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Empresários gaúchos pedem prazo para se adequar à nova norma da substituição tributária MARIANA CARLESSO/JC 

O decreto estadual que exige a complementação ou a restituição do ICMS Substituição Tributária (ST) recolhido na comercialização das mercadorias sujeitas a esse regime especial passa a valer nesta sexta-feira. A decisão de implementação da mudança foi tomada no final do ano passado pelo Executivo gaúcho e ainda gera dúvidas e divergências.

As entidades representativas do empresariado reclamam da insegurança criada pela alteração e do pouco tempo para adaptação. Elas pedem a prorrogação do prazo.

Já a Receita Estadual alega que o assunto vem sendo pautado há muito tempo e não tem por que preocupar as organizações. De acordo com o subsecretário da Receita Estadual, Ricardo Neves Pereira, já há um escalonamento daquelas empresas abrangidas pela mudança, dividindo os grupos de acordo com o porte dos negócios.

Na primeira fase de implantação do ajuste, que começa agora, apenas as empresas com faturamento superior a R$ 3,6 milhões poderão usufruir da restituição ou ter de arcar com o pagamento a mais. A Receita Estadual ainda não divulgou o calendário completo com as datas de implementação da novidade para as demais organizações.

“Todas essas médias e grandes empresas incluídas na nova regra não terão de cumprir nenhuma obrigação além das que já têm em suas rotinas”, garante Pereira. Ao preencher a Guia de Informação e Apuração do ICMS (GIA) mensal a partir dos dados disponibilizados na Escrituração Fiscal Digital (EFD), o sistema da Receita Estadual calculará automaticamente o imposto devido e os valores a serem restituídos ou complementados.

Apesar da alegação da Receita Estadual de que o Ajuste do ICMS/ST não deve gerar dor de cabeça, Federasul, Fecomércio-RS e Associação Gaúcha para Desenvolvimento do Varejo (AGV) se manifestaram contrárias à mudança. As entidades alegam que as alterações poderão produzir efeitos negativos, uma vez que não regulamentam apenas a restituição, mas também obrigam o pagamento da diferença de valor, nos casos em que a mercadoria tenha sido vendida por preço superior à base de cálculo do sistema.

Na tarde de quarta-feira, a diretoria da Federasul, juntamente com o presidente da Associação Brasileira de Automação para o Comércio (Afrac), Zenon Leite Neto, esteve reunida com o secretário adjunto da Fazenda Jorge Tonetto para discutir as alterações.

Nesta quinta, a presidente da Federasul, Simone Leite, falou com o governador Eduardo Leite, na CICS Canoas, sobre o assunto. Conforme nota da entidade, Leite disse que iria conversar com o secretário da Fazenda sobre o assunto.

De acordo com o vice-presidente de Integração da Federasul, Rafael Goelzer, “o modelo atualmente proposto amplia a burocracia do sistema, exigindo tanto do Estado quanto das empresas um esforço desnecessário para apurar a carga tributária”.

“Estamos preocupados com a operacionalização do sistema, por seu caráter burocrático e pelo impacto financeiro, especialmente para micro e pequenas empresas, que não dispõem de recursos para se adequar com essa brevidade”, completou Simone Leite. A recomendação da federação é de revogação da obrigatoriedade da complementação do pagamento da diferença do valor pago ou, diante dessa impossibilidade, a ampliação do prazo para início da obrigação para o dia 1 de julho.

A assessora tributária da Fecomércio-RS, Tatiane Corrêa, afirma que a própria Secretaria da Fazenda já admitiu ter dificuldade em implementar a regra, tamanho é o número de dados que terão de ser cruzados. Além dessa dificuldade, Tatiane alega que há pelo menos dois problemas na forma como foi conduzido o ajuste no regime de substituição tributária.

O primeiro é que a mudança foi feita através da edição de um decreto, enquanto a Constituição Federal exige que alterações no regulamento do ICMS somente podem ocorrer através de lei complementar. O outro fator usado pela Fecomércio-RS para pedir o cancelamento do decreto é o fato de que o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou apenas a possibilidade de restituição no julgamento que abriu precedente aos estados.

A AGV também reiterou, através de nota, que a medida necessita de mais tempo de discussão com os empresários e com a sociedade, “uma vez que a decisão traz insegurança jurídica, necessidade de investimentos imediatos em tecnologia e capital humano, custos elevados, além de fortes indícios de inconstitucionalidade”. A organização sugere que a vigência da medida seja prorrogada para 2020.

O subsecretário da Receita Estadual não considera a possibilidade de mudança na data de início da vigência da nova regra. Porém, admite que ainda há reuniões de negociações marcadas para a semana que vem.

Entenda o caso

A alteração no Regime de Substituição Tributária do ICMS tem sido alvo de debates desde 2016, quando decisão do STF admitiu ser devida a restituição da diferença do ICMS/ST pago a maior sempre que a base de cálculo efetiva (valor da operação) fosse inferior à presumida (MVA). Na interpretação das receitas estaduais, o julgamento abriu precedente legitimando a cobrança da complementação do imposto, nas hipóteses em que o preço praticado fosse maior que aquele utilizado para o cálculo do ICMS/ST.

Para a assessora tributária da Fecomércio-RS, Tatiane Corrêa, durante o julgamento no STF foi levantada abertamente a hipótese de inclusão da complementação do valor pago a menos na matéria final. Porém a turma não acatou essa possibilidade, dando um sinal claro de que os estados não poderiam fazer essa cobrança.

No Rio Grande do Sul, a complementação e a restituição do ICMS/ST foram ambas regulamentadas pelo Decreto nº 54.308/18, que criou o chamado Ajuste do ICMS/ST. O decreto passaria a vigorar em 19 de janeiro, mas o início do prazo foi adiado para 1 de março de 2019.

Roberta Mello – Jornal do Comércio