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Macedo enfatiza necessidade de atualização das normas, principalmente em função da crise GILSON DE SOUZA/DIVULGAÇÃO/JC 

 

O Projeto de Lei nº 10.220, encaminhado ao Congresso Nacional pelo ex-presidente Michel Temer, está em tramitação desde maio de 2018 e ainda não tem prazo para deliberação. A proposta visa modernizar a legislação referente às recuperações judicial e extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária, alterando as leis nº 11.101, de 2005, e nº 10.522, de 2002.

De acordo com o coordenador da área de Reestruturação e Recuperação de Empresas do escritório Andrade Silva Advogados, a lei atual, que está em vigor há mais de 13 anos, precisa passar por ajustes e atualizações, para contribuir com a atividade empresarial, com a celeridade dos procedimentos, ajudando na conciliação dos interesses das empresas, dos credores, bancos, fornecedores, trabalhadores e parceiros comerciais. "A necessidade de modernização dessa lei é essencial, principalmente após a crise enfrentada pelos brasileiros nos últimos anos, que gerou um aumento no número de empresas em recuperação judicial", enfatiza Rodrigo Rocha de Sá Macedo, diretor jurídico da Andrade Silva Advogados.

O especialista acrescenta que o Projeto de Lei (PL) nº 10.220/2018, inclusive, faz parte de um pacote de medidas, que estão em tramitação, e que foram selecionadas pelo governo atual para proposição de um pacto ao Legislativo com foco em facilitar a aprovação desses projetos, que têm potencial para melhorar o ambiente de negócios no Brasil.

Ele explica que, entre as principais deficiências da Lei nº 11.101/2005, está a falta de acesso a crédito, que auxilia a empresa em recuperação, um dos fatores que poderá ser resolvido, caso o projeto seja aprovado. "Um dos pilares do PL é facilitar e favorecer a relação da empresa com os credores que lhe derem crédito. Assim, a empresa pode, em pleno funcionamento, gerar riquezas e aumentar a perspectiva de se recuperar e de pagamento aos seus credores", diz.

O projeto também quer acabar com a exigência da assembleia geral de credores, ato formal e presencial para deliberação sobre a proposta de pagamento, que engessa e atrasa o trâmite, possibilitando a adoção de maneiras alternativas de deliberação, ampliando o alcance da recuperação judicial.

Macedo informa que a recuperação judicial é apenas uma das possibilidades, pois há outros mecanismos de negociações, recomposição de passivos e até mesmo a recuperação extrajudicial, quando é feito um acordo particular entre o devedor e o credor, sem a intervenção inicial do judiciário. "A recuperação judicial, no entanto, permite um período de não exigência das obrigações legais, no qual a empresa pode se reestruturar, contando com o apoio de uma assessoria jurídica, para retomar suas atividades e negociar com seus credores de forma financeiramente estável e sustentável", esclarece.

O Brasil encerrou 2018 com 1.408 pedidos de recuperações judiciais, 12 a menos do que em 2017, uma queda de apenas 0,8% que, de acordo com o advogado, pode ser considerada pouco significativa. Desses pedidos, 761 foram requeridos por micro e pequenas empresas, 355 por médias e 343 por grandes. O recuo foi de 24,4%, se comparado ao recorde histórico de 2016, quando 1.863 entraram com o pedido, o maior volume registrado, desde 2006, após a Lei nº 11.101/2005. Os dados são do Indicador Serasa Experian de Falências e Recuperações.

JC Contabilidade – O PL foi apresentado no ano passado. Por que este ano ele voltou ao centro do debate?

Rodrigo Rocha de Sá Macedo – Ele voltou ao debate, pois, como o PL foi enviado ao Congresso Nacional pelo presidente Michel Temer, em meados de 2018, a votação dele ficou prejudicada. Como a alteração da Lei de Falências e Recuperação de Empresas é uma das pautas econômicas do novo governo (como também já era do governo Michel Temer), o assunto foi retomado esse ano.

Contabilidade – Quais as principais inovações que a proposta traz consigo?

Macedo – O PL é bem extenso, com inúmeras alterações. Podemos ressaltar, de uma forma geral, que ele vem para modernizar a legislação, já em vigor há cerca de 14 anos, e com várias experiências nesse período, que permitem perceber a necessidade de algumas alterações. Entre os destaques, estão a maior celeridade, com a redução de alguns prazos previstos na lei, por exemplo, prazo para realização de assembleia de credores (antes, 150 dias e, no PL, com 120 dias); possibilidade de substituição da assembleia por um termo de acordo, assinado com os credores, evitando a realização da assembleia, procedimento muito formal e, em alguns casos, hostil e muito oneroso; definição da contagem dos prazos em dias corridos e não úteis, como hoje alguns Tribunais já vêm aceitando; criação de varas regionais especializadas na matéria de insolvência, uma vez que, hoje, o juízo competente para julgar é o do principal estabelecimento da empresa, fazendo com que, em comarcas menores, alguns juízes que não têm essa especialidade tenham que lidar com esses processos; tratamento diferenciado ao credor que conceder crédito à empresa em dificuldade: em caso de falência, esse credor teria tratamento privilegiado no recebimento de seu crédito; dentre outros pontos.

Contabilidade – Como as empresas poderão se beneficiar?

Macedo Com as alterações acima, em sua maioria, o processo ficaria mais dinâmico para a renegociação e mais célere, com a solução de diversos entraves processuais que, muitas vezes, dificultam o sucesso do procedimento. Além disso, terão mais flexibilidade na composição das negociações e poderão dar tratamento diferenciado aos credores com os quais mantiver relação de parceria/crédito, estimulando o desenvolvimento da atividade da empresa e, consequentemente, favorecendo sua recuperação.

Contabilidade – E a União pode tirar proveito de alguma forma?

Macedo – Com as alterações propostas no PL, as fazendas públicas, não só da União, mas dos estados, DF e municípios, poderão participar nos processos, sendo intimadas dos atos e podendo relacionar eventuais débitos fiscais que, embora não se sujeitem ao procedimento, sejam importantes para avaliação da situação financeira da empresa, permitindo ao estado, também, uma participação mais ativa nos processos.

Contabilidade – As empresas já em recuperação judicial poderão usufruir dos benefícios?

Macedo – A legislação será aplicável aos processos em curso. Porém, o PL faz uma ressalva em relação a algumas alterações, que somente se aplicarão aos processos novos, tais como: definição de competência do juízo para as varas regionais especializadas, formatação das classes, escolha do administrador judicial e comitê de credores, dentre outros.

Contabilidade – Não é prejudicial ao ambiente de negócios que mudanças como essa acabem acontecendo? Isso não gera uma certa instabilidade e insegurança jurídica?

Macedo – Entendo que não. Pelo contrário. O movimento de alteração da legislação vem passados 14 anos do início de sua vigência, com vários processos tendo sido conduzidos e concluídos nesse período, e com alterações fruto da provocação de diversas entidades envolvidas nesses processos, com base nas experiências positivas e negativas em todo esse período. Como a alteração vem em sua grande parte para modernizar e dinamizar o procedimento, entendo que será favorável ao ambiente de negócios, permitindo mais produtividade das empresas em recuperação judicial, sem prejuízo ao crédito.

Contabilidade – Essas mudanças vinham sendo pleiteadas por algum setor? Se sim, quais?

Macedo – Diversos setores foram envolvidos nas mudanças. A Câmara dos Deputados criou uma comissão especial para analisar a proposta do governo, composta por juízes, advogados, procuradores da Fazenda Nacional, auditores da Receita Federal, entidades de representação da indústria e instituições financeiras.

Roberta Mello – Jornal do Comércio