O governo vai fazer um empréstimo de R$ 15,6 bilhões para socorrer o setor elétrico durante a crise provocada pela pandemia do novo coronavírus, informou nesta segunda-feira (25) ao G1 o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), André Pepitone.
Na semana passada o governo publicou um decreto com as regras para o empréstimo. Faltava, entretanto, definir o valor. De acordo com o decreto, cabe à Aneel estabelecer o valor do empréstimo “com base nas necessidades decorrentes do estado de calamidade pública” provocado pela pandemia.
Os R$ 15,6 bilhões serão emprestados por um conjunto de bancos, públicos e privados, numa operação coordenada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Os juros ainda não foram fixados, mas, de acordo com Pepitone, serão compostos pela soma da taxa do CDI (hoje em 3% ao ano) mais um adicional.
A operação vai permitir duas ações ao mesmo tempo:
- adiar o pagamento, pelos consumidores, de custos extras que encareceriam as contas de luz em 2020;
- antecipar essas receitas às distribuidoras, o que garante a injeção de recursos no setor elétrico num momento em que se registra queda no fluxo de dinheiro devido à redução no consumo de energia e ao aumento da inadimplência, reflexos da crise econômica causada pela pandemia (leia mais abaixo).
Governo federal vai ajudar distribuidoras de energia elétrica por causa da crise da Covid
De acordo com Pepitone, sem o empréstimo, as contas de luz teriam aumento médio de 11,5% neste ano. Os reajustes vão continuar ocorrendo nos próximos meses, e as tarifas devem registrar aumento, mas será menor, informou o diretor-geral da Aneel.
O pagamento do empréstimo será parcelado em 60 meses e começa a ser feito em 2021. Isso significa que deve ser quitado em 2025.
Os recursos para pagamento do empréstimo virão de uma cobrança extra nas contas de luz também a partir do ano que vem. Como algumas distribuidoras ficarão com uma fatia maior do empréstimo e, outras, com uma cota menor, a parcela a ser paga por consumidor também vai variar.
“Os processos tarifários vão ser amortecidos pelo empréstimo, ou seja, o empréstimo beneficia o consumidor num momento desafiador, de queda da renda”, disse Pepitone.
“Além disso, se não tivesse o socorro, as distribuidoras teriam dificuldade com fluxo de caixa, o que traria dificuldades também para que diversos contratos no setor elétrico fossem honrados”, afirmou.
De acordo com a Aneel, o consumo de energia caiu 14%, e a inadimplência no setor passou de 3% para 13% devido à pandemia. Com a pandemia, o consumo de energia em abril foi o menor para o mês desde 2012, segundo o Operador Nacional do Sistema (ONS).
Segunda vez
Esta é a segunda vez, em menos de dez anos, que o governo precisa arquitetar uma operação financeira para socorrer o setor elétrico.
A primeira foi em 2014, quando a estiagem reduziu drasticamente o volume de água nos reservatórios das hidrelétricas e fez disparar o custo de produção de energia no país, devido ao uso maior das termelétricas (usinas que geram energia por meio da queima de combustíveis).
Pela regra, em um primeiro momento, as distribuidoras deveriam bancar a conta extra com o aumento do preço da energia. Depois, essa conta seria repassada aos consumidores.
Entretanto, como o aumento foi muito forte e as distribuidoras não dispunham de caixa suficiente para bancar a conta, o governo optou pelo empréstimo.
No total, a operação resultou em uma dívida repassada aos consumidores de R$ 34 bilhões, dos quais R$ 12,8 bilhões em juros. O pagamento estava previsto para ocorrer em cinco anos, mas acabou antecipado em alguns meses pela Aneel no ano passado.
Custos extras
Para os consumidores, o empréstimo vai permitir que sejam adiados e parcelados em 60 meses custos extras que encareceriam as contas de luz em 2020 e seriam pagos em 12 meses.
Geram esses custos extras em 2020:
- a alta da tarifa que é paga pelo serviço de transmissão de energia, devido à entrada em operação de novas linhas;
- o aumento do valor da energia gerada pela hidrelétrica de Itaipu devido à disparada do dólar;
- a necessidade de aumento da contribuição dos consumidores para a CDE, fundo do governo que financia ações e políticas públicas no setor elétrico.
Teto e ressarcimento
Segundo o diretor-geral da Aneel, desta vez haverá um teto para o empréstimo, que são justamente os R$ 15,6 bilhões definidos pela Aneel.
Isso significa que, ao contrário do que ocorreu em 2014, não será possível, depois, ampliar o valor dessa operação, com novas tomadas de recursos junto aos bancos.
Os R$ 15,6 bilhões, pelas contas da agência, serão suficientes para cobrir o buraco financeiro no setor provocado pelo aumento da inadimplência e pela queda no consumo de energia até dezembro deste ano.
Outra diferença é que, desta vez, os acionistas das distribuidoras deverão ter que pagar uma parte do custo do empréstimo. Nos futuros reajustes tarifários, a Aneel vai incluir na conta o benefício financeiro do empréstimo para as concessionárias, que deverão ressarcir os consumidores.
“Queremos evitar a contratação de empréstimo além do necessário para cobrir a diferença entre os custos do setor elétrico e o que está sendo arrecadado atualmente via tarifa. Além disso, as regras deixam claro que não vamos transferir ônus para quem não se beneficia [do empréstimo]”, afirmou Pepitone.
As medidas de isolamento adotadas para conter a pandemia provocaram o fechamento de lojas e fábricas, além de demissão de trabalhadores e queda na renda das famílias. Essa situação levou à redução no consumo de energia e aumento da inadimplência das contas de luz.