experimentados, e os possíveis desdobramentos futuros do vírus. 

 

Em tese, trata-se juridicamente de um problema de força maior, no qual a disseminação e efeitos do contágio do coronavírus decorrem de fatos independentes da vontade humana, e que impedem o cumprimento das obrigações pactuadas. 

 

No entanto devemos estar atentos para evitar abusos por parte das empresas em discussões que envolvam essa temática, para se esquivarem de seus prazos e obrigações, visando preservar o rompimento desenfreado de contratos e aplicações de multas que acarretariam uma maior instabilidade econômica. 

 

A melhor alternativa é a negociação de boa-fé entre contratante e contratado para mitigar riscos e danos, inclusive eventuais demandas judiciais – lembrando aquela velha máxima de que “mais vale um mau acordo que uma boa demanda”.

 

Aspectos Societários:

 

Do ponto de vista societário, é essencial lembrar que as deliberações sociais (assembleias gerais e reuniões de sócios) devem ser realizadas nos quatro primeiros meses seguintes ao término do exercício social – ou seja, até o final de abril para a maioria das empresas.

 

Dessa forma, para evitar riscos de contaminação, é importante analisar Contratos e Estatutos Sociais para verificar a possibilidade de realização das reuniões de sócios ou assembleias gerais à distância, como, por exemplo, por intermédio de videoconferência ou teleconferência. 

 

Compliance e LGPD:

 

Por fim, é importante ter em mente que as pandemias estão se tornando cada vez mais frequentes, de modo que as regras de compliance e o manual de boas práticas das empresas naturalmente passarão a dispor sobre os protocolos a serem adotados em tais casos – e.g., home office, exames obrigatórios, afastamento e quarentena –, além da observância às normas de privacidade e proteção de dados voltadas, especialmente, aos dados pessoais e aos dados pessoais sensíveis de seus colaboradores e de demais pessoas que possam a ser coletados, em meio físico ou digital.

 

Daniel Bijos Faidiga e Vinícius Laureano, LBZ Advocacia

 

Enviada por Cibele Martins - Saife Comunicação


A responsabilidade dos sócios no caso de dissolução irregular da sociedade

 

Burocracia, carga tributária complexa, leis esparsas e que mudam com frequência. Essas são algumas, das inúmeras dificuldades enfrentadas pelos empresários quando decidem iniciar uma empresa. 

Com a crise financeira e os altos impostos, honrar os compromissos se tornou um desafio. Em decorrência disso, não raro são iniciados processos administrativos devido a ocorrência de irregularidades de natureza tributária que culminam em execuções fiscais contra uma empresa que já nem existe mais. 

Diante desse quadro, a doutrina e a jurisprudência vem se debruçando sobre o tema da prescrição, para o redirecionamento da execução fiscal para os sócios em caso de dissolução irregular da sociedade, já que a falta de informação, os leva a promover a liquidação dos bens sem observar as preferências legais e/ou não promover a baixa do CNPJ na junta comercial. Obrigações legais que podem caracterizar ilícito passível de redirecionamento.

A execução fiscal está regulada pela lei 6.830/1980 e, subsidiariamente, pelas disposições do Código de Processo Civil é o que dispõe o art. 1º da Lei de Execuções Fiscais (LEF): “A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil”.

A criação de um rito próprio para a cobrança de um crédito fiscal foi pensada com o intuito de acelerar a satisfação coativa, em prol do interesse público que se reveste as receitas estatais.

Como se sabe, toda execução deve-se fundar em um título executivo que represente uma obrigação líquida, certa e exigível. Na execução fiscal, esse título executivo que a acompanha é a certidão de dívida ativa (CDA), cujo crédito pode ter natureza tributária ou não tributária, compreendendo, além do principal, atualização monetária, os juros, a multa de mora e os demais encargos previstos em lei.

Antes da constituição da certidão, a dívida ativa é inscrita por meio de um procedimento administrativo destinado a apurar a liquidez e certeza do crédito, por meio do qual o devedor será notificado a pagar o valor devido ou apresentar defesa. No caso de inércia ou se a defesa for rejeitada, sobrevirá a inscrição e, posteriormente a emissão da certidão.

A CDA é, portanto, um título formal sem o qual não é possível o ajuizamento da execução fiscal, devendo ter seus elementos bem caracterizados para assegurar a ampla defesa do executado. O inciso I do §5º do art. 2º traz os elementos obrigatórios que devem conter na Inscrição da dívida ativa o nome do devedor, dos corresponsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros.

Sobre a responsabilização pessoal dos sócios com poderes de gerência, a regra geral é que o sócio não responderá pelas dívidas das sociedades, podendo ser responsabilizado, no entanto, de forma excepcional, segundo artigo 790 do Código de Processo Civil.

Já o Código Tributário Nacional, o artigo 135, inciso III, estabeleceu a possibilidade de responsabilização dos administradores, determinando que eles são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.

 De acordo com Didier Jr et al (2017), a responsabilidade do administrador, diretor ou sócio-gerente é subjetiva, devendo ser comprovada a atitude dolosa, fraudulenta, ou pelo menos, uma conduta que denote culpa.

Desse modo, o mero inadimplemento não enseja redirecionamento para o corresponsável, eis o teor da Súmula 430 do STJ: “O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente”

Contudo, a certidão do oficial de Justiça que atesta o encerramento das atividades da empresa dá ensejo à presunção da dissolução irregular e, consequentemente, ao pedido de redirecionamento. Veja o teor da súmula 435 do STJ: “Presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixar de funcionar no seu domicílio fiscal, sem comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio –gerente”.

A dissolução irregular configura-se quando os sócios descumprindo o procedimento legal para extinção de uma pessoa jurídica, simplesmente “fecham as portas” do estabelecimento, sem o regular processo de levantamento patrimonial e pagamento dos credores de acordo com a ordem de preferência.

Percebe-se, portanto, que iniciada a execução fiscal contra a pessoa jurídica, cuja o encerramento das atividades não se deu nos moldes da lei, o redirecionamento para os sócios ocorre de forma automática, podendo atingir seus bens pessoais. Sobretudo, por que o nome dos corresponsáveis, como visto alhures, constará na Certidão de Dívida Ativa (CDA).

Esse presunção é juris tantum, isto é, admite prova em contrário. Ficando a cargo do corresponsável ilidir a presunção de fraude, demonstrando não ter agido com culpa, nem dolo e comprovando, ainda, que sua omissão não teve como resultado nenhum prejuízo a Fazenda Pública.

À respeito da prescrição do direito de redirecionar a execução fiscal contra o sócio pessoalmente responsável nos casos de ato ilícito. Inicialmente, cumpre destacar que o legislador não disciplinou especificamente o instituto da prescrição para o redirecionamento. 

O Código Tributário Nacional discorre genericamente a respeito da prescrição, no seu artigo 174 do CTN e, ainda assim, o faz em relação apenas ao devedor original da obrigação tributária. 

Diante da lacuna da lei, a jurisprudência do STJ há muito tempo consolidou que a execução fiscal não é imprescritível. A corte, definiu que: “constituindo a citação da pessoa jurídica o marco interruptivo da prescrição, extensível aos devedores solidários (art. 125, III, do CTN), o redirecionamento com fulcro no art. 135, III, do CTN deve ocorrer no prazo máximo de cinco anos, contado do aludido ato processual (citação da pessoa jurídica)”.

E portanto, na prática, indiferente era a dissolução irregular da sociedade ter ocorrido antes ou a após a citação da pessoa jurídica. O prazo prescricional era de 5 anos para a responsabilização dos corresponsáveis, contados da citação da pessoa jurídica.

Contudo, a jurisprudência do STJ buscando corrigir distorções, afastou essa exegese tradicional no RECURSO ESPECIAL Nº 1.201.993 - SP (2010/0127595-2) publicado no DJE em 12 de Dezembro de 2019. 

O distinguishing buscou justamente diferenciar situações jurídicas que, por possuírem características peculiares devem ter soluções distintas, de modo a preservar a integridade e a eficácia do ordenamento jurídico. 

Nesse sentido, analisou precisamente hipóteses em que a prática de ato de infração à lei, descrito no artigo 135, III, do CTN (como, por exemplo, a dissolução irregular), ocorreu após a citação da pessoa jurídica, modificando para momento futuro o termo inicial do redirecionamento.

 Assim, foram fixados dois marcos para o início da prescrição no caso de dissolução irregular, a depender de quando se deu o ato ilícito, antes da citação da empresa ou depois.

Antes da citação da empresa, o prazo de redirecionamento da Execução Fiscal, fixado em cinco anos, contado da diligência de citação da pessoa jurídica, é aplicável quando o referido ato ilícito, for precedente a esse ato processual.

Já, após a citação positiva da empresa, por si só, não provoca o início do prazo prescricional quando o ato de dissolução irregular for a ela subsequente.

O raciocínio é que, em tal circunstância, inexistirá, na data da citação, pretensão contra os sócios-gerentes (conforme decidido no REsp 1.101.728/SP, o mero inadimplemento da exação não configura ilícito atribuível aos sujeitos de direito descritos no art. 135 do CTN). 

Assim, o termo inicial do prazo prescricional para a cobrança do crédito dos sócios-gerentes infratores, nesse contexto, é a data da prática de ato inequívoco indicador, do intuito de inviabilizar a satisfação do crédito tributário já em curso de cobrança executiva promovida contra a empresa contribuinte, a ser demonstrado pelo Fisco.

Em qualquer hipótese, a decretação da prescrição para o redirecionamento impõe que seja demonstrada a inércia da Fazenda Pública, no lustro que se seguiu à citação da empresa originalmente devedora (REsp 1.222.444/RS) ou ao ato inequívoco mencionado anteriormente (dissolução irregular precedente ou superveniente à citação da empresa). 

Cabendo às instâncias ordinárias o exame dos fatos e provas atinentes à demonstração da prática de atos concretos na direção da cobrança do crédito tributário no decurso. E por conseguinte, decretada a prescrição, após a intimação da Fazenda Pública, o crédito será extinto.

Como visto, o tema é bastante controvertido e complexo, possuindo minúcias a ser evidenciado no caso concreto. Portanto, o encerramento da atividade empresarial deve seguir um trâmite legal e formal, que tem como um dos principais objetivos resguardar o interesse dos credores da pessoa jurídica. Dentre eles, a Fazenda Pública. 

Ademais, o fim da atividade sem a observância daquele pode acarretar a responsabilização dos corresponsáveis, através da presunção de fraude, sobretudo no caso de dissolução irregular.

Ficou, portanto, nítida a necessidade de uma governança tributária nas empresas, composta por especialistas tributários, já que o descumprimento das obrigações legais, tanto no funcionamento da empresa, quanto no seu encerramento, pode onerar demasiadamente não só os cofres da empresa, mas também os de seus sócios.

A prescrição para o redirecionamento dos sócios, por sua vez, trata-se de uma novidade na jurisprudência que muito precisa ser discutida, tendo em vista que o tema é bastante controverso entre os próprios ministros do STJ. Porém, é um importante instituto a ser defendido.

Bruna Ferreira de Andrade Pedrosa - Graduada pelo Instituto Camilo Filho e Pós-Graduanda em Direito Tributário e em MBA em Contabilidade, Gestão Tributária e Auditoria


Crimes de sonegação e o limite das multas confiscatórias

 

 

Por Raul Haidar

""“Justiça é dar a cada um o que é seu. A

justiça tributária é, portanto, reconhecer

o direito de cada contribuinte ,tratando-o

de forma respeitosa, cumprindo-se todas

as leis que garantem seus direitos”

(livro ‘Justiça Tributária’, pg.97)

Quem atua na área tributária encontra-se muitas vezes com situações de difícil explicação. Em décadas de trabalho deparamo-nos com variações curiosas de decisões judiciais, muitas delas para melhor.

Tal é o caso de sentença prolatada em execução fiscal de ICMS decorrente de rompimento de um parcelamento que pequeno contribuinte fizera, com o objetivo de livrar-se de condenação criminal face a adulteração de documentos fiscais.

Estava ele confiante de que conseguiria pagar o débito no prazo concedido, eis que sua pequena empresa tinha boa carteira de pedidos. Mas depois de quitar parte da dívida, não pôde cumprir o acordo, pois seus clientes suspenderam as encomendas, ante dificuldades econômicas.

Das ações propostas pelo contribuinte

1. – Quando ao débito – O contribuinte ingressou com ação contra a Fazenda do Estado para retificar o débito fiscal, pedindo redução de encargos face ao efeito confiscatório de multas. Através de perícia judicial constatou-se que os cálculos da multa estavam acima de 80% do imposto.

2 – Em relação ao crime – Na defesa prévia sustentou que sendo as multas confiscatórias e devem ser retificadas, pode ocorrer condenação, suspendendo-se o processo até que o Judiciário decida se os valores estavam conforme o sistema legal. Procedente a demanda pagaria o valor legalmente devido, com o que seria extinta a punibilidade.

3. – Sentença sobre o débito fiscal – A sentença reconheceu ser confiscatória a multa, reduzindo-a de 80 para 20% do valor do imposto e ordenando a compensação parcial com a parte já recolhida no parcelamento que tivesse ultrapassado esse limite

Em síntese, a juíza Fernanda Galizia Noriega decidiu;

Enfim, seja qual for o percentual da sanção, infrações continuarão a ser cometidas. Por isto, o critério a definir a multa confiscatória não pode ser a esperança (equivocada) de que infrações tributárias desapareçam.”

Já afirmamos, em outra coluna que multas confiscatórias, juros abusivos e exageradas ações contra os contribuintes assemelham-se a “pena de morte” sobre empreendedores que sustentam nossa economia. Os critérios do Fisco devem ser equilibrados, rigorosos, mas sem exageros. Disse ainda a ilustre magistrada:

O critério deve ser a identificação de um valor que considere a realidade sócio econômica do país de modo a não servir a multa para além da reprimenda à infração tributária, isto é, um valor que além da reprovação ainda implique inviabilizar ou significativamente abalar o patrimônio do contribuinte por sua relação em relação ao valor de sua atividade tributável.

À míngua de outros critérios no sistema jurídico, entendo ser o percentual de 20% um quinto do valor tributável! , o que não é pouco! quantia adequada a repreender pelo cometimento da infração. O que talvez seja preciso é uma fiscalização mais eficiente, apta a apurar em um percentual mais satisfatório as ocorrências de violações de conduta. Mas quanto à quanto à sanção em si, mais do que 20% não é adequado como efeito confiscatório. Portanto acima deste percentual viola-se o princípio da proporcionalidade.

Por consequência, as multas devem ser reduzidas ao percentual de 20% do valor do tributo que deveria ser recolhido. ... Portanto, na medida da adequação da multa imposta, deve haver a redução da dívida do contribuinte.

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido para determinar a redução das multas em 20% do valor do imposto compensando-se o que já foi pago no programa de parcelamento da dívida. Condeno a parte vencida a suportar as custas processuais e a verba honorária .no percentual mínimo da diferença entre o que foi pago e o que é devido, a ser apurada em execução...”

Recursos pendentes

Ambas as decisões encontram pendente de julgamento:

O recurso do contribuinte na área criminal está na pauta prevista para o próximo dia 26, tendo como relator o Dr. Laerte Marrone.

A ação anulatória foi julgada contra o contribuinte. Este ingressou com recursos aos tribunais superiores. Em 17/12/19 Dr. Evaristo dos Santos, desembargador presidente da Seção de Direito Público despachou:

Reconhecida a existência de repercussão geral da questão constitucional referente a Multa Qualificada - Razoabilidade-Confisco- Tema nº 863 do STF, delibero sobrestar o recurso extraordinário, nos termos do art. 1.035, § 5º, do Código de Processo Civil, com supedâneo no art. 1.030, inciso III do referido diploma processual, até pronunciamento final da Suprema Corte.”

Conclusão

O contribuinte e seu advogado acreditam na Justiça. Esperam também que, com os moderníssimos meios de processamento eletrônico de processos que o Judiciário vem adotando, possam ver tais assuntos resolvidos. Em resumo: confiam e esperam Justiça Tributária!


Bancos anunciam que vão prorrogar dívidas de clientes por 60 dias

A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) informou, nesta segunda-feira (16/3), que cinco de seus maiores bancos associados vão atender ao pedido de prorrogação do vencimento de dívidas. Pessoas físicas e empresas de pequeno porte que estejam em dia com os seus pagamentos terão o prazo de até 60 dias. Banco do Brasil, Bradesco, Caixa, Itaú Unibanco e Santander adotarão a medida.

A decisão ajudará empresas e famílias que têm boa capacidade financeira e mantêm operações de crédito regulares e adimplentes em curso, permitindo ajustes de seus fluxos de caixa e dispensa que os bancos aumentem o provisionamento no caso de repactuação de operações de crédito que sejam realizadas nos próximos seis meses.

Segundo a entidade, os bancos vêm discutindo propostas para amenizar os efeitos negativos da pandemia de coronavírus no emprego e na renda. "Entendem que se trata de um choque profundo, mas de natureza essencialmente transitória. Os bancos estão engajados em continuar colaborando com o país com medidas de estímulo à economia", diz o comunicado divulgado pela federação.

 

Fonte: Correio Braziliense

* Estagiária sob supervisão de Roberto Fonseca


“Juntar uma crise econômica com uma crise de saúde é inédito”, diz economista

"crise" 
Divulgação/Leo Aversa

Monica de Bolle é economista e pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics

 

O avanço da  pandemia  causada pelo  coronavírus  trouxe consigo uma  crise econômica  de escala global. As principais bolsas de valores do mundo acumulam quedas superiores a 20% desde o início do ano. Dados divulgados pela Conferência da  ONU  para o Comércio e Desenvolvimento (Unctad) apontam uma possível perda de US$ 2 trilhões para a economia global devido à paralisia econômica causada pelo vírus.

“Não temos precedentes para isso na história das crises recentes. Não temos como comparar isso que está acontecendo com o cenário, por exemplo, de 2008. São crises de natureza muito diferentes. Em 2008, foi uma crise de natureza financeira. Uma crise causada por uma epidemia, ou seja, quando você junta uma crise econômica com uma crise de saúde é algo inédito”, afirma a economista  Monica de Bolle , pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics (PIIE).

Diante deste cenário, ela defende a adoção de  estímulos econômicos de curto prazo , como investimentos públicos em infraestrutura por meio do  BNDES , para que o país possa suportar uma crise econômica que se avizinha. Em entrevista à Agência Pública, ela criticou a postura adotada pelo ministro da Economia,  Paulo Guedes , de somente defender as reformas como a solução para atravessar a crise e se disse à favor de uma revisão do teto de gastos aprovado no governo  Temer .

O cenário macroeconômico externo se agravou muito com o avanço do coronavírus e a queda acentuada nos preços do petróleo. Esse cenário veio de encontro a uma economia que ainda patina, que demonstrou um crescimento do PIB abaixo do previsto, o que indica uma recuperação lenta da atividade econômica. O governo vem adotando uma postura de simplesmente insistir na aprovação das reformas. Você tem se manifestado de maneira contrária a isso. Por que você considera essa estratégia pouco efetiva? Que estímulos de curto prazo seriam necessários?

Eu não sou contra as  reformas . Várias das que estão sendo colocadas na agenda são bastante importantes para o Brasil e merecem sair do papel. No início do ano, antes das primeiras notícias a respeito da epidemia  Covid-19 , o Brasil ainda estava passando por um momento de relativa normalidade em relação à economia mundial em que parecia que essa história de fazer reformas de médio e longo prazo era um curso a ser seguido.

Mas desde que a gente começou a ter as primeiras notícias da epidemia na China e depois, quando isso se agravou imensamente em fevereiro, o quadro mudou radicalmente. Embora a  Organização Mundial de Saúde (OMS) não tenha optado por chamar a doença causada por esse vírus de síndrome respiratória aguda, ela está em evolução e ainda não sabemos exatamente o grau de letalidade da doença, a comunidade científica tampouco sabe, mas ela é gravíssima porque é uma doença que ataca os pulmões. Não é só uma gripe. É uma síndrome respiratória: a progressão natural da doença é atacar os pulmões de maneira agressiva.

É verdade que os casos de morte têm sido em pessoas idosas e em pessoas em condições debilitadas de saúde. Os países têm capacidades de resposta muito variadas e a doença ainda não chegou com força nos países em desenvolvimento, ela está localizada nos países desenvolvidos e está causando muito estrago.

Nós temos um país fechado: a  Itália , algo sem precedentes. Há países decretando todo tipo de fechamento de tudo que se pode imaginar, de eventos esportivos a universidades, escolas, até cidades inteiras, a paralisação que isso já está causando e ainda vai causar é enorme, estamos apenas no início da pandemia.

Não temos precedentes para isso na história das crises recentes. Não temos como comparar isso que está acontecendo com o cenário, por exemplo, de 2008. São crises de natureza muito diferentes. Em 2008, foi uma crise de natureza financeira. Os  economistas  têm um certo entendimento a respeito das políticas a serem adotadas para conter a crise e para dar sustentação econômica num outro momento.

Uma crise causada por uma epidemia, ou seja, quando você junta uma crise econômica com uma crise de saúde é algo inédito. E pela maneira como a doença se manifesta e requer determinados tipos de paralisação, não há uma resposta plausível dos Bancos Centrais que possa destravar essa paralisia. Por exemplo, na crise de 2008, nós tivemos os Bancos Centrais agindo para dar liquidez aos mercados de crédito que estavam travados.

Agora, o máximo que os Bancos Centrais vão conseguir fazer é dar um alívio para empresas que estejam sofrendo ou asfixiadas por falta de fluxo de caixa.  Mas isso não destrava a economia . Portanto, o que sobra é a  política fiscal . Numa paralisação dessas, você tem paralisação de oferta e paralisação de demanda. A demanda, pelo menos no que diz respeito ao setor privado (consumidores, empresas, investidores, etc.) não vai ser destravada tão cedo, só quando a epidemia acabar, ou quando se achar uma vacina, quando se tiver alguma noção do cenário.

O único ente que temos para conter a insuficiência de demanda é o governo. Como? Por meio de  estímulos fiscais . Que estímulos fiscais? Varia de país para país. Em alguns países, pode ser que os governos decidam fazer estímulos concentrados nos setores mais afetados pela paralisia. Por exemplo, setor de entretenimento, turismo, serviços atrelados ao setor de turismo (restaurantes e etc.). Em outros mais, a resposta fiscal pode ser mais abrangente. O  Reino Unido  anunciou um pacote fiscal de 30 bilhões de libras. Aqui nos  Estados Unidos , já houve uma medida de estímulo fiscal feita pelo  Trump  de redução de impostos, acho que vai ser insuficiente e que, no fim das contas, o governo vai ter que fazer algum tipo de pacote de gastos.

E a situação brasileira?

O Brasil não é exceção. Aliás, o Brasil deveria estar muito mais preocupado que os outros países, sendo que o Brasil ainda tem tempo de se preparar para isso. O Brasil tem uma janela para reaver as prioridades de  política econômica  que, neste momento, têm que ser: deixar as reformas de médio prazo de lado por um tempo, não significa abandoná-las, mas elas deixaram de ser prioritárias.

Temos que parar pra pensar no que pode ser feito dentro das restrições que o país têm para evitar o pior cenário. O  Brasil  está entrando nessa crise vindo de uma  economia  com todas as fragilidades que você mencionou, um crescimento muito baixo, uma taxa de desemprego muito alta e não só isso: há um mercado de trabalho muito fragilizado.

Os poucos empregos que estão sendo criados não dão  segurança econômica  para as pessoas que estão sendo empregadas: ou são empregos informais ou com poucos benefícios, com pouca rede de sustentação econômica. Para além disso, temos uma população vulnerável enorme. Temos um grau de desigualdade fenomenal.

Centenas de milhões de pessoas vão depender do  SUS , que é um bom sistema de saúde, mas não tem capacidade de absorver o tipo de dano que essa doença pode causar, haja visto o colo no norte da  Itália , uma região desenvolvida, onde há bons hospitais e o sistema de saúde é público. O  Brasil  tem uma vulnerabilidade da população extrema comparado a outros países, um percentual considerável de idosos, muitos dos quais sem amparo nas redes de proteção social.

É uma situação de quase tempestade perfeita para que uma doença como essa, sem a devida resposta das autoridades brasileiras, gere uma destruição imensa de vidas, de sistema de saúde e da  economia . Não dá para exagerar isso. Eu fico espantada com como as pessoas no Brasil estão cegas para o que está se passando e para o que pode vir pela frente.

Nesse contexto, um governo responsável deveria estar pensando em, dadas as restrições fiscais que o país têm e nós temos, não podemos simplesmente sair gastando, é pensar no que o país pode fazer para dar alguma sustentação na economia e impedir um colo completo. Esse tem que ser o debate do momento.

O debate não pode mais ser  reforma  de médio prazo, mas o que a gente vai fazer para enfrentar uma situação absolutamente inédita, que outros países avançados estão tendo dificuldades em enfrentar. Minha proposta é que o país aja na área de  investimento público , sobretudo em infraestrutura. O investimento público no Brasil desabou e é uma área fundamental para movimentar a economia.

Na área de infraestrutura em particular, os efeitos multiplicadores são grandes: você movimenta muitos setores como, por exemplo, o da  construção civil , que emprega muita gente e gera sustentação no mercado de trabalho, mesmo que temporariamente. Melhor ainda se, na  infraestrutura , conseguíssemos discutir uma agenda verde. Esse é o momento de pensar em projetos específicos.

Qual o projeto que podemos desengavetar hoje e tocar? É algum projeto na área de logística? É saneamento básico? O governo teria que sentar e delinear essa estratégia para começar hoje um programa de  investimentos públicos  para tentar conter a situação que vem por aí. Isso pode exigir que o teto de gastos seja modificado ou até deixado de lado por um tempo dentro do possível? Sim. Sei que não cumprir o teto é  crime de responsabilidade , mas estamos falando de uma situação excepcional, o que a maior parte dos economistas do Brasil não conseguem entender.

Assim como em 2008, o  Fed  [Federal Reserve, o sistema de bancos centrais dos Estados Unidos] americano fez uma porção de coisas que não poderia em tese fazer e só foi procurar aprovação no Congresso depois de feitas, por estar tentando evitar que a  crise  se alastrasse e virasse algo mais destruidor, o mesmo vale para hoje. O que nós podemos fazer com o  teto de gastos  hoje que nos permita colocar em prática essas medidas para sustentar a economia? Essa é a questão fundamental pela qual deveria estar passando o debate econômico no Brasil e onde deveria estar a cabeça das autoridades. Infelizmente, não é o que estamos vendo.

Qual pode ser o cenário caso as medidas de curto prazo não sejam adotadas e o governo mantenha esse discurso de esperar pelas reformas? Pode ser que venha uma crise em que não haja possibilidade de reação, o cenário é possível?

Esse cenário é possível. Mais do que possível, é provável. Por isso que eu digo, o  Brasil  está numa janela de oportunidade para ter esse debate e está desperdiçando. Na hora que essa janela se fechar, chega essa  crise  no Brasil de uma forma muito abrupta. E aí os cenários vão mudar radicalmente a ponto de aparecer no horizonte a possibilidade de o Brasil ter uma recessão e não só não descarto isso, como isso já está virando um cenário de referência.

Economistas dos EUA, como o ex-secretário do Tesouro Americano, Larry Summers, disse que é muito provável uma recessão nos Estados Unidos…

Aqui o cenário mudou muito rapidamente. Há dois meses eu e os economistas que são meus interlocutores daqui tínhamos como cenário crescimento da  economia americana  em 2020 embora em ritmo menor, em torno de 2%, um pouco menos do que o ano passado e do que o anterior. Ainda era um cenário de crescimento, de melhora no mercado de trabalho. Esse quadro mudou radicalmente em pouquíssimo tempo.

Há duas semanas tinha gente pensando que a  economia  ainda ia conseguir se segurar mesmo com a crise. Hoje, a maior parte dos economistas já trabalha com cenário de  recessão  sem ainda saber o quão forte ela pode ser porque a imprevisibilidade e o ineditismo da situação são muito grandes. Os cenários recessivos estão aí e a mesma coisa vale para os países europeus.

Não se sabe ainda o quanto o crescimento chinês vai cair, mas uma  China  que para de crescer os seis e pouco porcento que estava caindo e passa a crescer algo entre 3,5 e 4%, o que eu ainda considero um cenário um pouco otimista — haja visto que a China depende do resto do mundo e o resto do mundo vai estar parado.

Imagine um cenário em que a China cresce pouco, os  Estados Unidos  em recessão, o resto do mundo em recessão, os preços das  commodities  desabando, os preços do  petróleo  desabando com ou sem briga entre a  Arábia Saudita  e a  Rússia  porque não tem demanda, a extrema aversão ao risco sem nenhum investidor querendo colocar dinheiro em lugar nenhum que não seja os Estados Unidos. Isso não vai afetar o Brasil? Como? Vira um cenário super recessivo para o Brasil . É a preocupação do momento. O mundo está a algumas semanas à frente do Brasil e o Brasil não pode se dar ao luxo de estar atrasado como está.

Por outro lado, nós temos a questão das contas públicas do Brasil. O último dado que encontrei da dívida do Brasil foi de uma relação dívida/PIB de cerca de 75%. Alguns economistas defendem a possibilidade do BNDES poder atuar nessa situação, dizem haver recursos no banco para isso, apesar da resistência ideológica do governo Bolsonaro. Na sua opinião, esse estímulo fiscal poderia vir pelo BNDES? Por onde viria esse choque do governo?

Vem pelo  BNDES . A ideologização do BNDES é um dos maiores malefícios que esse governo pode fazer. Ele pode ter sido mal utilizado, e foi, nos governos petistas. Não há dúvidas. Eu escrevi milhões de artigos sobre isso. É o governo que determina o que o BNDES vai fazer. Há diversas maneiras de você utilizar o BNDES de maneira mais eficiente do que o que se observou nos governos petistas. Mas deixar o BNDES de lado numa situação como essa é de uma  burrice extraordinária .

A resistência a utilizar o BNDES como forma de estimular a demanda parece mais pautada em questões ideológicas do que em argumentos econômicos…

Sem dúvida. Não tem nenhum  embasamento econômico  em nada do que se diz. Quem diz que não pode mexer no  teto de gastos  fala isso sem embasamento econômico algum, mas essencialmente, com embasamento ideológico. Quem diz que o governo não pode gastar, fala isso puramente com o embasamento ideológico.

De novo, não estou falando de gastar loucamente. Vamos olhar nossas restrições e ver o que podemos fazer. Nossa  relação dívida/PIB  está estável. Ela até pode cair um pouco porque a gente fez a  Reforma da Previdência  e as taxas de juros estão historicamente baixas e não há pressão inflacionária mesmo com o câmbio disparando. Porque não tem demanda. Vai ter um pouco mais de espaço para queda de  juros , o que abre um pouco mais de espaço fiscal principalmente na trajetória da dívida pública.

Esse é o embasamento econômico. Mas as pessoas estão presas num passado, presas em 2016. Não tem aumento de gastos hoje que vai fazer investidor estrangeiro fugir, mas vamos combinar e olhar para a realidade: nenhum  investidor estrangeiro  vai entrar no  Brasil  com uma pandemia e as consequências dela assustando todo mundo. O Brasil não é nada perto disso. Se o Brasil resolver gastar um pouco mais, ninguém vai estar nem aí para o que o Brasil está fazendo. É uma questão de proteção para o país. Quem acha ou argumenta que isso levaria a uma  crise fiscal  ou saída de investidores, das duas uma: ou não está entendendo o cenário ou está sendo intelectualmente desonesto.

Você já vinha tecendo críticas ao teto de gastos há pelo menos quatro anos. Essa situação de agora evidencia o tanto que o teto de gastos se tornou rígido e inviabiliza a reação do governo em situações de crise como agora? 

Na minha entrevista para o Roda Viva em outubro de 2016 e em artigos que escrevi, eu disse que o problema do  teto de gastos  não era a ideia em si, que era até boa. Vários países fizeram isso no passado, há boas experiências sobre isso, era uma maneira eficaz para limitar o crescimento dos gastos no  Brasil . O problema nunca foi a ideia, mas o desenho.

A forma como o teto de gastos estava sendo desenhada à época, era um teto de gastos  excessivamente rígido , com nenhum espaço ou com espaço mínimo para se adotar uma medida anticíclica caso fosse necessário na eventualidade, por exemplo, de uma crise. E eu falava em 2016 o seguinte: em algum momento isso vai acontecer, pode ser em 2019 ou 2020. Porque o teto começava a ficar restritivo a partir de 2019.

A minha avaliação era a seguinte: quando ele começar a ficar bem restritivo, se o país precisar de medidas anticíclicas, não vai ter como fazer. Eu dizia que era melhor redesenhá-lo para que ele tivesse a  capacidade de absorver choques . Fui super criticada na época, inclusive pelos próprios formuladores do teto. O resultado de tudo isso está aí. A gente tem muito espaço de  política monetária , mas agora nem  política fiscal  a gente tem. A gente amarrou a mão atrás das costas e se colocou numa camisa de forças numa situação de inédita  crise global . É de uma estupidez sem precedentes. Igual à crise.

A PEC Emergencial não seria um caminho?

Acho que não porque ela contém uma série de medidas de  austeridade fiscal  e nesse momento tudo que você não tem que fazer é austeridade.

Qual você acha que é a lógica econômica que explica a postura do governo e do ministro Paulo Guedes em recusar os estímulos de curto prazo e apenas esperar pela reforma?

É a ideia equivocada da  austeridade expansionista . A ideia de que se você fizer austeridade vem confiança, com confiança vem investimento e aí você tem a expansão econômica. Só que a ideia da austeridade expansionista, o auge dessa ideia no debate econômico foi nos anos 1990. E todo mundo que tentou fazer austeridade expansionista nos anos 1990 se deu mal. Austeridade é austeridade: gera  contração econômica .

Depois, se o país está muito desarranjado, é claro que aquilo vai gerar condições para o  crescimento , mas, em princípio, a austeridade é sempre contracionista. A tese da austeridade expansionista nunca foi comprovada. Empiricamente, ela não é verificável, embora seja difícil de verificar porque a questão de causalidade é complicada. Então,  o governo está indo numa linha totalmente equivocada . Fazer reformas porque o Brasil precisa de reformas, esse argumento eu aceito. Fazer reformas pela austeridade expansionista, esse argumento eu não aceito. Ele não tem solidez econômica.


Sob pressão, governo se mexe para evitar quebradeira de empresas

 

 

BRASÍLIA - Sob pressão diante do avanço da pandemia do novo coronavírus no Brasil, o governo começou a organizar uma reação para evitar quebradeira das empresas por conta da crise e anunciou na quinta, 12, a liberação de R$ 28 bilhões para dar fôlego à economia.

O Ministério da Economia anunciou a antecipação da primeira parcela do 13.º aos segurados do INSS em abril, o equivalente a R$ 23 bilhões. O ministério também vai propor na semana que vem ao Conselho Nacional de Previdência Social a redução do limite de taxa de juros para empréstimos consignados em folha de pagamento dos beneficiários do INSS. Em outra frente, uma proposta será enviada ao Congresso para ampliar a margem do salário que pode ser comprometida com a parcela do financiamento. Hoje essa margem é de 30% em caso de empréstimo e 5% para cartão de crédito. O prazo de pagamento também deve aumentar, mas o secretário não detalhou os novos parâmetros.

O secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, admitiu que estuda uma nova liberação imediata de parte do FGTS para os trabalhadores. No ano passado, os cotistas puderam retirar R$ 500 de cada uma de suas contas – ou até um salário mínimo caso o saldo estivesse dentro desse valor. Rodrigues não disse qual valor poderá ser liberado, mas garantiu que a diretriz é preservar a sustentabilidade do FGTS, que serve de fonte de financiamento para crédito no setor imobiliário.

Se nas primeiras semanas do avanço da doença, a ação do governo à turbulência do mercado esteve concentrada na mão do Banco Central, a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, começou a acionar medidas mais pontuais também nas frentes fiscal e de crédito. Um comitê de monitoramento será formado pelo presidente Jair Bolsonaro para analisar as medidas a serem adotadas, a pedido de Guedes. O grupo trabalhará em diferentes dimensões e terá atualizações periódicas, a cada 48 horas.

Além dos R$ 23 bilhões do 13.º do INSS, houve acordo para a liberação de R$ 5 bilhões para ações na área de saúde. Uma reunião para discutir a ajuda aos Estados e municípios também nessa área será feita hoje.

Do lado do crédito, os bancos públicos acenaram com linha para capital de giro e também compra de carteiras de bancos pequenos e médios – que costumam ser mais afetados nas crises. O governo estuda ainda medidas para evitar uma espiral negativa, sobretudo, nas pequenas e médias empresas, segmento que garante grande contratação de trabalhadores.

Garantir o capital de giro é considerado ponto nevrálgico, principalmente, para as empresas que dependem de insumos importados para a produção, e também aquelas mais afetadas pela queda do consumo diante do maior isolamento das pessoas. Por isso, o setor de serviços é o mais monitorado pela equipe econômica, como avisou Guedes.

“Capital de giro é uma preocupação por conta da interrupção da produção da China por dois meses. Pode ter um problema numa cadeia da indústria porque não recebeu o material e aí tem uma espiral. É uma questão importante que eu sei que está acontecendo”, disse ao Estado o presidente da Caixa, Pedro Guimarães. Ele disse que o banco tem condições de oferecer R$ 70 bilhões de crédito: R$ 40 bilhões para capital de giro e R$ 30 bilhões para a compra de carteiras dos bancos pequenos.

O presidente do Banco do Brasil, Rubem Novaes, disse ao Estado que a instituição já analisou os setores com mais dificuldades e está ofertando crédito às empresas. A ideia é reforçar principalmente a linha de capital de giro. O BB também dará suporte para que empresas consigam quitar empréstimos externos, diante da escalada do dólar, que chegou a ultrapassar a barreira de R$ 5 ontem – a moeda fechou em R$ 4,79. “A ideia é que o banco atue como ponte entre o presente de dificuldade e o futuro de normalidade. Para nós, a economia voltará ao normal no segundo semestre.”

O ministro de Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, propôs a desoneração da folha de pagamento das empresas aéreas, cujas ações desabaram ontem na B3, a Bolsa de São Paulo. Também quer zerar o PIS/Cofins do querosene de aviação e o fim do adicional na tarifa de embarque de voos estrangeiros.

Mas as medidas de redução de tributos são vistas com resistência por Guedes e sua equipe. O secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, que se reuniu com o presidente do BC, Roberto Campos Neto, para discutir medidas de ação, correu para avisar que não há espaço no Orçamento para reduzir a carga tributária de empresas como resposta à crise.

Com pressão para ajudas setoriais, Guedes tem insistido nos bastidores que a resposta à crise deve partir também de soluções a serem buscadas pelos próprios empresários. O ministro admitiu a possibilidade, em caso de agravamento dos impactos econômicos, de “soltar recursos especiais”, sem dar detalhes. “As áreas vão quebrar”, disse o líder do MDB, senador Eduardo Braga (AM). Ele cobra do governo a divulgação de um plano emergencial de curto prazo.

O BC deve promover um nova rodada de redução dos depósitos compulsórios, recursos que os bancos são obrigados a deixar na instituição. Hoje, há um volume de R$ 380 bilhões em compulsórios. O sócio da BlueLine, Fabio Akira, considera que ainda há espaço para mais quedas na taxa básica de juros, a Selic, antes da liberação desses recursos. “A crise vai travar economia e tem folga na meta de inflação. A queda do petróleo ajuda. A queda do juro tem ser agora e compulsório mais à frente”, afirmou.

  1. Antecipação da primeira parcela do 13º dos segurados do INSS para abril.
  2. A pedido do Ministério da Infraestrutura, governo quer zerar o PIS/Cofins do querosene de aviação e o fim do adicional na tarifa de embarque de voos estrangeiros. Está em estudo a desoneração da folha temporária para as empresas do setor.
  3. Auxílio para a área da educação também está sendo estudado para evitar alastramento da pandemia nas escolas públicas.
  4. Medidas voltadas para micro, pequenas e médias empresas.
  5. Liberação de R$ 5 bilhões para o combate do coronavírus para o SUS atender ao aumento da demanda dos novos casos de contaminação. Uma MP será editada com crédito extraordinário.
  6. Acionamento de “arma secreta” do ministro Guedes para ajuda a população mais pobre a ser acionada assim que avançar os projetos mais importantes.
  1. Garantir oferta de crédito pelos bancos públicos. Os três principais bancos – Caixa, BB e BNDES – tem um arsenal de no mínimo R$ 208 bilhões.
  2. Caixa vai garantir capital de giro (R$ 40 bilhões) para empresas e compra de carteira de consignado e de automóveis (R$ 30 bilhões).
  3. Regulamentação do consignado com garantia do FGTS.
  1. Leilões de swap cambial e venda de dólares com dinheiro das reservas internacionais.
  2. Nova rodada de liberação de depósitos compulsórios.
  3. Redução dos juros básicos da economia.
  4. O Tesouro fará uma série de leilões extraordinários de recompra de títulos públicos.

Fonte: Estadão / COLABOROU EDUARDO RODRIGUES