O parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional foi introduzido pela Lei Complementar n° 104/2001 e foi editado com o objetivo de limitar a liberdade do contribuinte na busca pela menor carga tributária.
A autorização contida nessa regra determina que a administração tributária pode desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária.
A inclusão do parágrafo único no referido artigo se deu pela necessidade de equalizar o sistema tributário como um todo, a fim de evitar grandes perdas de receitas ao Estado e evitar que aqueles contribuintes que conseguem escapar da tributação sobrecarreguem aqueles que são impossibilitados de realizar a mesma “fuga”, e acabam suportando o ônus de tributos que são de responsabilidade alheia, além de obstar que as finalidades sociais do recolhimento tributário sejam de fato alcançadas.
O Congresso Nacional brasileiro obstou as tentativas de ampliação dos poderes da administração tributária para a desqualificação de negócios jurídicos praticados pelos contribuintes, diante de pelo menos quatro propostas de regulamentação da matéria, o que pareceu ser em razão da impossibilidade de se levar a efeito normas capazes de gerar violações a princípios constitucionais como a segurança jurídica e da legalidade, vez que houve a tentativa, pelo Poder Executivo, de alargar os limites colocados na Lei Complementar nº 104/2001 com conceitos inexistentes em matéria tributária, como propósito negocial e abuso de forma jurídica.
Assim, mesmo sem existir uma regulamentação, por lei ordinária, do parágrafo único do artigo 116 do CTN, a citada norma passou a vigorar no ordenamento jurídico, trazendo a possibilidade de a autoridade administrativa “desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária”.
Essa possibilidade criou, segundo doutrinadores como Heleno Torres, a figura da elusão fiscal, que quebrou a lógica dicotômica entre o que é lícito e ilícito, introduzindo a figura do planejamento tributário abusivo, que é aquele que, a priori, está dentro de um aspecto de licitude e é realizado dentro das normas do Direito, contudo, a sua operacionalização é realizada de uma forma agressiva, abusiva, ou seja, passando dos limites razoáveis que o ordenamento jurídico permite.
Assim, o que antes era estabelecido como lícito ou ilícito, considerando os casos de dolo, fraude ou simulação, nos termos do artigo 149, inciso VII, do CTN, após a edição da LC 104/2001, com a introdução do termo dissimulação, passou-se a ter uma situação intermediária, cuja consequência foi a necessidade de criar conceitos até então inexistentes no Direito Tributário, como a fraude a lei (Código Civil, artigo 166, VI) e o abuso de direito (artigo 187 do Código Civil).
Há de se observar que a aplicação dessas figuras civis se dá quando os atos ou negócios jurídicos celebrados pelos particulares estiverem em desacordo com princípios e regras do Direito privado, como, por exemplo, a autonomia da vontade, a boa-fé contratual, os bons costumes etc.
Contudo, na medida em que se cogita a violação a princípios aplicáveis a relações jurídicas de natureza tributária (isonomia, capacidade contributiva), cuja disciplina há de ser feita por lei complementar (Constituição Federal, artigo 146, III), tais institutos do Direito Civil tornam-se inaplicáveis, tendo em vista ainda os artigos 109 e 110 do CTN.
Tem-se, portanto, que tal regramento, na sua forma atual, trata de uma norma sem efetividade para os fins aos quais ela foi proposta, pois que não fixa critérios inequívocos a serem observados para que se realize a desconsideração dos atos ou negócios jurídicos para fins fiscais.