Microsoft revela brecha de segurança no Windows e lança atualização de emergência

Para resolver parte do problema, a empresa pede aos usuários do sistema operacional que façam imediatamente uma atualização

(crédito: MARTIN BUREAU)
A Microsoft liberou na terça-feira, 6, um patch de emergência para corrigir uma grave falha de segurança no Windows, conhecida como "PrintNightmare". Para resolver parte do problema, a empresa pede aos usuários do sistema operacional que façam imediatamente uma atualização.
Essa falha, que pode ser traduzida como "pesadelo da impressão", afeta o serviço Windows Print Spooler, que faz a comunicação do computador com as impressoras. De acordo com a Microsoft, essa falha deixa o sistema vulnerável a hackers, que podem controlar o PC ao instalar programas, visualizar e excluir dados ou criar novas contas com direitos de usuário.
A falha foi divulgada semana passada e acabou agravada quando pesquisadores da empresa de segurança cibernética Sangfor Technologies acidentalmente publicaram a prova de conceito (PoC) relacionada à vulnerabilidade, achando que ela já havia sido resolvida. Apesar de excluírem imediatamente o código ao perceberem o engano, cópias acabaram sendo distribuídas online, aumentando o risco de uso mal-intencionado.
O Microsoft Security Response Center anunciou formas de soluções para os dois CVEs (em inglês, Vulnerabilidades e Exposições Comuns) que afetam o sistema de comunicação de impressoras, o CVE-2021-34527 e o CVE-2021-1675, com a atualização de terça-feira.
Em seu site oficial, a Microsoft recomenda que os usuários instalem a atualização imediatamente. "As atualizações de segurança lançadas em e depois de 6 de julho de 2021 contêm proteções para a CVE-2021-1675 e a exploração de execução remota de código adicional no serviço Windows Print Spooler conhecido como 'PrintNightmare', documentado como CVE-2021-34527", diz.
A empresa está disponibilizando patches para o Windows Server 2019, Windows Server 2012 R2, Windows Server 2008, Windows 8.1, algumas versões do Windows 10 e até mesmo para o Windows 7, que perdeu suporte oficialmente.
O Windows Server 2012, Windows Server 2016 e Windows 10 Versão 1607 ainda não receberam patches para resolver esse problema, mas a Microsoft anunciou que essas versões também receberão atualizações de segurança em breve.

Proposta de reforma tributária: a grande surpresa é que não há reforma

Por Elidie Palma Bifano

O atual governo, como todos os que o antecederam após a Constituição Federal de 1988, comprometeu-se com a reforma tributária. Ninguém ousaria discordar da necessidade de serem feitas reformas importantes no sistema tributário brasileiro buscando aperfeiçoar institutos, revisitando os diversos tributos para adequar os critérios de cálculo e o âmbito de incidência aos novos negócios e tecnologias, bem como sistematizar a infinidade de normas menores que cada uma dessas exações carrega.

Cumprindo essas promessas, o Ministro da Economia acaba de apresentar ao Congresso Nacional proposta que tem por objetivo reformar o sistema tributário, especificamente no que diz respeito ao pagamento do Imposto sobre a Renda de pessoas jurídicas (IRPJ) e de pessoas físicas (IRPF), bem como à Contribuição social sobre o lucro líquido (CSL),  devida por pessoas jurídicas. Diga-se que a divulgação dessa proposta era ansiosamente esperada por seus destinatários: no caso das pessoas jurídicas, por conta das dificuldades que vêm passando neste momento de crise econômica gerada pela pandemia de coronavírus e, no caso das pessoas físicas pela esperança de, reduzindo-se o tributo retido na fonte, cujas deduções e faixas de incidência estão sem atualização desde 2015[1], aumentar suas parcas disponibilidades. Esta é a segunda etapa cumprida no sentido de reformar o sistema tributário nacional, por parte do governo, sendo a primeira a proposta de criação da Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), conforme Projeto de Lei nº 3.887/2020.[2]

No dia 25/06/2021, a Exposição de Motivos nº 00158/2021 acompanhou Projeto de Lei levado ao Congresso, onde ganhou identidade como PL n. 2337/2021. É importante destacar que a Exposição de Motivos, em seu primeiro parágrafo, enfatiza que esse projeto modifica a legislação do IR e da CSL, com o objetivo de modernizá-la, sendo que o IR é alterado tanto em relação à pessoa jurídica quanto à física. Esses dois tributos respondem por parcela substancial da arrecadação no país, assim afetando de forma importante o ambiente econômico nacional.

A simples leitura da Exposição de Motivos é decepcionante e já permite sustentar o título deste pequeno comentário: nada de novo pode o contribuinte dela esperar senão o aumento de tributos, a revogação infundada de práticas consolidadas, o desestímulo ao investimento, a criação de restrições à dedução de despesas sem maiores fundamentos. O Projeto deveria contemplar, pelo menos em honra ao nome reforma, que carrega, novas perspectivas tributárias, conteúdos e objetivos que integrem os avanços da tributação, fugindo ao convencional das anteriores tentativas de modificação que não lograram, até hoje, sucesso. De fato, a dita reforma tributária é apenas uma justificativa para, vestindo com novas roupagens, retomar diversos temas que não conseguiram, no passado, lograr êxito no Congresso Nacional, dado o equívoco da pretensão, inclusive a sua impossibilidade jurídica.  Trata-se, pois, de uma ressurreição de propostas antigas costuradas e não de um projeto de reformas.

Além disso tentou-se, em uma canetada, eliminar a aplicação de institutos e a dedutibilidade de despesas, sem maiores argumentos ainda que de política fiscal, o que assusta os investidores que constroem seus modelos de negócios sustentados na garantia de continuidade do sistema jurídico, em longo prazo.  São muitas as alterações introduzidas, mas neste pequeno estudo parece-nos que alguns desses temas devem ser comentados,  desde já, por sua importância e  para justificar nossas conclusões acima.

Examinando-se o proposto no PL 2.137, observa-se um ataque maciço às normas editadas na década de 1990 que permitiram ao país concretizar relevante plano de venda das participações societárias da União em importantes setores da economia, bem como atrair muitos investidores. Incluem-se nesse movimento, a revogação da dedutibilidade dos juros sobre o capital próprio (JCP), da isenção na distribuição dos lucros e dividendos e da dedutibilidade antecipada do ágio pago na compra de investimentos, marcadas como uma simples desconstrução das regras inovadoras trazidas naquele período, sem qualquer maior justificativa. A elas, por ora, dedicaremos alguns comentários.

No que tange à revogação da dedução do JCP[3], alega-se que as empresas brasileiras preferem endividar-se no mercado do que junto ao sócio. Esse argumento não prospera, pois uma  análise das demonstrações financeiras de empresas acreditadas em bolsa demonstra que muitas delas se valem desse instrumento para remunerar seus sócios, além de boa parte, capitalizá-los, assim mantendo os recursos na entidade. Do ponto de vista financeiro, o JCP tem custo igual ou inferior aos juros de mercado, além do que, ao longo do tempo, ter se tornado um dos elementos a determinar a preferência por investimentos no Brasil, sendo hoje adotado por outros países, inclusive da União Europeia, conhecido, em geral, como ACE  (Allowance for Corporate Equity).

Verificada a fragilidade das razões expressas na proposta para revogar a dedutibilidade do JCP, indaga-se quais são os seus reais fundamentos? Não há qualquer elemento que reforce essa iniciativa, exceto eliminar a possibilidade de deduzir, na sociedade, despesa legítima a favor do sócio, restrição destituída de razoabilidade econômica, em desfavor do mercado. Diga-se que desde há muito vem sendo apresentados no Congresso Nacional projetos de lei com esse mesmo objetivo, sob os mais variados argumentos, até agora sem sucesso. Infere-se, portanto, que a reforma, sob este aspecto, apenas requenta projetos anteriores que não lograram êxito,  evidenciando absoluta falta de criatividade associada a informação duvidosa acerca do uso do JCP pelas empresas.

A  segunda proposição que ora se examina objetiva revogar a isenção dos dividendos e lucros distribuídos.[4] Nesse caso, o argumento de revogação é que o Brasil, ao alinhar-se aos preceitos da OCDE[5], deve acompanhar o que a maior parte dos países faz, ou seja, tributa  os lucros ou dividendos distribuídos pela pessoa jurídica. Olvida-se a proposta de dizer que a distribuição entre sociedades, no mesmo país, não é tributada, cabendo tributar, apenas, o sócio, pessoa física. Afora isso, diversos países adotam a tributação conjunta das empresas de um mesmo conglomerado, reduzindo, substancialmente, dificuldades da tributação individual das entidades. A isenção na distribuição de lucros e dividendos foi criada considerando a integração sócio/sociedade, razão pela qual, à época, elevou-se  a alíquota corporativa, em contrapartida da eliminação da tributação da pessoa do sócio. O Projeto propõe o caminho inverso: reduzir a alíquota do imposto corporativo para 12,5% em 2022,  e 10% após, em contrapartida da tributação dos lucros e dividendos, na distribuição,  à razão de 20%.

Para atingir os objetivos pretendidos é essencial que haja um cálculo minimamente confiável demonstrando que essa mudança não resulta, de fato, em  aumento do encargo tributário para todos ou, pelo menos, para alguns, visto que a alíquota pretendida é igual  para todas as empresas. Até o momento diversas entidades apresentaram cálculos mostrando um acréscimo exorbitante de tributo para o contribuinte enquanto o Governo se mostra silente. Estão em idêntica situação companhias abertas e fechadas, que têm propósitos diversos, sociedades de prestação de serviços e de produção de bens, além de as sociedades beneficiárias de lucros e dividendos terem que manter controle do imposto retido na distribuição para futuras compensações, crédito esse que pode perder  substância enquanto não utilizado. A tributação de lucros e dividendos atrai a aplicação de uma série de situações há tempos alijadas do cenário tributário, como  a distribuição disfarçada de lucros. Absoluto retrocesso, além de não ficar claro o prejuízo que o modelo atual acarreta para o país.

Outro benefício que se revoga é a chamada amortização antecipada do ágio pago na aquisição de investimentos em sociedades controladas e coligadas, nas aquisições de investimentos efetivadas a partir de janeiro de 2022. O uso desse benefício, criado para atrair investidores para o Brasil, também na década de 1990, [6] gerou  um dos maiores contenciosos tributários  dos últimos tempos, sempre resolvido em desfavor do contribuinte nos tribunais administrativos. Seu único objetivo sempre foi admitir a dedução dessa parcela de custo quando as sociedades investida e investidora se unissem,  via incorporação ou cisão, ficando a dedução antecipada vinculada à sinergia manifestada pelo encontro dessas entidades, momento em haveria  um influxo de caixa, pelo não pagamento de tributos decorrente da amortização do ágio, em benefício da atividade econômica.

Desde a introdução desse benefício, nunca as autoridades fiscais se manifestaram sobre que medidas os contribuintes deveriam tomar para bem cumprir essa norma, limitando-se, apenas, a autuar todos que dela se valessem, inclusive com multas agravadas. Hoje, simplesmente, tenta-se revogar o benefício e, com isso, restringe-se, certamente, o interesse de investidores pelo mercado brasileiro. A proposta  não é  justificada por qualquer especial razão, mas o fato é que não há como justificá-la, exceto por uma oportuna mudança de política fiscal que, certamente, dada a situação da economia, está em sentido inverso às necessidades atuais. Ao inverso, se aperfeiçoado esse instrumento, certamente  mais investidores  serão atraídos para o mercado brasileiro.

Além dessas revogações que, diga-se, são feitas sem atender aos próprios fundamentos que são indicados na Exposição de Motivos, a suposta modernização do sistema,  há outras alterações que não trazem em si qualquer viés de reforma ou modernização, sendo inoportunas no momento e, como já se disse, servindo apenas para aumentar a carga tributária. É o caso da alegada harmonização de tratamento  da dedutibilidade de custos e despesas para fins de IRPJ e  de CSL, que convivem no sistema desde 1989. Com isso, passam a ser aplicáveis para fins de CSL os limites e condições de dedução, previstos para  IRPJ,  de diversas despesas: royalties, aluguéis, gratificações e participações de diretores,  assistência técnica com  o exterior e publicidade. O argumento da harmonização, apenas  para permitir a indedutibilidade, carece de qualquer melhor fundamento de política fiscal, neste momento tão difícil.

Há muitas outras mudanças no IRPJ e na CSL, como é o caso da alteração do período base de apuração que passa a ser trimestral, dos limites à compensação do prejuízo fiscal, à redução nas hipóteses admitidas ao uso do critério de lucro presumido. Uma das mais intrigantes alterações diz respeito aos critérios de amortização do intangível que, na ausência de previsão contratual,  deve seguir  o critério contábil estrangeiro de 20 anos,  a despeito de vivermos tempos em que a tecnologia é peça chave nas empresas e, em pouquíssimo tempo, se torna obsoleta. Tenta-se , mais uma vez, impor a tributação da variação cambial de investimentos no exterior, além de obrigar que o aumento/redução de capital em bens se faça pelo valor de mercado,  afora inoportunas alterações no mercado financeiro, sempre com o objetivo de aumentar a arrecadação.

No que tange à pessoa física, a proposta de alterar a tabela de incidência do imposto sobre a renda na fonte veio cercada da ideia de que tal intento somente será possível se for majorada a tributação da pessoa jurídica. A faixa de isenção a que a pessoa física faz jus, de acordo  com a Constituição,[7] corresponde ao mínimo existencial que um cidadão necessita para viver com dignidade, sendo que a não atualização desses valores retira-lhes essa condição, inclusive afetando sua liberdade. A atualização dessa tabela é dever do Estado, sob pena de irreparável dano a todos. Com isso não prospera condicionar a sua atualização à aprovação de outras fontes de custeio, especialmente a tributação dos dividendos, pois essa nos parece uma negociação impossível uma vez que essa atualização já deveria estar prevista nos orçamentos públicos por força dos princípios constitucionais que lhe são aplicáveis.

A nosso ver, e de forma breve, há tantas inovações  que muito valeriam para as empresas brasileiras neste momento, a saber: (i)  adoção da  tributação em conjunto de empresas integrantes de grupos econômicos, que estaria suportada nas demonstrações financeiras  consolidadas em IFRS[8], obrigatória para fins contábeis ; (ii) eliminação de qualquer influência do balanço individual em IFRS,   no cálculo do IRPJ , assim afastando o alto custo de controlar subcontas e outros mecanismos para conciliar normas fiscais e contábeis; (iii) revisão dos critérios de dedução de royalties; (iv) revisão das obrigações acessórias e dos critérios de aplicação das multas, sua dosimetria,  com o fito de torná-los mais consentâneos  com a infração e com o patrimônio do infrator.

Por todas essas razões, a proposta é uma verdadeira catástrofe que se abate sobre o contribuinte, lembrando que a palavra catástrofe, de origem grega,  — Katastrophé, de kata, para baixo; strophé, de strephein, subverto — designa a última parte da tragédia grega em que termina a ação dramática e na qual o personagem principal é lançado no mais triste fim. Significa  desastre, desgraça, desfecho, fim da vida, morte.[9]

Toda essa referência ao teatro clássico apenas para afirmar que a reforma, além de não reformar, é uma catástrofe que se abate sobre o contribuinte nos mesmos termos em que se abatiam sobre os personagens do teatro grego. É confiar que nossos congressistas se apercebam dessa tragédia particular dos contribuintes e da economia, como um todo.

[1] Lei n. 13149/15

[2] A CBS deverá, se aprovada nos termos propostos,  substituir cinco tributos federais a saber: 1) PIS/Pasep sobre a receita; 2) PIS/Pasep sobre a folha de salários; 3) Cofins; 4) PIS/Pasep-Importação; e 5) Cofins-Importação

[3] Lei n. 9249/95, art. 9°.

[4] Lei n. 9249/95, art. 10.

[5] Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico

[6] Lei n. 9532/77

[7] art. 145, §1° e art. 140, IV.

[8] International Financial Reporting Standards

[9] SILVEIRA BUENO, Francisco. GRANDE DICIONÁRIO ETIMOLÓGICO-PROSÓDICO DA LÍNGUA PORTUGUESA. Santos: Ed. Brasília Ltda, 1974, 2º vol. p. 648.


Reforma tributária coloca na berlinda isenção tributária recém-adquirida por Fiagro

Advogados projetam taxação sobre dividendos se reforma tributária for aprovada; tributação de ganhos de capital divide especialistas

O novo instrumento pode investir em ativos líquidos, como Certificados de Recebíveis Agrícolas (CRAs) ou Cédulas de Produto Rural (CPRs), assim como pode adquirir imóveis rurais. Nas regras previstas pela Lei Nº 14.130/2021, há ainda a opção para o Fiagro adquirir cotas de outros fundos que invistam até 50% do patrimônio líquido em ativos lastreados em crédito ou outros ativos vinculados à agroindústria.

Embora com a lei sancionada, o Fiagro ainda depende de aval da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para a regulamentação de ofertas e a posterior negociação das cotas em bolsa. Conforme apurou o InfoMoney, há uma chance de a autarquia emitir uma norma sobre os Fiagros ainda nesta semana.

Mesmo assim, a proposta do governo de tributar os dividendos dos investidores pessoas físicas de fundos imobiliários, que são apontados como os produtos mais próximos dos Fiagros, já parece ofuscar o brilho do instrumento.

Na avaliação de advogados consultados pelo InfoMoney, o texto da reforma não cita de forma explícita a retirada dos benefícios, mas as isenções tributárias seriam revogadas por uma menção indireta na proposta e desestimularia a indústria como um todo.

Pela lei, o Fiagro deve funcionar como uma espécie de fundo imobiliário, só que voltado para financiar cadeias produtivas agroindustriais. Da mesma forma como nos FIIs, o rendimento distribuído periodicamente aos investidores pessoas físicas de Fiagros seria a princípio isento de Imposto de Renda desde que o fundo tivesse no mínimo 50 cotistas; o cotista tivesse menos do que 10% das cotas do fundo; e as cotas do fundo fossem negociadas exclusivamente em bolsa de valores ou mercado de balcão organizado.

Na opinião de especialistas ouvidos pela reportagem, contudo, o texto da reforma tributária da forma como está retiraria o trecho da lei do Fiagro que garantiria essa isenção e os rendimentos passariam a ser tributados em 15%, assim como poderá ocorrer com os fundos imobiliários.

Ainda não que haja uma referência explícita no texto, Erik Oioli, sócio da VBSO Advogados, mão tem dúvida: “Está claríssimo que, segundo a lei, os benefícios de isenção tributária seriam perdidos”.

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De acordo com o advogado, que vem acompanhando o tema juntamente com associações do mercado de capitais, sem os benefícios tributários, o custo para captar e remunerar investidores ficaria muito alto. “As captações ficariam mais onerosas e poderiam ser até postergadas porque o investidor pediria maior retorno para aportar capital no produto”, aponta.

Ganho de capital

Já a tributação sobre ganho de capital abre margem para interpretações distintas. No caso dos fundos imobiliários, o governo pretende reduzir a alíquota de Imposto de Renda de 20% para 15% sobre rendimentos na amortização e na alienação de cotas. Mas nos Fiagros, há diferentes interpretações.

Alguns advogados avaliam que a alíquota para ganho de capital seria mantida em 20%, enquanto outros entendem que ela também seria reduzida para 15%.

Para Érico Pilatti, responsável pela coordenação da parte tributária do escritório Cepeda Advogados, a alíquota de 20% cobrada sobre ganhos de capital deve ser mantida com a reforma.

Já Ana Carolina Monguilod, sócia do i2a Advogados, assinala que o artigo 31 do projeto de lei da reforma tenta colocar de forma “bem ampla” a taxação dos fundos de investimentos em uma alíquota única de 15% sobre os rendimentos.

“Mesmo que o texto não faça referência específica aos tipos de investimentos, acho que seria bastante defensável que a alíquota de 15% também se aplicasse no caso dos Fiagros”, destaca Ana Carolina.

Idas e vindas

Ainda que a leitura inicial da proposta de reforma não agrade o mercado e reforce distorções nas taxações de alguns investimentos, a opinião de advogados consultados pelo InfoMoney é que a proposta ainda pode sofrer muitas reviravoltas durante a tramitação no Congresso.

Um dos motivos é que alguns investimentos que já eram isentos, como certificados de recebíveis do agronegócio e imobiliários, além de letras de crédito imobiliário (LCI) e do agronegócio (LCA), seguiriam sem taxação de Imposto de Renda no caso de pessoas físicas, pelo texto proposto pelo governo.

Na opinião de Ana Carolina, isso gera uma pressão ainda maior para que a nova tributação proposta para fundos imobiliários e Fiagros seja revista, já que ambos podem adquirir alguns desses ativos isentos. Outro ponto levantado pela especialista é que o Congresso não deve aceitar a derrubada de algo que já conquistou.

“Os setores imobiliário e agropecuário têm bancadas fortes. A isenção tributária tinha sido aprovada pelo Congresso, depois o governo vetou alguns trechos, e, por fim, a bancada fez força e voltou com as vantagens tributárias.”

A menção de Ana Carolina faz referência a todo o imbróglio que marcou a aprovação do projeto de lei 5.191/2020 e que deu origem à lei 14.130. O texto foi apresentado pela primeira vez no plenário no Congresso em novembro do ano passado e teve forte apoio da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).

Na visão de especialistas, se o Congresso não for capaz de reverter as mudanças propostas na reforma tributária, isso poderia prejudicar a captação de recursos em uma área que vem ajudando a gerar empregos para o país, mesmo diante da crise do coronavírus.

“Há uma demanda forte de financiamento privado. Os recursos por parte do governo estão limitados e o próprio governo tem liderado uma agenda que incentiva a captação privada de recursos”, destaca Oioli.

Mesmo em meio à alta procura, a CVM ainda evita falar sobre novidades em termos de regulamentação para os Fiagros e se limita a dizer que “o tema objeto [Fiagro] está em estudo na autarquia e, portanto, neste momento, não é possível prestar informações adicionais”. Há, contudo, chance de a situação se encaminhar em breve. Conforme apurou o InfoMoney, a autarquia deve se posicionar nos próximos dias sobre o tema. 


Contribuintes ganham R$ 358 bilhões com a "tese do século", estima IBPT

Um estudo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) estima que as empresas poderão recuperar aproximadamente R$ 358 bilhões com a modulação dos efeitos da chamada "tese do século" — a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins.

O IBPT aponta que já foram compensados R$ 93,40 bilhões, o que representa 26,08% do total. A previsão de compensação de créditos para este ano é de R$ 56,05 bilhões. Para 2022, a estimativa é de R$ 69,66 bilhões. Para que as empresas possam recuperar esses valores, a Receita Federal ainda precisa regulamentar o procedimento.

Ainda segundo o estudo, caso o Supremo Tribunal Federal não tivesse deferido a modulação dos efeitos da decisão a partir de 2017, o impacto econômico da exclusão do ICMS poderia ser de R$ 587 bilhões. Ou seja, o governo federal ganhou R$ 230 bilhões com a modulação dos efeitos.

Os dados ainda mostram que a participação do PIS e da Cofins na arrecadação dos tributos federais tem se mantido em torno de 21% ao longo dos anos. O IBPT conclui, portanto, que não houve nenhum reflexo econômico negativo na arrecadação mesmo após a decisão do STF.

Clique aqui para ler o estudo


Veja como fica o IR para investidores na reforma tributária do governo

A proposta do governo federal que modifica o Imposto de Renda traz diversas mudanças para investidores, de modo a simplificar a tributação e aproximá-la da de outros países.

De acordo com o projeto apresentado pelo Ministério da Economia, os dividendos distribuídos por empresas a seus acionistas, hoje isentos de IR, passam a ser tributados em 20% na fonte.

Há uma exceção de até R$ 20 mil por mês em dividendos para microempresas e empresas de pequeno porte (as que têm faturamento anual de até R$ 360 mil e R$ 4,8 milhões).

Já os JCP (juros sobre capital próprio), hoje tributados em 15% na fonte para os investidores, deixariam de existir.

A distribuição de proventos de FIIs (Fundos de Investimento Imobiliário), hoje isenta para fundos com mais de 50 cotistas, ou seja, os disponíveis para qualquer investidor, também passaria a ser tributada, com alíquota de 15% na fonte.

Dividendos isentos e o uso de JCP foram adotados nos anos 1990 como incentivo para as companhias de capital aberto e para o mercado de renda variável. O mesmo aconteceu com os FIIs, que eram um suporte ao mercado imobiliário.

Segundo defensores do projeto, o mercado se desenvolveu muito, o que deixaria os incentivos fiscais menos necessários, em um contexto em que as contas públicas se deterioram rapidamente.

"O governo disse que manteria benefícios para os setores imobiliário e do agronegócio, importantes para a criação de emprego, mas, taxando os FII, reduzem o financiamento de um setor", diz Ana Cláudia Akie Utumi, sócia-fundadora da Utumi Advogados.

Ela aponta que há dúvidas sobre outros dois instrumentos de financiamento destes setores, a LCI (Letra de Crédito Imobiliário) e a LCA (Letra de Crédito do Agronegócio), que hoje são isentos de IR. "No projeto apresentado não está claro como ficam, é possível que percam a isenção", diz Ana Cláudia.

Ainda se discutia uma possível tributação dos também isentos CRI (Certificados de Recebíveis Imobiliários) e CRA (Certificados de Recebíveis do Agronegócio), mas eles ficaram de fora do projeto.

Especialistas apontam que as alíquotas propostas pelo governo devem sofrer alterações. O mercado aposta em uma taxa de 15% para dividendos, correspondente à cobrança atual sobre os JCP.

"O governo passou com uma gordura mesmo. A única certeza que eu tenho é que não é da forma que foi apresentado que [o projeto] vai passar", diz Victor Hasegawa, gestor de ações da Infinity Asset.

Ele diz que uma forma que as empresas têm de contornar o fim do JCP e o IR sobre dividendos é remunerar o acionista por meio de recompra de ações. Ao adquirir os papéis em circulação e cancelá-los, a empresa concentra o capital e aumenta o valor das ações restantes, fazendo com que os papéis detidos pelos investidores valham mais.

"A empresa também pode remunerar os investidores reinvestindo em si, crescendo, e gerando mais lucro", diz Hasegawa. Além disso, o governo propôs a redução da alíquota do IR de empresas dos atuais 15% para 10%, o que também pode ampliar o lucro. De acordo com especialistas, porém, a tributação sobre dividendos pode fazer com que as empresas paguem mais impostos no total do que pagam hoje, mesmo com um IR menor.

Outra mudança para os investidores é no day trade (compra e venda da ação no mesmo dia) e na venda de cotas de FIIs. Estas operações são tributadas em 20%, mas, segundo a proposta, serão tributadas em 15%, como o swing trade (as compras e vendas de ações em dias alternados).

Hoje, é preciso pagar o IR sobre estas operações mensalmente por Darf (documento de arrecadação) caso a venda de papéis no período supere R$ 20 mil. Abaixo deste valor, o lucro é isento de imposto, mas ainda deve ser declarado.

Para calcular o lucro mensal, contabilizando os lucros e prejuízos de cada operação, se separa o day trade do swing trade atualmente. O plano do governo é unificar as duas operações neste cálculo. O governo também pretende mudar a tributação de mensal para trimestral, elevando a isenção para uma soma de vendas até R$ 60 mil no período. "Resolveram simplificar e juntaram o day trade com outras operações, mas a sistemática de apuração de ganhos e perdas fica a mesma. Ao invés de fazer uma conta mensal, faço trimestral. E não são mais doze contas no ano, e sim quatro", diz Ana Cláudia.

Caso o investidor esqueça de recolher o IR sobre renda variável mensal, que tem prazo até o último dia útil do mês seguinte ao da apuração do lucro, há multa e juros.

A multa é de 0,33% por dia de atraso, limitado a 20% e um juro, que consiste na soma da taxa Selic do mês seguinte àquele do vencimento do tributo até a taxa Selic do mês anterior ao que será feito o pagamento, e acrescenta-se a esta soma 1%, que é referente ao mês de pagamento.

O percentual dos juros de mora é aplicado sobre o valor do tributo ou contribuição devido. Não há cobrança para pagamentos feitos dentro do próprio mês de vencimento. Por exemplo, se o tributo vence em 21 de novembro, e, se pagar até 30 de novembro, não pagará juros de mora, apenas a multa de mora.

Segundo a proposta de mudança tributária do governo, o IR para renda fixa também mudaria, com produtos como Tesouro Direto e CDB, com alíquota única de 15%. Atualmente há um escalonamento em função da duração da aplicação: 22,5% até 180 dias; 20% de 181 a 360 dias; 17,5% de 360 a 720 dias e 15% em resgates após 720 dias.

Fundos que também seguem a tabela regressiva –renda fixa, multimercados, crédito privado, cambiais e ouro– terão alíquota única de 15% em todo novembro (come-cotas) ou no resgate, se igualando ao IR sobre fundos de ações e ETFs (fundos de índice) de ações, que têm IR de 15% no resgate.

Assim, acabaria o come-cotas de fundos em maio. O come-cotas é uma antecipação obrigatória do IR que atualmente acontece uma vez por semestre, sempre nos últimos dias úteis de maio e novembro.

Nesta cobrança, o número de cotas na carteira do investidor diminui automaticamente de acordo com a menor alíquota do IR correspondente (no caso dos fundos de curto prazo, 20% e nos de longo prazo, 15%).


O que o ex-secretário que isentou os dividendos diz sobre a volta da taxação

Reforma tributária do governo propõe taxar os dividendos e extinguir os juros sobre capital próprio; para Everardo Maciel, duas péssimas ideias

Juliana Elias, do CNN Brasil Business, em São Paulo

Na mira da reforma tributária do imposto de renda apresentada na semana pelo governo, estão dois mecanismos implementados no Brasil nos anos de 1990 e que praticamente não existem em nenhum outro lugar do mundo: o primeiro deles é a isenção de impostos nos dividendos, que é a parte do lucro das empresas paga a seus donos e acionistas. O outro são os juros sobre o capital próprio (JCP), uma outra forma incentivada de remuneração aos acionistas e investidores do negócio.

A proposta desenhada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, quer taxar o primeiro, em troca de reduzir um pouco o imposto sobre as empresas, e extinguir o segundo, que, de acordo com a equipe econômica, foi criado em um tempo em que as empresas tinham pouco acesso a crédito e hoje não tem mais sentido.

Com isso, o sistema ficaria mais simples, com só um tipo de distribuição de lucro (o dividendo), e mais equilibrado, com empresários e investidores também pagando seu quinhão de imposto sobre essa que é uma das principais fontes de renda de muitos deles. De quebra, o Brasil deixaria também o título de um dos únicos países do mundo onde o dividendo é livre de tributos.

Para o consultor jurídico e ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel, porém, ambas são péssimas ideias – além de o conceito estar errado. Maciel, chefe da Receita entre 1995 e 2000, ajudou a criar as duas coisas. Elas foram implementadas em uma reforma tributária feita pelo governo de Fernando Henrique Cardoso em 1996, comandada pelo então ministro da Fazenda Pedro Malan.

Em entrevista ao CNN Business, Maciel defendeu que voltar a tributar os dividendos cria uma série de distorções que traz mais prejuízos do que ganhos para o país, como novos tipos de sonegação dos empresários e a necessidade de tributos ainda mais altos para manter a mesma arrecadação.

"Se os outros países não fazem assim, a pergunta deve ser dirigida a eles. Eu entro em debate com qualquer um deles para demonstrar que estão errados. O Brasil não pode estar certo? É complexo de vira-lata."

Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal

Quanto ao fim dos juros sobre capital próprio, ou JCP, o ex-secretário não só afirma que vai tirar investimentos das empresas e aumentar o endividamento delas, como rebate a explicação vendida pelo governo: “O governo disse que ele foi criado porque as empresas tinham dificuldade em contratar crédito. É uma vergonha, nunca foi isso.”

A razão de introduzir o JCP, conta um dos donos da ideia, era dar uma nova possibilidade de dedução de imposto às empresas em um momento em que a carga estava subindo e, ao mesmo tempo, estimular investidores a colocarem mais dinheiro nelas. Isso, inclusive, está explicado na justificativa da lei que promoveu as mudanças.

Já sobre o quadro completo da reforma tributária proposta pelo governo, Maciel se une ao coro uníssono de especialistas quanto ao impacto – “vai ter aumento de carga” – e a parte deles quanto à avaliação – “é o pior projeto que já vi”, diz.

O que é o dividendo e o JCP

Tanto os universais dividendos quanto a versão brasileira dos juros sobre capitais próprios, ambos queridinhos dos investidores que têm ações na bolsa de valores, são formas de a empresa remunerar seus donos e acionistas com parte do que geraram de lucro. As empresas no Brasil podem optar por um ou outro.

Os dividendos, no modelo atual, não têm imposto nenhum. Nos juros sobre capital próprio, o investidor paga 15% em imposto de renda, mas as empresas gostam muito de usá-los porque permitem deduzir parte do imposto que devem: como os juros são considerados um tipo de despesa, pagá-los reduz o lucro final e, com isso, também o IR a ser pago, já que ele é aplicado sobre o lucro.

É o benefício dessa dedução que a reforma de Guedes está cortando – o que, na prática, tira a única razão que mantém o JCP vivo e deve levá-lo ao desaparecimento por morte natural.

Dividendos: imposto mais alto e sonegação invisível

Em todos os outros países do mundo, o imposto de renda corporativo é recolhido em duas frentes: no lucro total apurado, ainda dentro da empresa, e no pedaço desse lucro distribuído aos donos, sócios e investidores, que é o dividendo. Neste caso, o IR é pago pela pessoa física, já do lado de fora da companhia.

No Brasil, esse combo tributário é hoje de 34% e é cobrado todo dentro da empresa. O dividendo é repartido do que sobra depois da tributação recolhida, e não paga mais nada. A crítica é que o peso tributário sobre o negócio fica muito grande, enquanto ter imposto no dividendo desestimula a empresa de distribui-los, o que mantém mais lucros do lado de dentro e incentiva investimentos.

A nova reforma propõe subir do zero para 20% o IR no dividendo enquanto reduz o da empresa em 5%, dos 34% para 29%.

Para Maciel, o inusitado modelo brasileiro continua sendo a maneira mais eficiente de evitar desvios tributários muito comuns feitos pelos empresários e não perder arrecadação.

Além disso, o simples fato de haver imposto sobre o dividendo desestimula as empresas a distribui-los, o que significa que haverá um pedaço de bolo menor deles para a Receita morder e resulta em mais queda de arrecadação.

Maciel explica que existe um fenômeno de sonegação muito conhecido e de dificílimo enfrentamento, que no Brasil, segundo ele, deixou de existir, que é a distribuição disfarçada de lucros:

"Se eu tenho uma empresa e os dividendos estão isentos, eu distribuo os dividendos e compro casa, carro, minhas coisas. Mas se eles estão tributados, eu nem distribuo. É melhor deixar o dinheiro dentro da empresa e comprar a casa ou o carro no nome da empresa. E como fiscaliza isso?"

Everardo Maciel

O ex-secretário também destaca que, com parte da tributação no dividendo, é necessária uma alíquota muito maior para conseguir manter a mesma arrecadação – não à toa, é o que acontece na proposta de Guedes, em que o dividendo sobe 20% para o IR da empresa cair 5%.

"A relação que existe entre a tributação de dividendo e na empresa é de 1 para 4, porque o dividendo é só um pedaço do lucro. Isso são estudos da própria Receita Federal. Se eu reduzo a alíquota de 34% da empresa em 1 ponto, para 33%, eu tenho que tributar o dividendo em 4%. Se baixar em 10%, tenho que botar 40% no dividendo; apenas para ficar igual."

Everardo Maciel

Juros sobre capital para atrair investimentos

Os juros sobre capital próprio são uma mistura entre o dividendo, que é o lucro pago aos sócios como retorno de seus investimentos, e os juros financeiros, pagos aos bancos e credores nos empréstimos.

"É um juro fictício, claro, uma ficção jurídica. Mas foi criada uma nova forma de remunerar o capital."

Everardo Maciel

Como os juros financeiros, os JCPs também são contabilizados como despesa e deduzem imposto. A diferença é que são pagos para quem investe na empresa, e não para quem empresta – por isso “sobre o capital” –, e sem a necessidade de devolver o valor aportado.

É por isso que eles ajudam a atrair investimentos e, caso deixem de existir, na opinião de Maciel, vão levar as empresas a recorrer mais a empréstimos para levantar dinheiro.

"Suponha uma empresa estrangeira com filial no Brasil, e que decide capitalizar a filial brasileira. A matriz pode fazer isso de duas maneiras: com um investimento direto, que tem riscos, ou um empréstimo. Sem o juro remuneratório do capital [JCP], o empréstimo será mais vantajoso. Empréstimo não é capital de risco, ele volta, e a filial, quando paga os juros, deduz do cálculo do IR dela. Os juros sobre capital equipara as duas coisas", diz.

A teoria desse mecanismo, conta Maciel, foi concebida ainda nos anos de 1960 pelo economista e ex-ministro da Fazenda Otávio Gouveia de Bulhões, mas só com a reforma de 1996 Maciel e equipe a trouxeram para a legislação brasileira.

"Acabar com os juros sobre capital vai estimular o endividamento, aumentar a carga das empresas e tirar as estrangeiras que estão aqui por isso. Você sabe o esforço que é convencer  o investimento estrangeiro a vir para cá? Temos confusão de todo o tipo. Eles só vêm por duas razões: isenção do dividendo e a dedução dos juros sobre capital próprio. "

Everardo Maciel

Alívio tributário

A ideia primeira ao adotar o JCP na reforma de 1996, de acordo com Maciel, foi criar uma fonte extra de dedução de imposto para as empresas em um momento em que a carga delas ia subir, já que a mesma reforma extinguiu a regra herdada dos anos de hiperinflação que permitia deduzir a correção monetária na apuração do imposto de renda.

É por isso que sua extinção agora, sem novas contrapartidas, na visão de Maciel e de outros tributaristas, terá o efeito de uma carga maior para as empresas.

"A eliminação da correção monetária do patrimônio líquido teve impacto pesadíssimo para as empresas, e aí buscamos fazer algo compensatório. Com isso [a introdução do JCP], mitigávamos a reação e, ao mesmo, tempo resolvíamos outro problema, que era atrair investimentos. Eram dois alvos, não só um. Em 1996, para cada R$ 3 emprestados no Brasil, tinha R$ 1 em investimento direto. Em 1997, isso tinha se invertido: eram R$ 3 de investimento para R$ 1 em empréstimo."

Everardo Maciel


História mostra recuperação forte da economia depois de epidemias e guerras

Consumo e investimento tiveram alta depois da gripe espanhola e de conflitos globais

Rua comercial em Belo Horizonte, na década de 1920: consumo se acelerou depois da 1ª Guerra Mundial e da pandemia da gripe espanhola Creative Commons (via Flickr)


05.jul.2021 (segunda-feira) - 6h00

Há expectativa de que vários países, incluindo o Brasil, entrem em um ritmo de crescimento econômico forte por longo período depois de superada a pandemia da covid. Ciclos de alta do consumo e de investimento costumam suceder choques não-financeiros, como pandemias ou guerras. Mas economistas alertam para o fato de que isso não é uma certeza e de que, mesmo que o crescimento venha, será preciso tomar outras medidas para que seja sustentável.

À gripe espanhola (1918-1921) seguiu-se um período de bonança em vários países. Também foi assim com o surto de cólera em Paris, em 1830. A França entrou na Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra.

No Brasil houve prosperidade depois de 2 momentos: gripe espanhola e 2ª Guerra. É o que mostram dados históricos compilados pelo Poder360.

Na época, a manufatura crescia impulsionada pela demanda interna e por investimentos a partir do dinheiro da venda de café. Alguns cafeicultores viraram industriais. O lucro da lavoura também chegava a outros setores por meio do sistema financeiro. Novas fábricas eram construídas com empréstimos.

Em 1921, último ano da pandemia da gripe espanhola, a compra de máquinas e equipamentos atingiu 12,4% do PIB. No ano seguinte, a economia cresceu 7,8%, puxada pela indústria, que se expandiu 18,8%. A construção também prosperou.

A 2ª Guerra Mundial (1939-1945) trouxe devastação a partes da Europa e da Ásia. Depois veio o mais longo período de crescimento e estabilidade desses e de outros continentes. No Brasil foi assim. Em 1946, a indústria cresceu 18,5% e o PIB, 11,6%.

Depois da 2ª Guerra intensificou-se no Brasil o processo de substituição de importações. Passaram a ser produzidos no país produtos que antes vinham de fora. Isso levou a novos investimentos de empresas locais e também de multinacionais.

Há ainda as mudanças no lado da oferta: novos modos de organização da produção. Atualmente, o trabalho remoto aumenta a produtividade em alguns setores. A automação também tende a crescer.

Previsões

O FMI (Fundo Monetário Internacional) prevê aceleração do crescimento neste ano e no próximo em diversos países, incluindo o Brasil. Segundo a revista Economist, o crescimento forte e sincronizado dos países do G7, os mais ricos, será algo inédito desde o período que se seguiu à 2ª Guerra Mundial.

Pesquisa do banco UBS com 3.800 investidores de vários países, também no Brasil, constatou que 68% tiveram aumento de patrimônio em 2020 e 51% planejam aumentar os gastos em relação ao período pré-pandemia. O grupo entrevistado é de pessoas que, dependendo da faixa etária, têm de US$ 250 mil a US$ 1 milhão para investir. Não é um levantamento com valor estatístico por não se tratar de uma amostra desse segmento.

Com maior renda global, tende a aumentar a demanda por produtos brasileiros de maior valor agregado, como carnes. O valor das commodities que o país exporta já está subindo.

Riscos

Mas a história também mostra que situações assim exigem cuidados e políticas públicas eficientes. Há risco de aumento das disparidades de renda nos países beneficiados pela prosperidade e também nos outros, em consequência das mudanças econômicas globais.

Na década de 1920 houve aumento da desigualdade no Reino Unido“, diz Renato Colistete, professor de história econômica da FEA-USP (Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo). “O resultado disso foi maior tensão social e política“.

O Reino Unido foi um dos vencedores da 1ª Guerra Mundial. Na Alemanha, derrotada no conflito, a tensão social e política foi bem maior e resultou no nazismo.


Reforma tributária é quase um confisco

Filho dileto da Escola de Chicago, o bastião mundial do liberalismo econômico, Paulo Guedes assumiu o Ministério da Economia com a promessa de uma lufada de ar fresco no decrépito sistema tributário brasileiro. A ideia básica era a simplificação do emaranhado fiscal e a redução de impostos, associadas a um urgente enxugamento de um Estado oneroso, voraz e ineficiente. Na sexta-feira 25, ao apresentar a segunda etapa da reforma tributária ao Congresso, Guedes fez um movimento que levaria os próceres da doutrina liberal, George Stigler (1911-1991) e Milton Friedman (1912-2006), ambos agraciados com o Prêmio Nobel de Economia, a revirar furiosamente em seus túmulos.

Entregue recentemente ao presidente da Câmara, Arthur Lira, o projeto de lei subverte os princípios da doutrina e avança sobre os caixas das empresas e bolsos de empreendedores e da classe média. O texto ressuscita uma tributação de dividendos e lucros que já havia sido abandonada em 1996. Associada a tributos já existentes, a nova cobrança é um assombro: ela pode elevar para 49% o índice pago por empresas e empreendedores, uma atrocidade fiscal próxima de um confisco. A proposta também extingue o desconto simplificado para quem ganha até 40 000 Reais por ano ou 3 000 reais mensais e, no que diz respeito ao alardeado aumento do número de isentos, acaba beneficiando menos contribuintes do que deveria. Em resumo, o projeto do governo pune aqueles que já pagam altos impostos e pouco recebem em troca: a iniciativa privada e a classe média brasileira.

No anúncio da proposta, os técnicos do Ministério da Economia se valeram da gasta retórica de redução de impostos para os mais pobres e fim das vantagens dos ricos. Balela. Trata-se na verdade de um discurso populista, que caberia perfeitamente na plataforma eleitoral de um partido como o PT, mas que foi abraçado por este governo, 100% dedicado hoje a um só objetivo: o projeto de reeleição de Bolsonaro. Se esta administração estivesse de fato interessada em coibir privilégios, se empenharia mais nas privatizações ou numa reforma administrativa radical do Estado, eliminando estruturas que consomem bilhões de reais e, para desgosto dos cidadãos brasileiros que pagam impostos, têm atravessado intactas sucessivas gestões.

Como Paulo Guedes e a equipe econômica falharam nessa hora tão importante, cabe agora ao Congresso Nacional realizar os ajustes necessários para que esse modelo não vingue. Da maneira como está, as consequências para a economia brasileira podem ser nefastas, com uma brusca diminuição de investimentos e até a saída de multinacionais do Brasil. Em outras palavras, um desastre que pode aumentar ainda mais o desemprego, o dólar e promover uma fuga de capitais do país.

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Governo nega que reforma aumente imposto, mas analistas dizem que sim

A reforma do IR (Imposto de Renda) apresentada pelo Ministério da Economia terá efeitos positivos no caixa do governo. Segundo cálculos da Receita Federal, as alterações vão gerar R$ 980 milhões a mais de receita em 2022; R$ 330 milhões adicionais em 2023; e R$ 590 milhões de acréscimo em 2024. Mesmo assim, o governo afirma que a reforma "tende a ser neutra", isto é, que não vai alterar a carga de impostos paga pelos contribuintes atualmente.

Especialistas ouvidos pelo UOL afirmam que é difícil que o balanço entre reduções e aumento de impostos fique no zero a zero, pela complexidade do sistema tributário. Eles dizem, porém, que os cálculos do governo estão subestimados: a arrecadação de impostos deve crescer mais do que os valores apresentados pela Receita - e, se aprovadas, as medidas devem resultar em um aumento nos tributos. Uma parte da classe média e empresas médias e grandes devem ser afetadas.

A proposta do governo aumenta a faixa de isenção para pessoas físicas, e diminui o número de contribuintes que podem usufruir do desconto simplificado. Os mais afetados, nesse caso, devem ser contribuintes de classe média e os que não terão despesas a deduzir no IR (como plano de saúde e escola particular, por exemplo).

No caso das empresas, o texto diminui a alíquota do IR em 5%, mas institui a tributação de lucros e dividendos em 20%. A alíquota não seria aplicada para valores de até R$ 20 mil por mês pagos por micro ou pequenas empresas. Segundo tributaristas, uma coisa não compensa a outra, e empresas, principalmente médias e grandes, serão oneradas.

Cálculo é complexo

Manoel Pires, pesquisador associado do Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas), afirma que as estimativas sobre aumento e redução no valor pago em impostos têm imprecisões.

Alterações nas regras tributárias podem, por exemplo, fazer com que as pessoas mudem comportamentos com o objetivo de pagar menos impostos - o que nem sempre pode ser medido em modelos matemáticos.

É muito difícil fazer uma reforma tributária e zerar completamente os efeitos de aumento e perda de imposto. É normal que haja, no final, algum resíduo de aumento de receita.
Manoel Pires

Há potencial de arrecadação maior

Ele afirma, no entanto, que os valores apresentados pelo governo estão envolvidos em "muita incerteza". No caso da tributação de dividendos, Pires diz que pode haver uma mudança de comportamento nas empresas, ou seja, haver menos distribuição de lucros e dividendos para diminuir o pagamento de imposto.

Mesmo assim, segundo ele, cobrar imposto sobre lucros e dividendos tem grande potencial arrecadatório.

O governo está sendo muito conservador nessa projeção [do impacto da reforma na arrecadação]. A diferença vai ser maior, em favor do governo.
Manoel Pires

Empresas do setor produtivo vão sofrer, diz especialista

Para Gilberto Luiz do Amaral, presidente do Conselho Superior do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação), a carga tributária vai aumentar "muito mais do que o governo divulgou", com impacto principalmente sobre as empresas.

O governo está fazendo uma proposta para aumentar a arrecadação. Não é um projeto com finalidade neutra, infelizmente. Ele taxa as empresas do setor produtivo de modo a desestimular investimentos.
Gilberto Luiz do Amaral

Em nota ao UOL, o Ministério da Economia afirmou que não é possível comparar a tributação de empresas com a de dividendos, porque "são tributações distintas sobre pessoas diferentes".

Para Amaral, o argumento não faz sentido, porque o empresário é, também, investidor nos negócios. "Se ele [o empresário] paga na pessoa física ou na pessoa jurídica, o resultado é o mesmo", afirma.

Falta transparência dos dados

Josué Pellegrini, consultor legislativo do Senado, declara que o problema não é o cálculo apresentado pelo governo, e sim a falta de transparência a respeito dele. A metodologia e as premissas das contas não foram divulgadas pelo Ministério da Economia. Questionado pelo UOL, o órgão não encaminhou os números.

A gente não sabe nem se isso vai ser mesmo parte de uma reforma tributária maior ou se vai ser uma peça isolada. Do jeito que está, não sei nem se dá para chamar de reforma, está mais para uma 'obrinha'.
Josué Pellegrini

O governo prometeu encaminhar a reforma tributária ao Congresso em quatro etapas. Até agora, além do projeto do IR, somente a proposta de fusão de PIS e Cofins foi enviada. Resta, ainda, o texto com alterações no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e na tributação da folha de pagamentos.

Visão do todo

Luís Wulff, presidente do Tax Group, diz que falta uma "visão sistêmica" da reforma, o que não permite que seja feito um balanço completo de benefícios e prejuízos.

A reforma ideal levaria em conta a tributação do consumo; em segundo lugar, a da renda; em terceiro, a do patrimônio; e, por fim, a tributação sobre a folha de pagamentos, que só existe no Brasil.
Luís Wulff

O que diz o governo

Em nota, o Ministério da Economia afirmou que as projeções consideram parâmetros macroeconômicos, informações da Receita Federal e cenários futuros elaborados pela Secretaria de Política Econômica.

Segundo o órgão, o efeito das medidas não é zero, mas "tende a ser neutro". "No caso do projeto do Imposto de Renda, as medidas estão na ordem de dezenas de bilhões de reais, o que permite considerar os valores positivos finais como relativamente baixos, considerando-se a magnitude das medidas propostas", conclui a nota.


Reforma tributária 'quebra credibilidade do país', diz especialista sobre texto

O cientista político Murillo de Aragão disse à CNN que a estabilidade das regras tributárias precisa ter a 'prioridade' como foco

Produzido por Elis Franco, da CNN, em São Paulo
03 de julho de 2021 às 00:01 | Atualizado 03 de julho de 2021 às 00:02

 

Em entrevista à CNN, o cientista político e CEO da Arko Advice Murillo de Aragão afirmou que a proposta da reforma tributária "quebra ainda mais a credibilidade do país". Segundo ele, o Brasil precisa ter a "prioridade" como foco na estabilidade de regras tributárias.

"[O texto] tem o atrativo de corrigir a tabela do imposto de renda, que não é nada mais do que a obrigação do governo de fazer."

Outro ponto abordado pelo cientista político foi a pressa do presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira (PP-AL) em aprovar os dois projetos de lei antes do recesso parlamentar. De acordo com Aragão, o objetivo é impossível pela "tamanha complexidade da matéria".

Murillo de Aragão conversou com a CNN sobre a reforma tributária
O cientista político Murillo de Aragão conversou com a CNN sobre a reforma tributária (02.jul.2021)
Foto: Reprodução / CNN