Economistas afinados com uma agenda de reformas que melhorem a qualidade do gasto público avaliam que é melhor não votar nada no Congresso até final do governo Jair Bolsonaro (sem partido). Caso contrário, corre-se o risco de aumentar a captura do Orçamento por grupos privilegiados e de colocar obstáculos a mudanças que poderão ser feitas por um futuro presidente da República que tenha projetos melhores e uma base parlamentar que não distorça essas propostas.
A avaliação foi feita durante o webinar “As emendas parlamentares e a captura do Orçamento”, promovido pelo jornal Folha de S.Paulo e pelo FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas) nesta terça (28).
O pesquisador associado do FGV Ibre Fabio Giambiagi disse que tentar arrumar os problemas do Orçamento, em especial da questão das emendas parlamentares –algumas delas pagas sem transparência por meio de uma espécie de orçamento secreto– pode resultar na aprovação de algo pior pelo Congresso.
“Emergencialmente, eu gostaria que nada fosse feito, porque o risco de sair uma monstruosidade é enorme, vide privatização da Eletrobras, essa reforma administrativa meio maluca etc.”, afirmou.
“O que o país tem de fazer é aprovar o Orçamento e deixar essas questões para serem resolvidas pelo próximo governo, na medida em que o governo [atual] se revela fraco e sem condições de passar uma agenda de reformas adequadas, que tramitem e cheguem ao final com uma cara parecida com a inicial”,
disse Giambiagi.
Giambiagi é autor de artigo sobre a questão das emendas parlamentares publicado na revista Conjuntura Econômica do FGV Ibre, em conjunto com o pesquisador associado do Insper e colunista da Folha Marcos Mendes e o economista e ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung. Os dois também participaram do seminário desta terça.
Segundo os participantes, as emendas parlamentares previstas no Orçamento de 2021 (R$ 34 bilhões) representam 51% da previsão de investimentos federais no ano, mas são um recurso com aplicação pulverizada e em projetos que são representam as prioridades para o país.
Hartung também pediu a paralisação da votação das propostas da área econômica no Congresso. Ele citou como exemplo os resultados negativos com a PEC Emergencial e a privatização da Eletrobras, duas propostas já aprovadas após muitas alterações, e também das reformas administrativa e do Imposto de
Renda, que para ele eram ruins e foram pioradas pelos parlamentares.
Para o ex-governador, a maior contribuição para a questão do Orçamento neste momento pode vir da ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal), que analisa uma ação sobre as chamadas emendas de relator que deram origem ao “orçamento secreto”.
“Torço para que o Supremo fale sobre emendas de relator. Não é possível alocação secreta de recursos. E torço para que as lideranças parlamentares, Câmara e Senado, desacelerem o processo decisório. Porque, em um quadro como esse, vou dar como exemplo a reforma administrativa, a gente pode dificultar o próximo governo na concepção de uma reforma verdadeira”, afirmou.
Para ele, também é necessário um Congresso em que a ação dos líderes políticos não tenha como objetivo apenas as próximas eleições, mas melhorar o futuro do país.
“O Brasil é um país de perder tempo. Vamos perder mais um tempinho, porque senão, nessa história de a gente de não querer perder tempo, podemos obstacular mudanças que precisam ser feitas.”
Marcos Mendes afirmou que é importante ter uma agenda de reformas e também de prevenção de contrareformas. “E isso passa por formar uma coalizão de governo com quem tenha legitimidade eleitoral. O problema dos governo Dilma Rousseff e Jair Bolsonaro foi se recusar a formar essa coalizão às claras, o que acabou resultando em uma reação do Parlamento, entre outras coisas, com essa questão das emendas e aumento de poder do Congresso sobre o Orçamento.”
Os economistas afirmaram que o mecanismo de emendas parlamentares é legítimo, mas que o valor desse gasto não pode ultrapassar os limites da razoabilidade e o pagamento das despesas deve ser feito de forma transparente.
“Hoje temos R$ 34 bilhões de emendas para R$ 100 bilhões de gastos livres do governo”, afirmou Mendes.
Para Giambiagi, essa sistemática contribui para aumentar a percepção de que os políticos estão governando para si mesmos, com reflexos sobre a confiança do cidadão no regime democrático.
Hartung lembrou que o mecanismo de emendas de relator foi extinto pelo Congresso após o caso dos Anões do Orçamento, há quase 20 anos, e que o seu resgate pelo Parlamento, junto com a questão do pagamento impositivo acabará produzindo um novo escândalo orçamentário no país.