Quem está otimista com a aprovação da reforma tributária deve prestar atenção no que disseram cinco governadores. Ronaldo Caiado, de Goiás, alerta que o relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro será “o Judas a ser malhado” e que os impasses começarão assim que o texto for apresentado. Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, diz que o governo federal dificulta a tramitação do projeto, pela sua postura de confronto e má comunicação. Renato Casagrande, do Espírito Santo, acha a proposta da equipe econômica tímida. Helder Barbalho e Rui Costa temem que os estados percam autonomia sobre as suas receitas, com a criação de um fundo único de repasse dos recursos.

São muitos os nós da reforma tributária, e a visão dos governadores, que participaram de um evento promovido pela Febraban semana passada, mostra que o tema continua longe de consenso para votação. Além das dificuldades usuais de se passar uma PEC dessa natureza, há outros agravantes: o texto terá que ser votado em momento de crise, quando todos os entes da federação estão com perda de receitas, o governo federal não enviou sua proposta na íntegra, e uma coleção de projetos de emendas à constituição foi enviada ao mesmo tempo ao Congresso.

— Estamos todos de acordo com a necessidade da reforma tributária. Mas na hora que se redigir a primeira lauda será cada um para um lado. Já não concordo aqui, já não concordo acolá. A disputa começa mesmo quando se coloca no papel — alertou Ronaldo Caiado.

Os governadores se dizem traumatizados com as perdas que sempre alegaram ter tido com a lei Kandir, de 1996. A exportação foi desonerada, mas a União se comprometeu a compensar os estados pelas perdas com ICMS. Os estados foram ao STF por entender que a União pagou menos do que deveria, em uma disputa bilionária ainda em aberto. Por isso, veem com desconfiança a criação de um fundo para recolher o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que seria repassado aos estados, simplificando impostos e acabando com a guerra fiscal.

— É preciso discutir a autonomia dos estados no comitê de gestão desse fundo. A proposta dá peso exagerado à União. Já que a maioria dos recursos é de ICMS, não é possível que os estados fiquem ainda mais reféns de um posicionamento da União — disse Rui Costa, governador da Bahia.

Helder Barbalho, governador do Pará, defende que a emenda 192, apresentada pelos secretários de fazenda estaduais, seja incorporada à PEC 45, ampliando a participação dos estados no fundo. Ele teme que o conselho sofra interferência política e lembra perdas que teriam tido com a lei Kandir:

— A compensação da lei Kandir chegou ao STF. O governo federal chegou a dizer que não devia nada, e os estados chegavam na conta de R$ 40 bilhões desde 1996. Se continuar no modelo de conta única, com repasse aos estados, isso pode se transformar em imbróglio institucional, podendo regredir o projeto e não avançar.

O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, diz que o estado perderá R$ 1 bilhão por ano se a cobrança do IBS passar ao local de consumo. Lembra que seu estado começou a fazer o ajuste fiscal antes dos outros e que por isso é o único com classificação máxima no ranking fiscal do Tesouro. Não poderia se desestruturar financeiramente com a reforma.

— Tem que ter um fundo para apoiar as regiões, porque nem todos os estados têm a mesma capacidade de atrair empreendimentos. O incentivo fiscal hoje é muito criticado, mas é um instrumento para que possam atrair atividade econômica para os seus estados — justificou.

Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, cobra liderança do governo federal na condução de uma proposta que mexe com interesses tão conflitantes.

— Nossos secretários de fazenda se mostraram favorável às PECs do Congresso, a disposição conjunta de governadores existe. Mas quem deve liderar é o governo federal. A postura belicosa do governo acaba sendo uma dificuldade adicional para uma reforma que já é difícil.

Tudo isso é sobre as propostas articuladas no Congresso — uma na Câmara, uma no Senado — sem a presença do governo federal, que discorda desse fundo. Até agora, o governo enviou apenas a fusão do PIS com a Cofins. E disse que outras mudanças virão em fatias. Com a desconfiança geral, e o governo federal arredio, é difícil acreditar que a reforma será aprovada.

Com Alvaro Gribel (de São Paulo)