O assessor especial do Ministério da Economia, Guilherme Afif Domingos, é o entrevistado da semana da Agência Sebrae de Notícias

Agência Sebrae de Notícias

O entrevistado dessa semana da Agência Sebrae de Notícias é o atual assessor especial do Ministério da Economia, Guilherme Afif Domingos, que comandou o Sebrae Nacional entre os anos de 2015 e 2019. Ao lado do ministro Paulo Guedes, ele continua atuando na defesa do empreendedorismo no país.

Afif é um dos arquitetos do sistema Simples de tributação (regime de tributação diferenciado, voltado a micro e pequenas empresas dependendo da receita bruta anual auferida). Durante o período que esteve à frente do Sebrae, Afif não só acompanhou, como também participou da criação de medidas fundamentais para o empreendedor brasileiro, como a figura do Microempreendedor Individual (MEI) e do Fampe (Fundo de Aval às Micro e Pequenas Empresas), que durante a pandemia passou por uma reformulação para dar mais apoio aos empresários neste momento delicado.

Na entrevista à Agência Sebrae de Notícias, Afif comenta sobre a importância de medidas que aumentem o acesso ao crédito aos donos de pequenos negócios e defende a consolidação de medidas emergenciais lançadas durante a pandemia, como é o caso do Pronampe. Ele defende ainda o Simples Nacional das críticas de quem considera o sistema tributário uma renúncia fiscal.

O Sebrae completa 50 anos em 2021. Como o senhor avalia a trajetória da instituição no cumprimento do seu papel de fomentar o empreendedorismo no país?

Eu considero o Sebrae uma das mais importantes instituições do nosso país e nesses 50 anos de existência – começando com o Sebrae com C ainda vinculado ao governo federal e depois transformado em serviço social autônomo, que deu mais autonomia para a organização. Ainda temos um imenso desafio pela frente pois o Sebrae é a única instituição que tem um olhar para nada mais, nada menos, do que 98% do universo empresarial brasileiro. Portanto, para atingir todas essas pessoas precisamos fazer um esforço permanente para fortalecer a missão e o papel do Sebrae, a fim de assistir e orientar o micro e pequeno empresário.

Mesmo com a pandemia em 2020, o Sebrae comemorou avanços significativos tais como a marca de 10 milhões de MEIs registrados e a aprovação do Marco Legal das Startups, o Pronampe como política permanente, entre outros. Quais são os principais desafios para as micro e pequenas empresas e para o Sebrae neste momento?

Eu não tenho dúvida que tivermos ações importantes e agora é tempo de sedimentar essas conquistas. O número de MEIs está dentro da previsão quando a figura jurídica do MEI foi criada, em 2008. Eu fui o autor da ideia, que começou pelo regime do empreendedor urbano pessoa física. Depois, ele foi transformado em MEI. À época, prevíamos 1 milhão de formalizações por ano. E, de fato, isso aconteceu. Hoje em dia, com a pandemia da Covid-19, as pessoas estão buscando trabalhar por conta própria porque há falta de perspectiva dos empregos formais. O empreendedorismo por necessidade está muito presente e principalmente agora temos que consolidar essa política. Veja aí o Pronampe: ele surgiu de uma ideia antiga nossa que era o fundo garantidor, o Fampe. Criamos há 28 anos (quando fui presidente do conselho do Sebrae). O Fampe é o fundo garantidor de crédito ao pequeno empresário. Os bancos exigem um conjunto de garantias reais para esses empréstimos e a falta disso isolava o pequeno empresário dentro do sistema financeiro. Ele não conseguia acesso. Sabendo disso, criamos o Fampe – que começou acanhado, não foi abraçado com toda força porque ainda não se via o crédito como a mola mestra do desenvolvimento. Inspirado nessa medida, o governo federal criou o Pronampe. Participei desse processo dentro do Ministério da Economia e, inclusive, propus ao ministro Paulo Guedes utilizar a capilaridade da Receita Federal para comunicar à população que o Tesouro Nacional seria o grande garantidor do recurso emprestado pelo Pronampe. A instituição fez o papel de fundo de garantia para o recurso que é originário do FGO do Banco do Brasil. O FGO permitiu que parte das pequenas empresas na pandemia (infelizmente muita gente ficou de fora) conseguisse ter acesso ao crédito. Essas medidas elaboradas devido à pandemia devem ser consolidadas daqui para a frente.

O acesso ao crédito ainda é uma das maiores queixas dos empreendedores no país. Como o governo tem atuado para melhorar a relação dos micros e pequenos negócios com os bancos?

A grande revolução que estamos vendo, sem dúvida, é o aumento da concorrência no sistema bancário brasileiro. Temos as cooperativas de crédito, as Fintechs, os sistemas eletrônicos de acesso criados pelo Banco Central. Hoje há uma série de alternativas que permitem desobstruir o caminho do crédito. O Sebrae tem um papel fundamental na oferta de crédito assistido. Quem procura o Sebrae quer orientação, consultoria sobre o seu negócio, mas no fundo sonha em ter acesso ao crédito com aval da instituição que está lhe assistindo. Por isso a importância de unir o fundo de aval com o crédito. Muitas iniciativas ocorrem hoje no Brasil como alternativa para o crédito fora do sistema bancário tradicional. Esse sistema só opera com as empresas mais estruturadas, organizadas e que têm bens para dar como garantia ao empréstimo. Mas como a grande massa precisa de orientação e de aval para dar de garantia real, o Sebrae tem papel fundamental. Eu insisto nisso. Muita gente do Sebrae foge da ideia de se comprometer com o cliente que precisa de crédito. Por isso, defendo que a instituição seja uma alavanca, uma chave forte que abra a porta do crédito para o pequeno crescer. Em 2021 e 2022 deveremos sedimentar essa política, que é uma conquista dos pequenos empresários durante o período da pandemia. Sempre uso a frase que é a seguinte: nós temos que usar as experiências em tempos de guerra para serem aplicadas em tempos de paz.

Sendo um dos idealizadores da Empresa Simples de Crédito, aprovada por lei em 2019, o senhor acredita que elas estão desempenhando o papel de desburocratizar o acesso ao crédito e estimulando a concorrência no setor?

Ainda não. Embora haja mais de 800 empresas simples de crédito (ESC) inscritas e legalizadas, acho que nós ainda não demos a devida atenção ao microcrédito localizado. Isso vai vir com o tempo porque nós fomos fortemente abalados com a pandemia, a busca do crédito fiscal, a busca do Pronampe, atropelou isso. Essas medidas alternativas não permitiram que a gente visualizasse o papel da ESC. Acredito que o Sebrae pode ajudar, principalmente, nas pequenas comunidades a incentivar as pessoas a adquirirem o crédito na sua localidade, com gente conhecida. É o chamado “negócio do fio do bigode”. Se a pessoa tem talento e está precisando de crédito para comprar uma máquina de costura, um forno, a estrutura oferecida pela ESC de microcrédito funciona. Vamos esperar que a ESC entre no hall das medidas importantes para abrir o caminho do crédito para o pequeno empresário.

Desde que foi criado o Simples Nacional sempre foi alvo de críticos que apontam essa modalidade de tributação uma espécie de renúncia fiscal. Qual sua resposta a esses críticos? Como defender a permanência do Simples?

Isso é um problema. O pessoal contrário insiste nisso. Eles não gostam do Simples porque é exatamente simples! Criamos um modelo de regime especial no qual o empresário faz apenas um único pagamento, numa guia, de mais de oito impostos federais, estaduais ou municipais. Aliás, o Simples tem que ser o modelo da futura reforma tributária no Brasil. Quem não está no Simples cai no complicado. E quem fica no complicado não sobrevive O regime especial nasce de uma disposição constitucional, portanto os tecnocratas, burocratas, economistas de cabeça de planilha, que não conhecem a realidade do dia-a-dia, consideram o Simples como renúncia fiscal. Na verdade, quem está no Simples paga imposto de uma forma simplificada. Isso não significa que o governo está fazendo um favor de conceder à pequena empresa o sistema diferenciado de recolhimento. Não é favor coisíssima nenhuma! É determinação constitucional escrita no artigo 179 da Carta Magna. Não se deve falar do Simples como renúncia fiscal e, sim, como um sistema de simplificação. O que devemos fazer é transformar o complicado em simples. E não transformar o nosso Simples em complicado. Os contrários estão invertendo a ordem da discussão política. E isso nós vamos combater até o fim.