O projeto de reforma tributária enviado ao Congresso pelo governo é considerado mais tímido do que as duas propostas que tramitam na Câmara e no Senado desde o ano passado e traz uma controvérsia em relação à alíquota padrão da nova contribuição, que pode resultar em aumento de carga tributária.
As três propostas têm algo em comum: a oposição da maior parte das empresas do setor dos serviços, que passam a pagar a mesma alíquota do setor industrial.
No ano passado foram apresentadas duas emendas à Constituição para unificar tributos sobre o consumo. Sem o apoio do governo federal e sem consenso entre deputados e senadores, a tramitação de ambas foi deixada de lado após a chegada da pandemia ao país.
Os dois textos tratam de tributos federais, estaduais e municipais que seriam unificados em um imposto sobre valor agregado (IVA) com alíquota estimada em cerca de 25%. A proposta do governo trata de apenas dois desses tributos, o PIS e a Cofins, com alíquota padrão de 12%.
Em todos os casos, trata-se de um sistema que prevê a utilização de crédito, a partir do tributo pago pelos fornecedores de insumos, para reduzir o imposto a recolher.
A cobrança também se dá “por fora”. Ou seja, a nova CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) não integra a base de cálculo do próprio tributo, algo que ocorre atualmente e já gerou derrotas para o governo no Judiciário.
A legislação dos dois tributos será simplificada. Atualmente, há dois regimes principais: cobrança de 3,65% de forma cumulativa (sem direito a crédito de insumos) e 9,25% com direito a abatimento de crédito. E mais de uma centena de casos especiais.
Apesar de reduzir o número de exceções, a proposta do governo não afeta empresas dos regimes especiais do Simples e da Zona Franca de Manaus. Combustíveis e cigarros mantém o regime atual diferenciado de recolhimento.
Bancos, planos de saúde e seguradoras continuam no regime cumulativo, com alíquota de 5,8%.
Foi dada isenção na venda de imóvel residencial para pessoa física, na operação entre cooperativas e associados, nos produtos da cesta básica e no transporte público coletivo, entre outras exceções.
Ana Cláudia Akie Utumi, sócia-fundadora de Utumi Advogados, afirma que o mérito da proposta do governo é melhorar a legislação do PIS/Cofins, ao seguir o mesmo modelo de simplificação das propostas da Câmara e do Senado.
“A crítica é que, com os 12%, o governo está cobrando um pedágio, estão colocando uma alíquota que representaria acréscimo de carga tributária sobre o setor de serviços e de empresas que faturam menos de R$ 78 milhões/ano e estão no lucro presumido. E quem vai pagar é o consumidor”, afirma Utumi.
“O Simples não é afetado. Então, 85% das empresas não terão mudança. Para os outros 15%, me parece que vai ter aumento da carga”, afirma Rodrigo Spada, presidente da Febrafite (Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais) e da Afresp (Associação dos Fiscais de Rendas de São Paulo).
Segundo Spada, a inclusão de tributos estaduais e municipais na reforma do governo levaria a alíquota total a mais de 30%. Ele lembra que, na proposta da Câmara, a alíquota estimada era de 25% a 27% para substituir cinco tributos.
“Seria o IVA mais alto do mundo. Parece que houve um exagero. Imagino que o governo esteja pensando na negociação no Congresso, que vai ter de ceder aqui e ali, mas não deixa de ser uma proposta que não respeita a premissa de que a reforma seja para simplificar e não para aumentar a carga”, afirma Spada.
Odair Silva, líder de tributos da Grant Thornton, diz que a reforma do PIS/Cofins é um passo importante, pois sinaliza que o governo entende o problema que é ser o país mais burocrático do mundo em questões tributárias, mas não resolve a simplificação dos tributos sobre o consumo, pois deixa de fora da discussão estados e municípios. Ele também afirma que o aumento da carga para algumas empresas, como as que estão no setor de serviços e recolhem 3,65%, preocupa. Cita ainda o fim do sistema diferenciado para segmentos como automobilístico, beleza e cosméticos e farmacêutico.
“Dá para afirmar que o setor de serviços vai perder. O salto para 12% é um aumento de carga tributária muito pesado. E há uma série de segmentos, como educação, construção civil, telecomunicações, medicamentos, que vão ser impactados”, afirma.