Tributação de dividendos e outros erros da "reforma" que pode esperar
Nada mais inoportuno do que o pacote de medidas, que se autointitula de "reforma tributária", diante da gravíssima crise econômica em curso no País, com as empresas ainda em recuperação, taxas elevadas de desemprego e diversos investimentos em estruturação. Na atualidade, em sentido diametralmente oposto, todos os países ainda estão a adotar medidas de recuperação das empresas e negócios afetados, como bem destaca o relatório da OCDE "Tax Policy Reforms 2021: Special Edition on Tax Policy during the Covid-19 Pandemic".
Desde o Plano Real, a isenção dos dividendos e a dedutibilidade do JCP foram os principais instrumentos de atração de investimentos do País, apesar do custo Brasil e das conhecidas externalidades decorrentes da mais elevada tributação sobre consumo que se conhece no mundo, além da insegurança jurídica, em especial do ICMS, principal motivo inibidor de investimentos, como destacam várias publicações internacionais.
Não se desconhece a urgência e necessidade de reformas no sistema tributário nacional, mormente a da renda. Contudo, as demandas sempre foram dirigidas para melhorias de simplificação, desburocratização e segurança jurídica no âmbito dos tributos do consumo (ICMS, ISS, IPI e PIS/COFINS), primordialmente, e só em etapa secundária, após cumprido este ciclo, passa-se à tributação da renda e do patrimônio.
O governo, porém, decide inverter a ordem e promover o maior aumento de carga tributária já visto nos últimos 25 anos, com a ruína do regime de lucro presumido e completa afetação aos setores de serviços, construção civil, agronegócio, educação, turismo, restaurantes e outros. Um espetáculo de agressividade fiscal, sem nenhuma neutralidade. O projeto ainda estimula a proliferação de pessoas jurídicas para quem tenha receita inferior a vinte mil reais (pejotização em massa), amplia a burocratização das pessoas físicas e certamente trará como resultado um aumento exponencial da informalidade e da sonegação.
No Brasil, como a tributação vê-se concentrada nos tributos de produção ou de circulação das mercadorias e serviços, a tendência foi sempre a preponderância dos controles do Fisco sobre as empresas. Assim, neste modelo de tributação em bases objetivas, o regime do "lucro presumido" teve um êxito notável na formalização da nossa economia. Entretanto, a partir desta reforma, como o fluxo de receitas ou faturamento é o mesmo que se presta como base de incidência do PIS/Cofins (3,65%), ou da CBS (12%), do lucro presumido e dos dividendos (20%), pode-se ter uma "tripla tributação econômica" sobre o mesmo fator de riqueza, o que pode ser assaz desestimulante.
Ao pretender passar para uma tributação de dividendos, da empresa para a pessoa do investidor, o simples mecanismo de controle das distribuições disfarçadas de lucros (DDL) pode se mostrar insuficiente para conter as fraudes e informalidades, além dos expedientes típicos destas práticas, como volta do uso do cheque (nos tempos do PIX), aumento da demanda por papel moeda, vendas sem notas fiscais e outras mazelas.
Para os que dizem que não há muitos países no mundo que não tributam dividendos ou que possuem um regime de JCP, vale lembrar que não há países no mundo que tenham tributação tão gravosa sobre "receitas" ou "faturamento", ou ainda que na apuração do imposto sobre a renda, tenham uma base de cálculo tão ampla, pela redução dos elementos negativos que se permite deduzir, como despesas, custos etc. Basta ver o peso dos custos com folha de salários nas empresas, ou mesmo o custo agregado com os tributos indiretos (ICMS, ISS, IPI, PIS/Cofins, todos com não cumulatividade parcial ou até mesmo cumulativos).
O momento pede redução de gasto público, e não orçamentos perdulários, como o caso das verbas na ordem de 40 bilhões com emendas de relator, uma inconstitucionalidade aviltante, que só existe para promover a reeleição de políticos. No lugar de austeridade, fundo eleitoral na casa dos 6 bilhões. Ao invés de reforma administrativa, generosos benefícios fiscais para grupos de apoio do governo. E para custear tudo isso, uma reforma tributária que trará como resultado tornar ainda mais pobre a classe média brasileira, que sequer se recuperou das enormes dificuldades geradas pela pandemia, com reduzidas ajudas do setor público.
Contudo, se ainda assim o Congresso Nacional decidir levar adiante esta proposta, vale considerar que a tributação dos dividendos reclama o necessário respeito à garantia de segurança jurídica, quanto à intributabilidade das distribuições decorrentes dos lucros apurados antes de 31.12.2021. Por uma, porque temos o princípio da irretroatividade das leis tributárias que criam ou aumentam tributos na Constituição. E, por duas, porque o fato gerador relativo aos dividendos encontra-se submetido à isenção, pela redação do art. 10 da Lei nº 9.249/95, que assim prescreve:
Art. 10. Os lucros ou dividendos calculados com base nos resultados apurados a partir do mês de janeiro de 1996, pagos ou creditados pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real, presumido ou arbitrado, não ficarão sujeitos à incidência do imposto de renda na fonte, nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior.
§ 1º No caso de quotas ou ações distribuídas em decorrência de aumento de capital por incorporação de lucros apurados, a partir do mês de janeiro de 1996, ou de reservas constituídas com esses lucros, o custo de aquisição será igual à parcela do lucro ou reserva capitalizado, que corresponder ao sócio ou acionista.
§ 2º A não incidência prevista no caput inclui os lucros ou dividendos pagos ou creditados a beneficiários de todas as espécies de ações previstas no art. 15 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, ainda que a ação seja classificada em conta de passivo ou que a remuneração seja classificada como despesa financeira na escrituração comercial.
A isenção, portanto, alcança diretamente os dividendos recebidos. Mais claro, impossível. O texto do referido art. 10 da Lei nº 9.249/95 é explícito ao destacar que "nem integrarão a base de cálculo do imposto de renda do beneficiário, pessoa física ou jurídica, domiciliado no País ou no exterior". Talvez os incautos que alardeiam uma arrecadação de 36 bilhões previstos para o primeiro ano de vigência da medida devam se conter, pois o tal "fato gerador autônomo", tão decantado, também este, está submetido à isenção, como tenho repetido em sucessivas exposições e debates.
Destarte, caso as autoridades fiscais pretendam arrecadar qualquer imposto sobre lucros acumulados, reinvestidos ou em quaisquer dos fundos de reservas, certamente terá que enfrentar um longo e temerário contencioso tributário, de ínfima chance de êxito.
Quanto aos dividendos, vale considerar que a tributação incidente sobre o resultado da atividade empresarial precisa acompanhar alguma política econômica de direcionamento da atividade empresarial. Indaguemos, então: qual a "tax policy" que informa a proposta em curso? Ninguém sabe. Nenhuma linha foi escrita.
De estímulo, agravamento ou de neutralidade, a tributação que cause impactos sobre o fim lucrativo do exercício de livre-iniciativa, que é um dos fundamentos do próprio Estado, como o declara o art. 1º, da Constituição, reclama motivação em fins e valores constitucionais. Daí a relevância da política fiscal vir destacada, como expressão do planejamento público (art. 174 da CF), que é dever do Estado, para orientar a direção da ordem econômica aos particulares.
A razão é óbvia. O custo do capital investido induz as expectativas sobre remunerações das fontes de financiamento (próprias e de terceiros), a justificar as decisões dos sócios ou acionistas em favor da lucratividade possível. Por isso, como observa Alexandre Assaf Neto, o custo de capital é geralmente isolado a partir de cálculo dos custos de oportunidade (sócios ou acionistas) e aquele do capital de terceiros (weighted average cost of capital)1. E tudo isso segue uma dinâmica de sucessivas avaliações de custos e de oportunidades da sua assunção, comparativamente com outras alternativas, tomando em consideração o risco e a rentabilidade.
A taxa de retorno dos investimentos próprios aplicados na empresa deve sempre servir de estímulo aos interessados, em adequada política de dividendos, tanto pública quanto privada, ademais do dever que o ordenamento tem de preservar a certeza do direito e a segurança jurídica no tempo, em respeito às decisões dos particulares de investirem em sociedades, pelo fundamento de livre iniciativa que deve ser preservado em todos os seus contornos (art. 1º e 170, além do 174, da CF).
Os dividendos são espécies de remuneração do capital de risco investido, como custo de oportunidade; logo, é "a parcela do lucro produzido que deverá vir a remunerar diretamente o fator capital" 2, como sintetiza Marcos Paulo de Almeida Salles, Professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
Por isso, quando os sócios ou os acionistas decidem, ao amparo da legalidade, qual a melhor opção para remunerar o capital, auspiciam segurança jurídica na continuidade do investimento, considerando inclusive, dentre outros aspectos igualmente importantes, a melhor rentabilidade possível, pela maximização dos lucros e distribuição de resultados. A política de dividendos é matéria com a qual nenhum investidor pode abrir mão de rigoroso controle das modalidades eleitas, segundo a orientação do planejamento público (art. 174 da CF).
Basta ver a repercussão sobre os preços em ofertas que foram feitas nos processos de licitação de concessões ou permissões. Não há dúvidas que o preço vencedor levou em conta o custo tributário sobre as remessas de dividendos. Com tamanha guinada, sem respeito ao passado, este é um fato do príncipe que poderá motivar diversos pedidos de reavaliação das políticas de preços. Mais um caso em desfavor da população.
Portanto, impõe-se observar regras de transição que assegurem a proteção dos investimentos em relação ao passado. No caso dos JCP, por exemplo, não se pode admitir que se negue a dedutibilidade aos empréstimos tomados antes da entrada em vigor da lei. É o mínimo de estabilidade temporal ao qual o direito tributário se impõe.
A partir de uma análise do Relatório de McLure3, Henry Tilbery foi o primeiro autor que trouxe para o Brasil o estudo mais completo sobre os métodos de tributação do capital e das diversas técnicas para evitar sua dupla tributação econômica. Há distintos modelos de tributação de dividendos.
O Brasil atualmente aplica dois desses métodos: para os dividendos propriamente ditos (i), uma integração total, pelo método da eliminação da tributação das pessoas jurídicas em separado e tributação nos acionistas dos lucros distribuídos; e, para os JCP (ii), o método da Dedução dos Dividendos Pagos (Dividend Paid Deduction), pelo qual a pessoa jurídica pode deduzir da base de cálculo dos lucros tributáveis, como espécie de integral parcial4.
Para uma futura reforma, o ideal seria criar um escalonamento de alíquotas progressivas, conforme os tipos de apuração dos rendimentos, a exemplo: Simples Nacional: 5% sobre o valor distribuído; Lucro Presumido: 7,5% até doze milhões de faturamento; 10% até o limite final; Lucro Real: 15% sobre os dividendos distribuídos.
O Fisco talvez suponha que todo empresário deva escolher o método que implique pagar mais impostos e que lhe garanta menor capacidade de crescimento do negócio e de enriquecimentos dos seus sócios ou acionistas, mas não é assim. Tanto a Lei das Sociedades Anônimas quanto o Código Civil obrigam-no ao contrário e impõem ao administrador escolha as opções mais rentáveis e menos custosas como forma de perseguir a função social da empresa.
Ora, a coerência do sistema requer adequada ponderação dos princípios constitucionais, na proteção do direito à livre-iniciativa, bem como o respeito às regras de direito privado que dispõem sobre o tratamento aplicável ao capital privado empregado na atividade produtiva. O direito de liberdade de escolha sobre os melhores métodos de remuneração do capital, dentre os autorizados pela lei, como exercício de autonomia privada na gestão do capital, repercutem a confiança depositada no Estado e no regime jurídico em vigor ao tempo dos investimentos. Mudanças, é certo, podem e devem ser feitas, mas com atenção para garantir segurança jurídica e respeito à previsibilidade.
A formação e funcionamento de uma empresa envolve um conjunto muito complexo de fatos financeiros que podem ser determinados em dois momentos bem específicos: o da capitalização, quando da formação do capital social, na constituição da sociedade, e aqueles do financiamento, de condução do capital das suas fontes para o patrimônio da sociedade, surgidos no seu percurso de funcionamento, com a finalidade de ampliar a atividade econômica da empresa e produzir lucros.
Essa decisão sobre financiar-se com capital próprio ou mediante investimentos de terceiros, como dito antes, não é, de longe, uma decisão fundada em interesses de aproveitamento de alguma vantagem fiscal, por ter efeitos imediatos sobre o valor da empresa e dos resultados distribuídos, como o preço das ações ou mesmo do crescimento do lucro líquido da entidade.
Estudos desenvolvidos na FEA-USP demonstram que a tributação diferenciada dos juros sobre o capital próprio aumenta o valor e o retorno ao acionista de uma empresa financiada por meio de recursos próprios. Disso resulta que a eficácia gerada pela legislação de juros de capital próprio garante a escolha do melhor método de financiamento da empresa (de capital próprio) sem os riscos gerados por financiamentos de terceiros (empréstimos e semelhantes) em alavancagens da empresa, ou pela ampliação do capital investido.
No direito brasileiro, o Juro sobre Capital Próprio (JCP) apresenta natureza comparável aos dividendos, e mesmo definido como “juro”, deve-se qualificá-lo como distribuição de resultados, pois: i) os JSCP são modalidades de investimento; ii) somente podem ser pagos quando apurado lucro no período; iii) o pagamento dos créditos é opcional; iv) aplica-se a dedutibilidade dos montantes distribuídos à apuração do lucro da entidade; v) podem ser compensados com dividendos obrigatórios, segundo o previsto na Lei das S. A.; e vi) a empresa ficará obrigada ao pagamento do IR-Fonte, mediante alíquota de 15%, a título definitivo ou como antecipação, além da discutível e indevida cobrança de PIS/COFINS.
Esse mecanismo, a exemplo daquele adotado nos Estados Unidos, visa a desencorajar o recurso à contratação de empréstimos com terceiros, substituindo-os (ou pelo menos reduzindo-os) por um incentivo aos acionistas para reforçarem o capital das empresas com recursos próprios. Tudo como forma de fomento ao DVA da empresa.5 Trata-se de medida útil para aumentar a liquidez das empresas. No momento da pandemia, diante da escassez do crédito público, ou do custo elevado dos empréstimos dos bancos, além do risco de variações no período, o JCP foi de extrema importância.
Por todos estes motivos, além de tantos outros que dizem respeito às alterações pontuais da legislação, o mais correto, neste momento, seria o Governo abandonar este projeto. Cientes, todos, de que temos um encontro marcado com a reforma tributária do consumo, da renda, da propriedade e dos salários tão logo tenhamos projetos amadurecidos e quando minimamente superados os impactos da pandemia. O Leviathan pode esperar, enquanto a sociedade se reconstrói.
1 Passim, Assaf Neto, Alexandre. Contribuição ao estudo da avaliação de empresas no Brasil. Ribeirão Preto: FEA-USP, 2004, Tese (Livre-Docência), p. 61;
2 Salles, Marcos Paulo de Almeida. Política de dividendos. Revista de Direito Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem. São Paulo: 2001, v. 4, n. 14, p. 79-89, out./dez. 2001, p. 79-89; Cf. BULHÕES, Octavio Gouveia de. Dois conceitos de lucro. Rio de Janeiro: Apec, 1969, 212p.
3 TILBERY, Henry. Imposto de renda – pessoas jurídicas: integração entre sociedade e sócios. São Paulo: Atlas, 1985, p. 86; Cf. McLure Jr., Charles E. Must Corporate Income Be Taxed Twice? - A Report of a Conference Sponsored by the Fund for Public Research and the Brookings Institution. Brookings Institution Press, 1979, 262 p.; MODIGLIANI, F.; MILLER, M. The cost of capital, corporation finance and the theory of investment. The American Economic Review, 1958, v. 48, n° 3, ps. 261-297; ____. Corporate Income Taxes and the Cost of Capital: A Correction. The American Economic Review, 1963, v. 33, n° 3, p. 433-443. PISTONE, Antonio. La tassazione degli utili distribuiti e la thin capitalisation: profili internazionali e comparati. Padova: CEDAM, 1994, 429 p.; XAVIER, Alberto. Natureza jurídico-tributária dos “juros sobre o capital próprio” face à lei interna e aos tratados internacionais. Revista dialética de direito tributário, São Paulo: Dialética, 1997, nº 21, jun., p. 7-11.
4 Noé Winkler reconhece similar efeito de dividendo, ao mencionar da importância do regime de JSCP: “introduziram-se compensações, atenuantes da carga fiscal, destacando-se a redução da alíquota de 25% para 15%; a integração tributária na incidência sobre lucros e dividendos, estabelecendo-se unicidade - pessoa jurídica/pessoa física, com a tributação exclusiva desses rendimentos na empresa, isentando-os quando do recebimento pelos beneficiários - na fonte ou na declaração de ajuste anual; e, como destaque importante, a dedução de juros a título de remuneração do capital próprio” (grifamos). WINKLER, Noé. Imposto de Renda. 2ª ed., RJ: Forense, 2002, p. 517.
5 Santos, Ariovaldo dos. Demonstração contábil do valor adicionado-DVA: um instrumento para medição da geração e distribuição de riqueza das empresas. São Paulo, Tese (Livre Docência), 1999, 2 v.;
Empresários se reúnem com relator da reforma tributária e demonstram rejeição mesmo após mudanças
Apesar de Celso Sabino cortar em 12,5 pontos percentuais o Imposto de Renda das empresas, setor ainda questiona a proposta de tributação de dividendos e já fala em adiar a votação do texto
Eduardo Laguna
Promovidas após muita reclamação sobre aumento de carga, as mudanças propostas no capítulo da reforma tributária que trata do Imposto de Renda não conseguiram atrair até agora apoio em bloco do setor empresarial.
Nesta quarta-feira, 21, lideranças de entidades que representam diversos setores da economia levaram sua insatisfação à nova versão da reforma ao relator da matéria, o deputado Celso Sabino (PSDB-PA), em reunião na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Apesar de o parecer de Sabino cortar em 12,5 pontos porcentuais a alíquota do Imposto de Renda cobrado das empresas – num avanço em relação à proposta inicial, que restringia a desoneração a cinco pontos porcentuais -, prevalece o entendimento de que a tributação de dividendos, embora menor do que na primeira versão, eleva a carga tributária atual.
A conclusão de que a conta de impostos ficará mais cara é apontada, principalmente, por setores onde há maior presença de empresas enquadradas em regimes de lucro presumido e no Simples.
Apesar do esforço de Sabino de destacar aos quase 100 participantes do encontro os aspectos positivos do texto, como a atualização da tabela do Imposto de Renda, o parlamentar não conseguiu aplacar a rejeição à matéria. Empresários deixaram a reunião reafirmando a posição de que, pela forma como está sendo costurada, é melhor adiar a votação da reforma tributária para centrar o foco na reforma administrativa.
“O projeto inicial era péssimo, este [substitutivo de Sabino] é ruim”, diz Fábio Pina, assessor econômico da FecomercioSP, associação que representa os interesses dos setores de comércio, serviços e turismo de São Paulo.
A posição a favor da reforma administrativa parte da premissa de que, se conter os gastos com o funcionalismo, o governo poderá promover uma reforma tributária e não vai precisar elevar a carga.
Nas contas da FecomercioSP, com a alíquota básica do Imposto de Renda cobrado da pessoa jurídica reduzida a 2,5% em 2023, como proposto na nova versão, a carga tributária das empresas e seus sócios subirá de 34% para 37,2%, dada a taxação de 20% dos dividendos.
Segundo Fernando Blower, diretor-executivo da Associação Nacional de Restaurantes (ANR), as manifestações de lideranças empresariais na reunião desta quarta-feira repetiram em sua maioria o discurso, apresentado em encontro, também na Fiesp, realizado duas semanas atrás, de que há mais dúvidas do que certezas para levar a reforma adiante neste momento.
“Muitos entendem que é melhor esperar a economia melhorar e fazer a reforma em outro momento, já com a administrativa aprovada. Não dá para discutir isso agora. Ainda há mais rejeição do que aceitação”, diz Blower.
Em nota divulgada após a reunião com Sabino, o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, classificou como “perigoso” o momento para a realização da reforma tributária. “O momento como o que vivemos, de escassez de recursos, é sempre perigoso para uma reforma tributária. Nossa preocupação é que não haja aumento de impostos”, disse Skaf.
Fonte: Estadão Conteúdo
Empresas do Simples Nacional podem ser diretamente afetadas pela tributação dos dividendos
O vice-presidente da Fenacon, Wilson Gimenez Junior, explica que não há nada de errado em tributar os lucros distribuídos, desde que haja, no mínimo, uma diminuição equivalente no tributo corporativo devido pelas empresas do Simples Nacional
Na última terça-feira, 20, o relator do Projeto de Lei 2.337/21, Deputado Celso Sabino concedeu entrevista explicando possíveis novas inserções no relatório preliminar da Reforma Tributária, conforme noticiamos no Portal Contábeis.
O texto previa a redução da alíquota básica do tributo dos atuais 15% para 5% em 2022, e 2,5% a partir de 2023, condição que não está sendo estendida às MPEs optantes pelo Simples Nacional.
Agora, segundo a entrevista, existe a possibilidade da diminuição da isenção dos lucros pagos aos cotistas das empresas do Simples Nacional dos atuais R$20.000,00 para R$2.500,00, estendendo também a isenção aos cotistas/acionistas de todas as empresas, independentemente do regime tributário adotado.
A possibilidade causou grande preocupação às PMEs, que em 2020 somaram um total de 4 milhões de novos negócios abertos somente naquele ano, já que a categoria sempre teve uma diferenciação justificada às empresas de maiores portes e segue indo na contramão da crise econômica, continuando sua expansão no país.
Segundo levantamento do Governo feito em 2020, as PMEs representam 99% dos negócios brasileiros, têm participação de 30% no PIB e são responsáveis por 55% dos empregos gerados no país.
Tributação de lucros
O vice-presidente da Fenacon, Wilson Gimenez Junior, explica que não há nada de errado em tributar os lucros distribuídos, desde que haja, no mínimo, uma diminuição equivalente no tributo corporativo devido pelas empresas do Simples Nacional, sobretudo quando se pretende diminuir o limite de isenção para R$2.500,00 ao mês.
“Certamente, caso essa crueldade se concretize, ocasionará um grande impacto negativo nos negócios das MPEs, reduzindo a sua competitividade já tão abalada, bem como desestimulando os seus cotistas e indo totalmente no sentido contrário ao tratamento jurídico diferenciado previsto no Artigo 179 da Constituição Federal. Por ironia, a infeliz ideia de tributar a distribuição dos lucros realizada pelas MPEs, sem a devida contrapartida, e, ainda com a limitação da isenção mensal de R$2.500,00, acabará privilegiando as empresas não optantes do Simples Nacional, o que é um trágico contrassenso em relação ao que determina a nossa carta magna”, finaliza o vice-presidente em notícia divulgada pelo próprio órgão.
Atenção! As empresas do Simples Nacional poderão ser duramente castigadas pela tributação sobre a distribuição dos seus lucros
As reduções propostas pela Reforma Tributária” no IRPJ, sobretudo, aquelas recentemente inseridas no relatório preliminar preparado pelo relator do Projeto de Lei 2.337/21, Deputado Celso Sabino, que propõem a redução da alíquota básica do tributo dos atuais 15% para 5% em 2022, e 2,5% a partir de 2023, não estão sendo estendidas às MPEs optantes pelo Simples Nacional. Este assunto já foi objeto de um artigo específico publicado recentemente, com o intuito de alertar sobre o tema.
Possivelmente, como uma forma de compensar a falta da desoneração parcial no cálculo do Simples Nacional, o governo manteve isenta a distribuição dos lucros feitas por essas empresas até o limite de R$20.000,00, o que não elimina o fato concreto de que haverá, sim, um aumento na carga tributária destas empresas.
Sinal de Alerta!
Contudo, agora temos um fato novo. Em entrevistas promovidas por alguns veículos de comunicação, o relator do PL, Celso Sabino, tem dito que está cogitando a ideia de diminuir a isenção dos lucros pagos aos cotistas das empresas do Simples Nacional dos atuais R$20.000,00 para R$2.500,00, estendendo também a isenção aos cotistas/acionistas de todas as empresas, independentemente do regime tributário adotado.
Se essa pretensão prosperar, será um duro golpe nos micro e pequenos empresários e uma tremenda injustiça a um segmento que constitucionalmente faz jus a um tratamento diferenciado.
Na minha avaliação, é inconcebível as MPEs não usufruírem do benefício na diminuição da sua tributação corporativa prevista na reforma tributária aos outros regimes tributários e ainda terem a distribuição dos seus lucros distribuídos tributados em 20% da mesma forma.
O argumento do governo e de alguns parlamentares que justificam a tributação indiscriminada dos lucros como instrumento de combate a “Pejotização” não procede. Muito pelo contrário, pois as MPEs são as principais empregadoras do país, respondendo por 55% dos empregos formais, representam 99% dos negócios brasileiros e têm participação de 30% no PIB nacional, exercendo um papel importantíssimo no crescimento econômico do Brasil, reconhecido pela própria Secretaria Especial de Produtividade, Emprego e Competitividade do Ministério Economia. Logo, como podem as empresas pertencentes a este respeitável grupo serem confundidas com a figura da “Pejotização”?
As Micro e Pequenas Empresas não têm as mesmas vantagens competitivas quando comparadas às médias e grandes companhias e encontram no Simples Nacional uma forma de atenuar essa desigualdade. Diversos negócios pequenos não seriam viáveis se não existisse a possibilidade de optar pelo regime simplificado. Assim, a desenfreada tributação dos lucros de 20% irá provocar um aumento brutal na carga tributária das MPEs, uma vez que não houve a devida compensação, como foi feita com as empresas do Lucro Presumido e Real que, por sua vez, tiveram uma significativa redução no seu Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
Não há nada de errado em tributar os lucros distribuídos, desde que haja, no mínimo, uma diminuição equivalente no tributo corporativo devido pelas empresas do Simples Nacional, sobretudo quando se pretende diminuir o limite de isenção para R$2.500,00 ao mês.
Certamente, caso essa crueldade se concretize, ocasionará um grande impacto negativo nos negócios das MPEs, reduzindo a sua competitividade já tão abalada, bem como desestimulando os seus cotistas e indo totalmente no sentido contrário ao tratamento jurídico diferenciado previsto no Artigo 179 da Constituição Federal. Por ironia, a infeliz ideia de tributar a distribuição dos lucros realizada pelas MPEs, sem a devida contrapartida, e, ainda com a limitação da isenção mensal de R$2.500,00, acabará privilegiando as empresas não optantes do Simples Nacional, o que é um trágico contrassenso em relação ao que determina a nossa carta magna.
* Wilson Gimenez Junior é empresário contábil e vice-presidente Administrativo da FENACON
Confira a entrevista do SESCAP-LDR e Receita Federal na Folha de Londrina de hoje: Receita Federal muda abordagem de empresas com suspeita de sonegação
Fisco passou a comunicar os contribuintes sobre inconsistências nas informações prestadas, dando-lhes a oportunidade de se regularizarem antes de partir para a fiscalização; Sescap e Receita farão live para explicar mudanças
A Receita Federal está mudando a forma de abordagem de pessoas jurídicas que apresentam alguma irregularidade na declaração do Imposto de Renda. Agora, em vez de partir direto para a fiscalização e multa - que é de no mínimo 75% sobre o valor devido -, o órgão implantou em todo o Brasil programas de conformidade ativa, em que as empresas são antes comunicadas das irregularidades e solicitadas a retificarem a declaração e recolherem os tributos.
"Antes, simplesmente eram abertas as ordens de fiscalização, o fiscal ia no local e, independentemente da situação da empresa, ela era multada. Agora a Receita tem trabalhado com o conceito de conformidade ativa", explica o delegado da Receita Federal em Londrina, Reginaldo Cezar Cardoso. "A Receita avisa as empresas que fez um cruzamento de dados e que houve inconsistência, que há indícios que o recolhimento está errado, e dá a oportunidade para que os contribuintes possam regularizar."
Na região, um dos programas é o Declare Agro, noticiado pela FOLHA em maio. A operação verificou indícios de sonegação de R$ 1,4 bilhão em declarações de produtores rurais em Londrina. "A Receita Federal recebeu dados das empresas compradoras e verificou que alguns produtores não declaravam aquilo que vendiam. Mandamos correspondências, comunicados a esses contribuintes informando que tinha essa incoerência de dados e dando a oportunidade para que eles possam recolher os tributos, alterar as declarações sem a multa, que é de, no mínimo, 75%."
Além deste, a Receita Federal operacionaliza na região mais três programas. Um deles tem foco em empresas que não repassam à RF o Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), outro em empresas que informam atividade zerada na ECF (Escrituração Contábil Fiscal), mas apresentam movimentação de recursos financeiros. O último é voltado a empresas com inconsistências nas informações do recolhimento do PIS/Cofins. Segundo o delegado da RF, milhares de contribuintes são beneficiados por estes programas.
Nem todos aqueles que estão em falta com a Receita Federal agem de má-fé, diz o delegado: na verdade, 90% dos contribuintes querem pagar os tributos, seja por medo da fiscalização ou por obrigação cívica. "Para esses contribuintes, o papel do fisco é facilitar, ajudá-los a fazer o cálculo e recolhimento do tributo. Nesse sentido que vem a conformidade ativa."
"Isso é uma evolução da diretriz da receita. O contribuinte ganha porque não paga multa, e a Receita e o governo ganham também porque recursos valiosos que utilizaria fazendo fiscalizações estão sendo empregados no combate à fraude, lavagem de dinheiro, e aumenta a arrecadação sem a necessidade de procedimentos de fiscalização", ele continua.
A comunicação chega através do e-cac (Centro Virtual de Atendimento da RF) e, em alguns casos, através de correspondência. A Receita Federal em Londrina também firmou parceria com o Sescap-LDR (Sindicato das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações, Pesquisas e de Serviços Contábeis de Londrina e Região) para que os contadores, ao receberem o alerta da Receita, avisem e orientem os seus clientes.
"Na Pessoa Física, no ato da entrega da declaração, você já verifica se existe alguma inconsistência com os dados. Na jurídica, isso não existia", avalia o 1º vice-presidente do SESCAP-LDR , Euclides Nandes Correia. "Vemos como positivo a RF possibilitar que as empresas possam verificar se têm inconsistências e fazer a correção antes de serem intimadas para uma fiscalização."
Já na intimação, a empresa perde benefícios, como multas reduzidas. Após a fiscalização, a multa pode chegar a 150%, se houver dolo. Na autorregularização, a multa cai para 20%.
De acordo com o vice-presidente do SESCAP-LDR, informar movimentação financeira diferente do que foi efetivamente movimentado nas contas bancárias, e não recolher o Imposto de Renda Retido na Fonte descontado dos funcionários na folha de pagamento estão entre os erros mais comuns cometidos pelos contribuintes pessoas jurídicas, sendo que o último é considerado crime. "É apropriação indébita", alerta Correia.
Reforma tributária como está não traz benefícios ao Brasil, diz Marcos Cintra
Em entrevista à Jovem Pan, ex-secretário da Receita afirma que taxação de dividendos afasta investidores e prejudica a competitividade; apesar de críticas, economista diz que texto do Congresso corrige erros da versão original
A nova versão da reforma tributária apresentada pelo deputado Celso Sabino (PSDB-PA), relator do projeto na Câmara dos Deputados, não traz benefícios para a economia brasileira, afirmou o economista e ex-secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra. Pelo contrário, a manutenção da taxação de 20% sobre os dividendos — conforme proposto pelo Ministério da Economia — arrisca prejudicar a competitividade do país, afastar os investidores internacionais e desestimular a produção interna. “Nós estaremos introduzindo uma distorção no sistema econômico. A sistemática brasileira era mais eficiente”, disse em entrevista à Jovem Pan. As mudanças no Imposto de Renda para Pessoas Físicas (IRPF), outro ponto mantido pelo deputado que já constava no original, também é classificado como um equívoco. “A essência do projeto são dois: tributar dividendos e corrigir a tabela [do Imposto de Renda]. Acredito que esses dois objetivos, da forma como estão sendo feitos, precisam de uma avaliação melhor.” Apesar das críticas, o antigo auxiliar de Paulo Guedes afirma que o texto modelado por Sabino corrige erros da proposta original desenhada pela equipe econômica. “Ele [o relator] fez uma faxina de coisas desnecessárias e polêmicas que não deveriam estar lá. Fez uma revisão grande de uma possível elevação da carga tributária”, disse o economista.
As restrições de Cintra não se limitam a formatação do texto. Para o ex-secretário, o governo não trabalha a reforma tributária de um jeito amplo e não sabe onde quer chegar com as mudanças. “O governo está discutindo a reforma tributária de uma forma fragmentada. Ninguém tem uma visão do conjunto, e isso está errado”, diz. A solução seria engavetar o que foi feito até agora e recomeçar as discussões com a formação de uma comissão especial. Segundo Cintra, em aproximadamente três meses, esse “grupo de notáveis” conseguiria apresentar propostas mais adequadas. “Assim, iniciaríamos um debate amplo para fazer uma verdade reforma tributária. Isso que está sendo feito são correções parciais e isoladas que vão criar mais problemas que soluções.” A origem dos principais erros foi concentrar as mudanças na Receita Federal, avalia o ex-responsável pela área, o que levou a uma mudança liderada pela “burocracia arrecadatória”. “Na questão tributária, a Receita assumiu um papel que não cabe a ela”, afirmou. Confira abaixo os principais trechos da entrevista com Marcos Cintra:
Qual a análise que o senhor faz do texto preliminar? O primeiro estava enviesado de detalhes operacionais, de restrições a atividades e a tributação de empresas, e isso foi sanado no relatório do deputado Sabino. De certa forma, houve uma melhora. Mas os principais pontos do projeto ainda continuam lá, que é a tributação de dividendos e a questão de Juros sobre Capital Próprio, e a correção da tabela da pessoa física. Nesses dois itens, que são fundamentais do projeto, ainda existem falhas técnicas gritantes que vão precisar ser corrigidas, além de algum debate sobre a essência das medidas. A tributação de dividendos é muito polêmica e acho que não deveria ser mexida frente ao quadro atual que nós temos.
O texto do relator corrige os erros que o ministro cometeu na proposta encaminhada ao Congresso? Ele corrige vários erros. Todos aqueles penduricalhos que a Receita aproveitou o momento para enfiar nesse projeto, pleitos que estavam sendo feitos há muito tempo, sem sucesso, o deputado retirou. A essência do projeto são dois: tributar dividendos e corrigir a tabela [do Imposto de Renda]. Acredito que esses dois objetivos, da forma que estão sendo feitos, precisam de uma melhor avaliação. O que eu tenho sugerido é que o governo faça o que qualquer país, e que o Brasil, sempre fez: uma reforma tributária tem que ser ampla, integrada, que considere todos os impostos. É um sistema com partes comunicantes. A gente mexe em um pedaço, atrapalha outro, então é preciso ter uma visão global. Para elaborar um projeto como esse, deveria ser criada uma comissão de especialistas independentes, que não representem nenhum setor. Essa seria uma solução de bom senso. Paralisar o processo, criar uma comissão independente de pessoas notáveis e respeitadas, que em um prazo de três meses apresentem um projeto. Assim iniciaríamos um debate amplo para fazer uma verdadeira reforma tributária. Isso tudo que está sendo feito são correções parciais, isoladas e que vão criar mais problemas do que soluções.
As mudanças atendem às demandas dos empresários? Sim. O relatório melhorou o projeto. Fez uma faxina de coisas desnecessárias e polêmicas que não deveriam estar lá. Fez uma revisão muito grande de uma possível elevação de carga tributária. O projeto melhorou muito, mas ainda existem dois erros técnicos fundamentais que é a forma de correção da tabela do Imposto de Renda para Pessoas Físicas e a questão da tributação de dividendos e dos Juros sobre Capital Próprio.
A reforma tributária incluindo a taxação de dividendos não traz benefícios para a economia do país? Nenhuma. O próprio governo está cedendo para compensar o aumento da distribuição. Já se fala em reduzir 12,5 pontos percentuais a tributação do Imposto de Renda para Pessoas Jurídicas. O governo está tirando de um lado e dando de outro. A tributação vai ficar, eventualmente, a mesma. Mas está errado, porque existe uma distorção. Quando o lucro é gerado, ele tem duas destinações. Primeiro ele é tributado na geração, depois ele pode ser retido ou distribuído. Nós estaremos introduzindo uma distorção no sistema econômico. A sistemática brasileira era mais eficiente.
O que faltou na reforma? Faltou tudo. Reforma tributária tem que ser uma reforma sistêmica. No Brasil, a última comissão de alto nível criada para elaborar um projeto de reforma tributária foi em 1992, mas que não teve continuidade a partir do impeachment do presidente Collor. De lá para cá, nenhuma comissão de alto nível foi criada. É disso que nós precisamos agora, afinal de contas, o momento é inoportuno para uma alteração mais drástica do sistema tributário. Estamos tentando sair de uma pandemia e, nesse ínterim, poderíamos pensar em uma reforma tributária global, abrangente, feita por técnicos independente e sem interesses específicos para defender qualquer setor.
A reforma diminui ou aumenta a carga tributária? Essa é uma pergunta que nós não deveríamos estar discutindo. Seria obrigação do governo e da Receita Federal apresentar à sociedade números e planilhas abertas. Até hoje nós fomos apresentados com números que não encontram justificativas em qualquer relatório mais denso e tecnicamente justificável. O governo está pecando por falta de transparência nos debates, os números são apresentados de maneira muito superficial.
O fatiamento em etapas foi uma boa saída? É como escrever um livro. É preciso ter noção do que se quer escrever e depois fazer capítulo por capítulo. É preciso ter uma diretriz geral. Nós não sabemos onde o governo quer chegar com a tributação da Pessoa Física, com a Jurídica, com a questão da tributação do consumo, com a tributação do PIS/Cofins. Estamos, simplesmente, andando no escuro. É preciso ter uma visão do conjunto. Nada contra se fazer etapa por etapa, mas desde que seja dentro de uma visão planejada, coerente e consistente, e não da forma caótica como está sendo feito. É como um caleidoscópio onde as coisas vão caindo dependendo de como se vira o objeto. É uma reforma tributária que vai trazer muitas distorções no nosso sistema, piorar o que é menos ruim e introduzir muitos erros no que está funcionando bem.
E o governo sabe para onde quer ir? Não. O governo está pensando de maneira muito fragmentada, está olhando problemas específicos para resolver problemas pontuais e atender demandas políticas e imediatas, mas não está analisando o sistema tributário como um todo, que é o que um governo eficiente deveria estar fazendo.
A reforma vai de encontro com o que havia sido discutido pela equipe econômica no início do governo? A reforma tributária foi controlada pela corporação da Receita Federal. Eu tenho o maior respeito por eles, são profissionais competentes, mas não são formuladores de política econômica, eles são arrecadadores de impostos, entendem da sistemática de funcionamento de empresas, contabilidade empresarial. Montar a política tributária não é a função da Receita. Na questão tributária, a Receita assumiu um papel que não cabe a ela. Evidentemente, o ministro permitiu que isso acontecesse, e nisso está a fonte de alguns dos mais importantes erros que estão sendo cometidos.
Imposto para média e grande empresa subiria 27% após mudança, diz entidade
As alterações feitas pelo deputado Celso Sabino (PSDB-PA) no projeto de reforma do IR (Imposto de Renda) não foram suficientes para eliminar o aumento de impostos para médias e grandes empresas, de acordo com o IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação). Cálculos da entidade apontam que, mesmo com as mudanças, a carga de impostos vai subir até 27% para estas empresas em 2023. Antes das alterações, com o projeto apresentado pelo governo federal, as estimativas do instituto apontavam para aumento de até 72%.
Por um lado, o projeto reduz em 12,5 pontos percentuais a alíquota do IR para empresas (pessoas jurídicas). Por outro, institui a cobrança de 20% de imposto sobre lucros e dividendos, que hoje são isentos. O governo diz que não é possível comparar as duas coisas, já que um imposto recai sobre pessoas jurídicas e o outro, sobre pessoas físicas. Mas, segundo o IBPT, a redução não compensa a nova tributação, e quem pagará a conta, no fim, serão as empresas.
O que muda
Hoje, a tributação das empresas ocorre da seguinte forma:
- 25% de IR
- 9% de CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido)
- Isenção de imposto para lucros e dividendos
Pela proposta inicial do governo, a redução no IR seria de cinco pontos percentuais. A versão atualizada, com as alterações do relator, promove uma diminuição maior. Em 2022, o IRPJ passaria de 25% para 15%. Ao final, em 2023, o resultado seria o seguinte:
- 12,5% de IR
- 9% de CSLL
- 20% de tributação sobre lucros e dividendos, com isenção para lucros de até R$ 20 mil por mês
Aumento de até 27% em 2023
Os novos cálculos do IBPT consideraram três tipos diferentes de empresas. No primeiro conjunto, das que fazem a declaração do IR com lucro real e Juros sobre Capital Próprio, o instituto considerou uma empresa de revenda de mercadorias com patrimônio líquido de R$ 7,2 milhões. Com a reforma, haveria 30,33% de aumento na tributação em 2022 e 19,63% em 2023.
Outras duas simulações foram feitas para empresas que declaram o IR com o sistema de lucro presumido, uma forma simplificada. No primeiro cálculo, considerou-se uma empresa do setor de serviços com faturamento de R$ 1 milhão. Na comparação com as regras atuais, os impostos subiriam 32,92% em 2022 e 26,69% em 2023.
Por que a carga tributária aumentaria
Gilberto Luiz do Amaral, presidente do Conselho Superior do IBPT, afirma que continua havendo aumento nos impostos porque a alíquota estabelecida para a tributação sobre lucros e dividendos é muito alta. Segundo ele, para que a reforma fosse de fato neutra, o percentual deveria variar e ter um teto menor.
O ideal seria que a alíquota fosse progressiva, de acordo com o valor dos lucros. Entendemos que a faixa de isenção [para os dividendos] deveria ir de R$ 20 mil para R$ 50 mil, com a tributação começando em 5% e chegando, no máximo, a 15%.
Gilberto Luiz do Amaral
Entidades dizem que IR de empresas baixou demais
Mauro Silva, presidente da Unafisco (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil) Nacional, afirma que a diminuição das alíquotas para as empresas no relatório da Câmara foi resultado de um acordo político para viabilizar o projeto. Mas, segundo ele, a alteração vai na contramão de outros países do mundo, que estão aumentando a carga de impostos sobre empresas.
O que se orienta, em termos de justiça fiscal, é que a gente tribute mais a renda. Mas eu entendo que, mesmo assim, o projeto traz avanços. A tributação de lucros e dividendos é positiva.
Mauro Silva
Em nota, o Sindifisco (Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil) afirmou que o relatório tirou "parte importante das qualidades" do texto original do governo. Segundo a entidade, a redução "brusca" do IRPJ compromete um dos objetivos centrais da reforma, "a busca por maior progressividade no sistema tributário".
Prejuízo a estados e municípios
Os secretários estaduais de Fazenda, por meio do Comsefaz (Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda dos Estados), também criticaram as alterações feitas no relatório. Segundo a entidade, as mudanças sabotam o pacto federativo, porque o custo da redução do imposto recairá sobre estados e municípios.
Juciléia Lima, conselheira do Carf (Conselho de Administração de Recursos Fiscais) e professora de direito tributário da Universidade Presbiteriana Mackenzie, afirma que a União é obrigada a repartir o valor arrecadado em impostos com estados e municípios, mas não existe essa obrigatoriedade quando se trata de outro tipo de tributo, as contribuições.
Por isso, segundo ela, um caminho mais adequado para reduzir tributos para empresas seria diminuir a alíquota da CSLL, uma contribuição, mantendo uma parte maior da arrecadação com o IRPJ, um imposto.
[O texto] é muito ruim, porque estados e municípios são os entes com que nós temos contato, que estão próximos de nós e oferecem serviços públicos. A ideia é tirar exatamente de onde a população mais precisa.
Juciléia Lima
Governo defendia não subir carga tributária
Procurado pelo UOL, o Ministério da Economia afirmou que está revisando o substitutivo apresentado pelo relator.
No início de julho, a pasta havia afirmado que a reforma foi idealizada com a diretriz de não elevar a carga tributária e de não comprometer as metas de resultado do governo. Disse, ainda, que não é possível fazer uma equivalência entre a cobrança do IR sobre pessoas jurídicas e a taxação de dividendos, já que "são tributações distintas sobre pessoas diferentes [física e jurídica]".
A reportagem também procurou o deputado Celso Sabino, mas não obteve resposta.
Estados chamam novo texto da reforma tributária de atentado e o rejeitam integralmente
A oposição dos estados é mais um capítulo das dificuldades do governo
Por Fábio Pupo/Folhapress
O comitê de secretários estaduais de Fazenda considerou a nova versão da reforma no Imposto de Renda um “atentado” contra as contas públicas por retirar R$ 27,4 bilhões em receitas dos governos regionais. Em carta, eles rejeitaram integralmente a proposta.
A oposição coloca em xeque a tentativa elaborada pelo ministro Paulo Guedes (Economia) em parceria com o relator, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), de aprovar as novas regras neste ano para que elas comecem a valer em 2022.
O Comsefaz (Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal) afirma que o buraco nas contas públicas será observado quase integralmente nos números de estados e municípios.
De acordo com a entidade, a perda devido ao menor recolhimento de receitas a serem obtidas com o Imposto de Renda. A Constituição determina que parte dessa arrecadação, feita pela União, seja repassada aos entes.
A proposta de Sabino corta em R$ 98 bilhões ao ano a cobrança no IRPJ (Imposto de Renda de Pessoa Jurídica). As medidas compensatórias são feitas por meio de tributos que ficam com a União e não são repartidos com os entes subnacionais.
“O relatório atenta contra o equilíbrio fiscal da União, estados e munícipios, que vêm lutando para equalizar suas contas desde a crise de 2015 e que foi agravada pela pandemia que se iniciou no ano passado, sem um horizonte concreto de desfecho”, afirma carta assinada por Rafael Fonteles, presidente do Comsefaz.
“A técnica inepta é agravada pelo desconhecimento da existência de um pacto federativo na Constituição do país, dado o flagrante atentado a este, ao se propor que mais de 95% do desequilíbrio fiscal pretendido pelo substitutivo seja quase que inteiramente suportado pelos entes subnacionais”, afirma.
Para os estados, a proposta caminha em sentido contrário a todas as recomendações internacionais que endossam a progressividade dos tributos. “Postulamos a rejeição integral do substitutivo”, afirma o texto.
De acordo com o Comsefaz, houve maioria entre os secretários para a publicação da carta. Não houve votos contrários e nem todos se manifestaram até agora, mas a previsão da presidência é que haja unanimidade.
Cristiane Alkmin, secretária de Fazenda de Goiás, afirma que a proposta deveria trazer uma compensação para estados e municípios — o que não foi previsto no texto. “Os estados e municípios estão fazendo uma reclamação muito genuína. Eles têm uma programação orçamentária e financeira de acordo com o que arrecadam e também com os repasses [que recebem]”, disse à Folha.
“Na hora que agente modifica essa base tributária, a gente tem que pensar em compensações”, afirmou. Segundo ela, o interesse original dos estados é buscar uma reforma tributária ampla que gere uma fusão de impostos que inclua o estadual ICMS e o municipal ISS.
A oposição dos estados é mais um capítulo das dificuldades do governo em implementar a reforma no Imposto de Renda.
Guedes enviou ao Congresso em 25 de junho uma primeira proposta atacada por empresários, que enxergaram aumento da carga. Nesta semana, após reuniões com o relator, foi apresentada a nova versão, que corta drasticamente o imposto para empresas, mas deixa um buraco de R$ 30 bilhões nas contas públicas.
O governo tem pressa para que o projeto seja aprovado ainda neste ano, para valer no ano que vem e para gerar respaldo jurídico para turbinar em R$ 20 bilhões o Bolsa Família em ano eleitoral (graças às medidas de aumento de arrecadação dentro da proposta).
Preço de até 8 mil remédios pode subir para bancar corte de imposto a empresas
Vários dos medicamentos que seriam afetados são muito comuns, como a Azitromicina (antibiótico), a Nimesulida (anti-inflamatório) e o Fluconazol (fungicida)
A nova proposta de mudança do Imposto de Renda pode aumentar o preço de uma série de medicamentos. O alerta foi feito pela indústria farmacêutica que diz que esse seria o efeito do fim da desoneração concedida a cerca de 8.000 princípios ativos que atualmente são isentos do pagamento de PIS/Cofins. O fim do benefício faria o setor voltar a pagar a alíquota de 12%, o que deve ser repassado ao preço ao consumidor final e ao próprio setor público.
Vários dos medicamentos que seriam afetados são muito comuns nas farmácias, como a Azitromicina (antibiótico), a Nimesulida (anti-inflamatório) e o Fluconazol (fungicida), além dos medicamentos que o próprio setor público compra.
Ontem, o deputado Celso Sabino (PSDB-PA) apresentou um substitutivo ao trecho da reforma tributária que muda regras para o imposto de renda. A nova proposta prevê redução pela metade do tributo pago pelas empresas – o que vai aliviar as pessoas jurídicas do pagamento de R$ 172 bilhões em imposto de renda nos anos de 2022 e 2023.
Diante dessa queda da arrecadação, o relator sugeriu uma série de compensações. Entre as medidas, está o fim da isenção de PIS/Cofins concedida a parte da indústria farmacêutica, química, de higiene e perfumaria. Cálculo apresentado pelo deputado indica que o fim da isenção desses setores pode arrecadar quase R$ 33 bilhões em dois anos.
“Não fomos consultados sobre essa medida que geraria um impacto grande e imediato”, diz o presidente do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos/ (Sindusfarma), Nelson Mussolini. O representante do setor diz que o fim da isenção tem um “grande agravante”. “A lei que define os preços de medicamentos prevê que qualquer redução ou aumento da carga tributária é repassado ao preço do produto”, diz.
Esse mecanismo criado em lei de 2003 prevê que a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos deve “assegurar o efetivo repasse aos preços dos medicamentos de qualquer alteração de carga tributária”. A Câmara atualiza preços de remédios anualmente, mas Mussolini diz que, no caso dos impostos, o repasse pode ser imediato. Ele explica que seria o PIS/Cofins seria cobrado imediatamente das farmacêuticas antes de qualquer alívio financeiro das empresas que passariam a pagar menos imposto de renda nos meses e trimestres seguintes.
Diante do alerta do setor, o relator Celso Sabino explicou à CNN que espera que a Câmara de Regulação também considere a esperada melhora da saúde financeira das empresas. “Esse comitê também deve levar em consideração também que estamos retirando 12,5 pontos percentuais da carga tributária, o que vai gerar benefícios para todos do setor, como fornecedores e clientes”.
O Impacto da “Reforma Tributária” nas empresas do Lucro Presumido e do Lucro Real, por Wilson Gimenez
Por Wilson Gimenez Junior, vice-presidente Administrativo da FENACON
Em 25/06/2021 o Ministério da Economia apresentou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei 2.337/21, que trata da 2ª fase da reforma tributária. Ao contrário da 1ª Fase, que propôs a substituição dos tributos indiretos PIS e COFINS pela Contribuição de Bens e Serviços (CBS) com alíquota de 12% e possibilidade de um tímido crédito sobre os insumos, o atual PL tem na sua essência o objetivo de transformar drasticamente o Imposto de Renda para as Pessoas Físicas, Empresas e Investimentos.
Neste artigo vamos abordar de forma prática quais serão os principais impactos decorrentes das mudanças propostas, destacando os principais pontos positivos e negativos que afligem as empresas do Lucro Real e Presumido.
Imposto de Renda Pessoa Jurídica e Imposto de Renda sobre dividendos
O PL ressuscita a tributação dos lucros e dividendos através de uma alíquota de 20%, o que não é algo novo, pois essa taxação já existia no Brasil até 1995, quando, porém, o percentual era de 15%. No meu entendimento não há nada de errado em tributar os lucros ou dividendos, desde que haja uma compensação justa e equânime através da diminuição dos tributos corporativos.
Todavia, como moeda de troca, o governo ofereceu uma homeopática diminuição gradual na alíquota básica do Imposto de Renda sobre o lucro das empresas (IRPJ) de 15% para 12,5% em 2022, e que culminará em 10% em 2023. Entretanto, são mantidas intactas as regras do adicional do IRPJ, ou seja, o seu percentual de 10% e o limite anual de R$240mil (congelado há 26 anos) para o disparo do seu gatilho permanecem inalterados.
Considerando o exemplo de uma empresa com lucro de R$10milhões, o cálculo do adicional de IRPJ seria: (R$10milhões — R$240mil) = R$9.76milhões x 10% = R$976mil, que equivaleria a 9,76%.
Em termos práticos, como o lucro anual da maioria das médias e grandes empresas é bem superior a R$240mil, esse redutor é praticamente inócuo, o que faz com que a taxação do adicional de IRPJ seja recorrentemente próxima de 10%. Assim, a alíquota total do IRPJ destas empresas diminuiria de 25% (15% IRPJ + 10% Adicional de IRPJ) para 20% em 2023 (10% IRPJ + 10% Adicional de IRPJ).
Não obstante, as contas não param por aí, pois, sobre o lucro das empresas, ainda deve ser acrescentado o cálculo a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), cuja alíquota básica é de 9%, e de 20% para os Bancos.
Resumindo, o total dos tributos diretos IRPJ e CSLL passariam dos atuais 34% para 29% em 2013, e, no caso dos bancos, de 54% para 49%. Contudo, quando colocamos na balança a tributação de 20% dos dividendos, inferimos que a troca não foi nada justa, conforme o exemplo a seguir (considerando que 100% dos lucros foram distribuídos e não levando em conta o caso dos bancos) que adota a mesma premissa de uma empresa com lucro real anual de R$10milhões:
Esse breve cálculo demonstra claramente que no exemplo mencionado, haverá um incremento na tributação geral de R$1.120.000,00 em 2022 e R$920.000,00 em 2023, ou seja, uma majoração tributária geral de 32,94% e de 27,06%, respectivamente, o que não confirma o discurso do governo de que haveria uma contrapartida justa entre a redução do IRPJ e a volta da taxação dos dividendos.
Outra questão controversa sobre a tributação dos dividendos gira em torno do início e da forma de sua incidência. O PL menciona que os lucros serão tributados em 20% a partir de 1º janeiro de 2022 indiscriminadamente, o que fere o princípio da anterioridade, cuja regra determina que lucros auferidos em períodos anteriores a 2022 não poderiam ser objeto de tributação.
Para ilustrar esse entendimento, em 1996, quando os lucros e dividendos deixaram de ser tributados, o princípio da anterioridade foi respeitado, como pode ser observado na descrição padrão impressa nos informes de rendimentos que recebemos das empresas, cujo texto menciona o seguinte: “Lucros e dividendos, apurados a partir de 1996, pagos por pessoa jurídica (lucro real, presumido ou arbitrado).
Seguramente, se a tributação dos dividendos avançar da forma proposta, haverá um aumento enorme no contencioso tributário, no qual os contribuintes que se sentirem prejudicados procurarão a justiça na defesa de seus direitos. O que vai na contramão da simplificação e desjudicialização pretendida pelo governo.
Juros sobre Capital Próprio
No seu artigo 2º, o PL 2.337/21 propõe a eliminação da dedutibilidade dos Juros sobre Capital Próprio (JCP), que funciona como uma espécie de redutor do lucro tributável das empresas do Lucro Real que o adotam, pois é alocado como uma despesa financeira. Deste modo, a indedutibilidade do JCP impacta negativamente no lucro líquido das empresas, sobretudo daquelas de grande porte, que utilizam recorrentemente o JCP como um instrumento econômico-tributário para maximizar os seus lucros e remunerar os seus acionistas.
Entretanto, como vimos no tópico anterior, a reforma tributária também determina a redução do IRPJ em 5 pontos percentuais para o ano de 2023, o que nos induz a fazer uma outra avaliação a fim de verificar se essa compensação foi justa.
Para tal análise, nos baseamos num estudo realizado pela XP Investimento, publicado em 29/06/2021, que teve como premissa os resultados das empresas listadas em bolsa que estão sob sua cobertura nos anos de 2019 e 2020.
O referido estudo apontou que na maioria dos casos o impacto é nocivo, pois algumas empresas teriam os seus lucros afetados negativamente em mais de 10%, ao passo que pouquíssimas empresas seriam beneficiadas com esse “trade-off”.
Aliado aos argumentos apresentados, também gostaríamos de ressaltar que, para manter o mesmo nível de lucratividade, as empresas que usufruem atualmente do mecanismo do JCP poderão forçosamente substituir esse instrumento por algum tipo de alavancagem mesmo sem ter essa necessidade, buscando crédito junto a instituições financeiras, uma vez que os encargos financeiros dos empréstimos são dedutíveis, o que, em tese, neutralizaria a indedutibilidade do JCP. Porém, essa alternativa pode trazer mais riscos desnecessários às empresas, não sendo benéfica para o mercado em geral.
Assim, também nessa temática não enxergamos uma troca justa entre a diminuição do IRPJ e a eliminação de dedutibilidade do JCP, o que contraria a alegação do governo de que não haveria perdas e/ou aumento da carga tributária para as empresas.
Administração de Imóveis Próprios e as Sociedades em Conta de Participação
A reforma tributária também traz no seu bojo uma outra crueldade, pois impede que as empresas com atividades de exploração de direito de imagem, royalties (exceto software) e administração de imóveis próprios (quando estas receitas representarem mais de 50% do faturamento total) adotem obrigatoriamente regime tributário do lucro real.
É notório que muitas empresas atuantes nestes segmentos são atualmente optantes pelo lucro presumido, sobretudo aquelas que possuem receita oriunda de locação, compra e venda de imóveis. Tal atividade tem sido a mola propulsora da retomada do crescimento econômico nesse momento de pandemia e a viabilidade dos seus modelos de negócios foi concebida com base na possibilidade lícita da opção pelo regime tributário do lucro presumido. Essa mudança abrupta da regra do jogo fará com que essas empresas tenham uma enorme queda da sua lucratividade e coloque em xeque a sua configuração.
E tem mais…
Muitas empresas no segmento imobiliário firmam parcerias por intermédio de Sociedades em Conta de Participação (SCP) como forma de atuarem em projetos imobiliários específicos. Geralmente, essas empresas figuram na qualidade de sócia ostensiva destas SCPs. Neste contexto, o PL 2.337/21 obriga que a SCP adote o mesmo regime tributário do seu sócio ostensivo, o que compulsoriamente será o Lucro Real, impedindo-a de utilizar as alíquotas de presunção de lucro presentes no regime do lucro presumido. Deste modo, estas SCPs, que incorrem em pouquíssimos custos, terão enormes perdas tributárias ao se submeterem ao Lucro Real.
Portanto, se esse tópico do PL prosperar, certamente o mercado imobiliário será drasticamente abalado e buscará um ajuste, cuja consequência recairá sobre os consumidores, que terão o custo de aquisição e locação de imóveis majorado drasticamente. Essa medida, conjugada com a aprovação da primeira fase da reforma tributária que tratou da CBS, resultará numa carga tributária para o setor de mais de 50%, ou seja, um confisco explícito.
Pontos Positivos
O PL da reforma tributária traz alguns pontos interessantes para as empresas optantes do Lucro Presumido e Lucro Real, cujo intuito vai no caminho da facilitação e otimização das obrigações tributárias.
O primeiro ponto a ser destacado é a transformação do Lucro Real Anual em exclusivamente trimestral, com a possibilidade de compensação integral de prejuízos entre os trimestres do ano. Esse tópico da reforma tributária proposta é extremamente benéfico, pois atenua muito a complexidade e a excessiva tempestividade existente na apuração do lucro real com base nos balancetes mensais de redução ou suspensão.
Outro ponto muito bem-vindo foi a uniformização da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, eliminando as diferenças e peculiaridades entre as duas apurações, evitando confusões e diminuindo os custos de conformidade.
Também devemos aplaudir o reconhecimento por parte da Receita Federal que versa sobre a importância da contabilidade, tornando-a obrigatória para fins fiscais no lucro presumido ao mesmo tempo que será indispensável no Simples Nacional para comprovação do respectivo resultado contábil e, ainda, evidenciar de que não foi praticada nenhuma distribuição disfarçada de lucros. A adoção da contabilidade pelo fisco como meio fiscalizatório imprescindível nas empresas optantes pelos regimes tributários mais simplificados motivará cada vez mais que Micro e Pequenas Empresas também a utilizem como instrumento de gestão, o que auxiliará muito os dirigentes na tomada de suas decisões.
Considerações Finais
O carro-chefe da reforma tributária proposta pelo governo tem como protagonistas a tímida diminuição do IRPJ básico de 15% para 10% em 2023 e o irrisório aumento de 31% na tabela progressiva mensal do imposto de renda na fonte, cuja defasagem atingiu 113,09% segundo o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (SINDIFISCO).
Contudo, esses pontos positivos são totalmente ofuscados quando comparados com os aspectos negativos abordados neste artigo, como a tributação de 20% dos dividendos, eliminação dos Juros sobre Capital Próprio (JCP) e obrigatoriedade do Lucro Real para empresas do setor imobiliário.
A oneração trazida pelas questões apontadas é bem superior às pequenas desonerações propostas, causando uma enorme desvantagem para o contribuinte, não estando em linha com as promessas do governo de que a reforma tributária não provocaria aumento de impostos.
Na minha avaliação, antes de qualquer discussão sobre reforma tributária, deveria ser promovida uma ampla e austera reforma administrativa, impondo-se rigorosos ajustes nos gastos governamentais com o objetivo de equilibrar as contas públicas. Só então, se cogitaria algo em termos de ajuste na nossa carga tributária, cuja grau foi auferido pela própria Receita Federal em 2018 e que atingiu a marca de 32,7%, revelando que é muito mais elevada do que outros países emergentes como Chile (26,3%), Colômbia (22,3%), China (26,3%), Índia (12,5%) e Coreia do Sul (26,8%), conforme pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Economia da FGV em publicação na Folha de São Paulo em 21/02/2021.
Portanto, diante do exposto, da forma proposta a “reforma tributária” não passa de mais uma tentativa de aumentar a carga tributária dos contribuintes Brasileiros, já tão elevada quando comparada com seus pares.14