O meu patrimônio está organizado da forma mais eficiente possível?
Nesse momento de severa crise econômica causada pela pandemia de Covid-19, não são poucos os empresários, os executivos e as famílias que se fazem essa pergunta.
No geral, ela não é difícil de responder.
As participações em empresas operacionais têm na sociedade holding o seu principal instrumento de organização. Ainda que não afaste a possibilidade de responsabilização do sócio por desconsideração da personalidade jurídica ou redirecionamento de execução fiscal, a sociedade holding o distancia das atividades operacionais, evitando ou postergando a responsabilização por seus passivos, sobretudo bloqueios online. A sociedade holding também é o veículo preferencial para a realização de acordo de sócios, a organizar a sua governança e futuras transações relativas às participações societárias, e facilita a implementação de planejamento sucessório, normalmente feito por testamentos ou doações, com ou sem reserva de usufruto.
Já os imóveis têm na sociedade imobiliária a sua forma de organização mais comum. Com a adoção do regime do lucro presumido, a sociedade imobiliária sujeita-se à base de cálculo de 8% do valor total da venda ou aluguéis dos imóveis, tributação mais favorável do que a do IRPF pela tabela das alíquotas progressivas de até 27,5%. De forma semelhante que a sociedade holding, a sociedade imobiliária propicia a realização de acordo de sócios e simplifica a adoção de planejamento sucessório, no caso evitando que cada herdeiro passe a deter em condomínio uma fração ideal de cada um dos imóveis. É de se lembrar ainda que o imóvel residencial de uso próprio pode ser constituído como bem de família, por escritura pública e averbação na matrícula do imóvel.
As aplicações financeiras são geralmente organizadas na forma planos de previdência privada complementar e fundos de investimentos fechados. A previdência tem basicamente três vantagens. Quando destinada à subsistência da pessoa ou família na aposentadoria, tem caráter alimentar e, portanto, é impenhorável. Por ter natureza de seguro, não integra o patrimônio, inclusive para fins de herança, o que significa que não precisa ser inventariada. E, pelo mesmo fundamento, não é sujeita a ITCMD, a menos que o seu valor acabe por compor a legítima, a parcela de 50% do patrimônio de toda pessoa que necessariamente tem que ser destinada aos herdeiros necessários. Já os fundos fechados propiciam o diferimento da tributação de IR enquanto não houver resgate das cotas; além disso, na pessoa física, as aplicações financeiras não têm compensação de perdas e ganhos, ou seja, paga-se imposto sobre os ganhos, sem compensar eventuais perdas. Os títulos incentivados sob o aspecto tributário na pessoa física, como LCI e LCA, dispensam um e outro instrumento, mas expõem-se diretamente a responsabilização por passivos na condição de sócio de sociedade operacional.
As aplicações financeiras no exterior são normalmente organizadas na forma de PIC – Private Investment Companies e fundos de investimento offshore, situados em jurisdições de tributação favorecida. Os efeitos são, por meio diferente, os mesmos do fundo fechado nacional: diferimento tributário e compensação de perdas e ganhos (para fins tributários). Além dos instrumentos convencionais de planejamento sucessório, as PICs podem adotar o regime de joint tenancy with rights of survivorship quando as ações compõem patrimônio comum, de modo que, com o falecimento de um proprietário, as ações são automaticamente transferidas para o outro. A diferença dos fundos para as PICs está na maior sofisticação da gestão e rigor do controle dos recursos financeiros.
Vale mencionar que o ITCMD sobre a transferência de bens no exterior em razão de falecimento só poderia ter sido instituído por lei complementar federal (art. 155, §1º., III, b) da Constituição Federal) e a lei complementar instituída pelo Estado de São Paulo foi julgada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça paulista, aguardando hoje julgamento com repercussão geral pelo STF.
Ainda, brasileiros com residência fiscal nos EUA, Portugal, Suíça, Reino Unido etc. devem examinar a organização do seu patrimônio da perspectiva do ordenamento jurídico desses países, em duplicidade ou não com o brasileiro. Fora os EUA, os destinos mais procurados por brasileiros no exterior promovem regimes tributários favorecidos da pessoa física e também costumam ser em si próprios instrumentos de planejamento patrimonial.
Com relação à pandemia do novo coronavírus, não há muito que possamos fazer senão, se possível, ficar em casa e enfrentar as suas consequências econômicas. Mas, por vezes, há ainda muito que pode ser feito na organização dentro de casa.
Agronegócio está na mira da fiscalização tributária
É fato incontroverso que o setor do agronegócio tem sido de fundamental importância para o desenvolvimento econômico e social brasileiro, seja pela sua representatividade no PIB e nas exportações, como ainda pela própria vocação existente em nosso país para seu exercício.
Da mesma forma, não resta dúvida de que sua tributação, por força de suas peculiaridades e propósitos, inclusive, constitucionais, deve ser regulada de forma a ser fomentada e incentivada, o que se concretiza por meio de instrumentos fiscais de incentivos e tratamento diferenciado, o que não se confunde com privilégio.[1]
Apesar de sua importância e necessidade de instrumentos fiscais de fomento e tratamento peculiar, percebe-se que as medidas tributárias nos tempos atuais têm entre seus objetivos alterar esta realidade, extinguindo, inclusive, com claro risco de aumento da carga fiscal.
Isto pode ser comprovado, por exemplo, por projetos que pretendem revogar tributação da cesta básica com alíquota zero de PIS e COFINS, Projetos de Reforma Tributária que tratam o setor como todos os demais, ignorando suas peculiaridades, necessidades e importância[2], além dos próprios incentivos de ICMS como é o caso do Convênio 100/97.
Também não devemos olvidar do atual movimento dos Municípios, os quais, após receberem a delegação quanto à fiscalização e cobrança do ITR, tem realizado medidas arbitrárias quanto à exigência deste imposto, sobretudo, com relação ao VTN, ônus da prova, competência territorial e lançamentos de ofícios.
Todavia, o movimento de agravamento em face do setor do agronegócio vai além de tais exemplos, uma vez, atualmente, quem pretende apontar sua mira é a Receita Federal.
A Receita Federal, como de costume, anualmente, faz a divulgação de seu “Plano Anual de Fiscalização”, onde temos os números do ano anterior e as ações que pretendem efetivar no ano corrente.
Neste sentido, ao divulgar o plano de ação de 2020, a Receita Federal esclarece que, entre as principais operações, estaria o fortalecimento dos tradicionais cruzamentos de dados das pessoas físicas, onde cita mais especificamente “Omissão de rendimentos e despesas fictícias da atividade rural exercida pelo contribuinte, utilizando também as informações das notas fiscais eletrônicas para identificar eventuais divergências”.
Portanto, o produtor rural pessoa física, no plano anual de fiscalização da Receita Federal de 2020, entra como um dos principais focos de fiscalização, seja quanto às receitas e respectivas despesas.
Diante a informatização e nova realidade existente, uma vez que, atualmente, temos SPED, Livro Caixa Digital do Produtor Rural, Nota fiscal eletrônica, Declaração de Ajuste Anual de IRPF, Declaração de ITR, GFIP, E-social, além das informações bancárias resultantes de movimentações financeiras, o produtor rural ficará exposto à uma nova realidade e rigores fiscais.
Com isso temos, duas consequências relevantes: (i) — além das tentativas de mudanças na legislação revogando o tratamento diferenciado tributário ao setor, sofreremos um maior rigor quanto às operações fiscais voltadas ao produtor rural; e (ii) – necessidade de maior gestão e organização do ponto de vista fiscal no controle e apuração de seus tributos, bem como planejamentos tributários.
Deste modo, cabe este alerta, pois sabemos que, ainda, não são todos os produtores rurais que estão devidamente estruturados para enfrentar a severa atuação da fiscalização tributária, especialmente, da Receita Federal.
E, por outro lado, o foco da não se encerra em face do produtor rural, na medida em que também consta entre os objetivos principais da fiscalização em 2020:
“Planejamento tributário internacional abusivo e erosão da base tributária do IRPJ
As exportações de commodities apresentam valores relevantes em nosso país. Entretanto, as informações declaradas revelam que os maiores adquirentes de tais mercadorias se localizam em paraísos fiscais ou países de tributação favorecida, enquanto que os destinos dos produtos nos embarques são efetivamente os maiores consumidores, em prática conhecida por “triangulação na exportação”.
Tais operações triangulares visam à transferência do lucro operacional para que sejam tributados em paraísos fiscais ou países com tributação favorecida, deixando-se de pagar o Imposto de Renda Pessoa Jurídica devido no Brasil.
Foram identificados contribuintes que realizam 100% de suas exportações por meio de tais triangulações simulando operações mercantis justamente para transferir ao exterior o lucro das verdadeiras operações de compra e venda.”
Naturalmente, por sua vocação exportadora e serem os produtos rurais em sua maioria comodities, mais uma vez o agronegócio ficará exposto à fúria da Receita Federal no tocante a tais operações, supostamente, denominadas de “planejamento tributário abusivo”.
Possível, assim, concluir que, infelizmente, um dos principais setores econômicos nacionais, o qual deve ser fomentado e garantido, tem sido objeto de “ataques tributários”, os quais somente prejudicarão à própria sociedade, economia nacional e participação do Brasil no cenário internacional.
Da mesma forma que muitos outros países tem orgulho e defendem suas vocações, está na hora de termos uma verdadeira defesa de um dos principais (para não dizer principal) segmentos econômicos do Brasil, com relevância inquestionável no cenário internacional.
[1] https://www.conjur.com.br/2017-out-20/direito-agronegocio-tributacao-diferenciada-agronegocio-nao-privilegio
[2] https://www.conjur.com.br/2019-dez-27/direito-agronegocio-reforma-tributaria-dialogo-agronegocio
Impactos tributários relacionados as doações de mercadorias e dinheiro em tempos de covid-19
Eduardo F. de Souza Weyll e Isadora Monteiro Menezes
Diante da complexidade da legislação tributária as empresas que realizam as ditas doações têm encontrado dificuldades para entender como se enquadram as suas operações no que concerne a incidência dos tributos diretos e indiretos e quais são os seus reflexos.
sexta-feira, 12 de junho de 2020
Nesse momento de dor e luto por conta do novo coronavírus, a solidariedade e o altruísmo estão sendo importantes ferramentas de mitigação dos impactos sociais relacionados a pandemia. Isso porque, diversas pessoas físicas e jurídicas em sentimento de solidariedade buscam através de gestos de benevolência auxiliar no combate à doença, seja através de doação de dinheiro, seja através de doações de mercadoria.
Com o passar dos dias nos deparamos com o aumento das notícias de grandes doações efetuadas por empresas privadas, e em alguns casos, inclusive é feito ajuste na matriz de produtos e parque fabril para produção e consequente doação.
De acordo com o Monitor das Doações Covid-191, que agrega os dados públicos sobre iniciativas filantrópicas voltadas ao enfretamento a doença, empresas e pessoas físicas doaram até 30 de abril de 2020 cerca de 3,9 bilhões de reais.
Diante da complexidade da legislação tributária as empresas que realizam as ditas doações têm encontrado dificuldades para entender como se enquadram as suas operações no que concerne a incidência dos tributos diretos e indiretos e quais são os seus reflexos.
Sob essas premissas, este artigo busca dirimir pragmaticamente de que forma os tributos incidem ou não em cada situação quando o doador for pessoa jurídica.
É importante estabelecermos previamente a definição do instituto da doação, em razão de serem dela os respectivos reflexos tributários objeto deste estudo, por força do artigo 110 da lei 5.172/66 (Código Tributário Nacional)2, que determina que a legislação tributária definirá os efeitos tributários a partir da definição dada pelo direito privado para os institutos de direito privado.
Nas palavras de Flávio Tartuce3, seguindo o que estabelece o art. 538 do Código Civil, a doação ocorre quando:
“o doador transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o donatário, sem a presença de qualquer remuneração. Trata-se de ato de mera liberalidade, sendo um contrato benévolo, unilateral e gratuito”
Superado o entendimento jurídico do que é doação, passemos a análise tributária.
- Da doação de mercadoria
As empresas que são tributadas pelo ICMS e IPI, ao promoverem a doação de suas mercadorias a entidades filantrópicas ou órgãos governamentais estão sujeitas a tributação de ICMS e IPI.
Conforme a legislação infraconstitucional vigente, isso ocorre porque a saída de produto ou mercadoria de estabelecimentos comercial ou industrial se configura como fato gerador desses impostos, não levando em consideração o motivo da respectiva saída ou a ausência de contraprestação.
1.1 ICMS
Essa regra pôde ser evidenciada na doação de remédios que não puderam ser comercializados pela Industria farmacêuticas ao Estado de São Paulo, no ano de 2017. Essa doação, a princípio, ocorreria com o devido pagamento do imposto, todavia, o Estado promulgou Decreto que isentou os laboratórios de pagarem o imposto de ICMS. Logo, caso não tivesse havido a regulamentação para isentá-los do imposto, o ICMS seria devido.
Contudo, há uma única exceção admitida pela legislação do ICMS: quando as doações são efetuadas a entidades governamentais ou assistenciais, reconhecidas como de utilidade pública, para assistência de vítimas de calamidade pública decretada por ato de autoridade competente.
Nesses casos, a legislação prevê nos requisitos do artigo 14 do Código Tributário Nacional, conforme Convênio ICM 26/75, prorrogado pelo Convênio ICMS 151/94, que essas doações serão isentas de ICMS, não havendo, portanto, a exigência de estorno do crédito em relação a entrada de mercadorias ou insumo objetos das saídas isentas, como também é assegurada a manutenção do crédito do imposto.
Sendo satisfeitos os requisitos, tais como, ser portadora do Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos fornecido pelo Conselho Nacional de Serviço Social, a desoneração se aplica. Caso contrário, a base de cálculo do ICMS da doação que não estiver abarcada pela isenção será o valor da operação de que decorrer a saída da mercadoria, acrescido da parcela do IPI, quando for o caso, consoante artigo 13, inciso I, da lei complementar 87/96. Ressalva-se que como base de cálculo pode ser utilizado o valor de custo ou de aquisição do produto, desde que seja o valor efetivo da respectiva operação.
Salienta-se, também, que caso a mercadoria seja proveniente de outro Estado, o estabelecimento destinatário deverá, se for o caso, recolher a diferença entre as alíquotas interna e interestadual do ICMS, aplicando-se, inclusive sobre o valor da prestação do serviço de transporte.
Em sendo assim, observa-se que a saída a qualquer título de mercadoria de estabelecimento contribuinte, configura fato gerador do imposto, exceto se houver alguma disposição específica na legislação em contrário.
Portanto, em regra, a operação de doação, configura fato gerador do imposto, no entanto, o contribuinte deverá observar se na operação específica a ser realizada haveria alguma hipótese específica de isenção frente ao produto ou as pessoas envolvidas em tal operação.
1.2 IPI
Diante da redação dos art. 35 e 39 do RIPI, a saída de mercadoria do estabelecimento industrial ou equiparado, configura fato gerador do imposto, independentemente do título jurídico adotado para a operação.
Assim sendo, devido a inexistência de previsão específica que afaste tal regra na operação de doação, tem-se que resta configurado o fato gerador do imposto, estando, portanto, sujeita a doação a regra geral de tributação do produto. Por conta disso, o não pagamento dependerá de edição de atos normativos a ser realizada pelo poder Executivo, conforme se preceitua no art. 150, § 1, da CRFB.
Deste modo, com não há previsão específica que afasta de tal regra de incidência na operação de doação, temos que esta configura fato gerador do imposto, estando sujeita assim a regra geral de tributação do produto. E por isso, o não pagamento dependerá de edição de atos normativos a ser realizada pelo poder Executivo, conforme se preceitua no art. 150, § 1, da CRFB.
Nesse sentido, em razão da covid-19, o Governo Federal editou o decreto 10.285/20, onde se estabeleceu que as alíquotas do IPI passariam a zero sobre os produtos destinados ao combate do Coronavírus, que estivessem listados na referida regulamentação, estando, dentre eles, gel antisséptico, luvas e outros.
Caso não esteja elencado na lista prevista no Decreto, as alíquotas permanecem as mesmas. Para esses, e todos os demais casos de doação ou cessão gratuita de mercadoria sem desoneração, a base de cálculo do IPI será o valor da operação de que decorrer a saída do estabelecimento, consoante artigo 131, inciso II, decreto 4.544 de 2002.
1.3 PIS e Cofins
As Contribuições de PIS e da Cofins tem como fato gerador a geração mensal de receita bruta de vendas e serviços da pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.
Nesse viés, pontua-se que para a empresa que doa mercadorias, a sua operação não é classificada como "receita", mas sim como "despesa". Importante ressaltar que a natureza sempre será de despensa, não importando se a despesa é passível de dedução de base de cálculo de IR e CSSL. Por essa razão, não existe a tributação de PIS e Cofins, uma vez que a doação e cessão gratuita de bens não compõem a receita bruta mensal da empresa doadora.
No que tange aos créditos referentes as mercadorias que foram adquiridas para revenda e não foram revendidos, por terem sidos doados, em regra (não havendo legislação específica permitindo a manutenção do crédito), os respectivos créditos deverão ser estornados.
1.4 Imposto de renda e contribuição social sobre o lucro líquido
As doações e contribuições em regra não apresentam deduções do Imposto de Renda, conforme preceitua o caput do artigo 377 do decreto 9.580/18.
Entretanto, existem algumas exceções a essa regra, que são aplicadas somente as empresas do regime tributário do Lucro Real.
Explica-se, as empresas do Lucro Real apuram os tributos de IRPJ e CSLL através do lucro líquido apurado na contabilidade, enquanto, a de Lucro Presumido o fazem sobre alíquotas de presunção de Lucro aplicado sobre o faturamento da empresa, o que impede de gerar essas deduções.
Também não se aplica a empresas do Simples Nacional por estas pagarem todos os tributos por meio de alíquota que incide sobre o faturamento, independente de apuração do lucro.
Ultrapassado esse ponto, tem-se que conforme a Legislação de Imposto de Renda, é possível ocorrer deduções quando:
I – as doações sejam efetuadas às instituições de ensino e pesquisa cuja criação tenha sido autorizada por lei federal e que preencham os requisitos a que se referem os incisos I e II do caput do art. 213 da Constituição, até o limite de um e meio por cento do lucro operacional, antes de computada a sua dedução e a de que trata o inciso II;
II - as doações, até o limite de dois por cento do lucro operacional da pessoa jurídica, antes de computada a sua dedução, sejam efetuadas a entidades civis, legalmente constituídas no País, sem fins lucrativos, que prestem serviços gratuitos em benefício de empregados da pessoa jurídica doadora e de seus dependentes, ou em benefício da comunidade onde atuem;
III – As doações sejam efetuadas as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP, desde que regularmente constituída e com condição de utilidade pública vigente, com limite de 2% do lucro operacional da pessoa jurídica, antes de computada a sua dedução.
1.5 ITCMD
O fato gerador do ITCMD é também a transmissão por doação de quaisquer bens ou direitos, art. 151, I, CRFB, cujo contribuinte é o donatário. Em se tratando de mercadoria, cujas saídas são tributadas pelo ICMS, não haverá incidência do ITCMD, por exclusão, sob pena de dupla incidência sob uma mesma base de cálculo.
- Da doação em dinheiro
2.1 Imposto de renda e contribuição social sobre o lucro líquido
Aplicam-se as mesmas regras da doação de mercadorias, contudo, para redução da base de cálculo do Imposto de Renda e Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido deve ser respeitado o requisito de que as doações sejam realizadas por meio de crédito em conta bancária de titularidade da entidade beneficiária que atendam aos requisitos da lei.
2.2 ITCMD
Conforme demonstrado acima, o fato gerador do ITCMD é também a transmissão por doação de quaisquer bens ou direitos, art. 151, I, CRFB.
Por ser um imposto de competência estadual, assim como o ICMS, cada estado estabelece a alíquota devida para a doação, sendo que alguns utilizam da alíquota fixa e outras a progressiva, tendo como teto determinado pelo Senado Federal a alíquota de 8%, razão pela qual, recomenda-se a observação da legislação estadual pertinente antes da realização ou recebimento da doação.
No Rio de Janeiro, por exemplo, até o fim do ano-calendário de 2020, só haverá incidência de ITCMD, nas doações em dinheiro, de valor que ultrapasse o equivalente a 11.250 UFIRs-RJ x 3,5550 = R$ 39.993,75[4]. Ressalta-se que as alíquotas nesse estado são progressivas, variando a porcentagem de imposto devido a depender do valor a ser doado.
No caso de doação de empresas a entidades sem fins lucrativos, a legislação prevê que caso a entidade seja imune ou isenta deste imposto, é necessário que exista documento que comprove que o valor foi doado, como também, o fundamento legal que determina a isenção ou imunidade. Esse documento deve estar a disposição da entidade sem fins lucrativos, visto que essa é a que tem a obrigação tributária de recolher o tributo, ficando o doador solidariamente responsável a recolher o tributo.
- Conclusão
Em que pese a solidariedade e o altruísmo serem atitudes louváveis, e por isso devem ser incentivadas pelo poder público, a verdade é que em regra a doação é tributada.
Por tal razão, o planejamento do “o que’’ doar é importante, pois ao produzir e doar mercadorias que não estão em seu objeto social, poderá ainda trazer responsabilidade tributária decorrente dessas operações para os administradores das empresas, pois estaria indo de encontro com o contrato ou estatuto social, conforme preceitua o art. 135 do CTN.
Por isso os administradores de empresas devem considerar os valores correspondentes aos tributos além do valor e/ou produto efetivamente doado, e em sendo possível, planejar as doações para aproveitar as isenções legais vigentes, pois assim irá otimizar os valores de sua colaboração social.
_________
2 Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
3 TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2017.
4 Fundamentação Legal: Lei 7.786/17, de 17.11.17
Arrecadação de ICMS no RS apresenta queda de 28,5% em maio
A Receita do Rio Grande do Sul publicou nesta quarta-feira (10) a atualização sobre os impactos da Covid-19 nas movimentações do ICMS. O resultado da arrecadação em maio aponta redução de 28,5% (R$ 825 milhões) frente ao mesmo período de 2019, em números atualizados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Os valores se referem em grande parte a fatos geradores do mês anterior, abril, período de maior intensidade das medidas restritivas.
Com o resultado de maio, a arrecadação acumulada de ICMS no ano totaliza R$ 13,9 bilhões – uma queda de 6,4% (R$ 961 milhões) frente a 2019. Os números refletem os impactos da pandemia, visto que no primeiro trimestre o desempenho foi positivo, com crescimento de 3,5% em números reais, fruto, entre outros fatores, das medidas da agenda Receita 2030, que consiste em 30 iniciativas para modernização da administração tributária gaúcha. Em abril, por sua vez, já houve queda de 14,8% (cerca de R$ 450 milhões) nos valores, movimento que foi acentuado em maio.
Na visão da arrecadação por setores, apenas quatro registram variação positiva no acumulado do ano: Agronegócio (+10,8%), Supermercados (+8,9%), Energia Elétrica (+2,4%) e Produtos Médicos e Cosméticos (1,5%). Os outros dez apresentam queda em 2020, sendo os mais afetados o de Calçados e Vestuário (-34,1%) e o Metalmecânico (-25,9%). "Esses números refletem as movimentações econômicas dos segmentos e são corroborados pelos demais indicadores acompanhados. Na arrecadação de maio, o cenário foi ainda pior que no acumulado, pois apenas Supermercados e Transportes tiveram variação positiva", salienta Ricardo Neves, subsecretário da Receita Estadual.
Se por um lado os números da arrecadação apresentam quedas bruscas, por outro os principais indicadores econômico-fiscais revelam uma retomada gradual das atividades. Na última semana (30 de maio a 5 de junho), a emissão de Notas Eletrônicas voltou a registrar crescimento (+5%) frente ao período equivalente do ano anterior, o que não ocorria desde março. No acumulado do período de análise (16 de março a 5 de junho), a redução é de 10%, ou seja, cerca de R$ 200 milhões deixaram de ser movimentados, em operações registradas nas notas eletrônicas, a cada dia.
Na visão por tipo de atividade, a Indústria apresentou sua primeira variação positiva desde março, com acréscimo de 3%. As principais mercadorias responsáveis pelo indicador positivo são soja, arroz e biodiesel. Além disso, setores de Aves e Ovos, Eletroeletrônico, Móveis, Produtos de Limpeza e Máquinas e Equipamentos saíram de perdas para ganhos na última semana. Os setores de Madeira, Cimento e Vidro e Tratores e Implementos Agrícolas performaram no sentido inverso, indo de ganhos para perdas.
Em relação às vendas do Varejo, o indicador também realizou sua melhor performance desde março, com queda de apenas 1% em relação ao mesmo período de 2019. O setor varejista de Veículos foi um dos destaques, visto que variação passou de -27,5% para +3,5% na última semana.
Tributação de mercadorias importadas divide indústria e comércio perante o STF
Uma discussão que perdura anos no Judiciário e que põe de lados opostos indústria e comércio teve início no STF na última sexta-feira. Debate-se, em dois recursos apresentados por contribuintes contra a União, a incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre mercadorias provenientes do exterior. Nos casos, não se discute a cobrança do IPI no desembaraço aduaneiro, mas posteriormente quando da saída do estabelecimento importador sem que tenha havido nova industrialização, beneficiamento ou recondicionamento.
O assunto já teve muitas reviravoltas no Judiciário, mas tudo indica que agora terá sua definição. De um lado, as empresas recorrentes (e a CNC) defendem que a tributação é inválida porque não ocorre industrialização, mas mera revenda de mercadoria nacionalizada, o que é fato gerador apenas do ICMS e não do IPI. Argumenta-se, ainda, que essa exigência de IPI agride a isonomia, pois a mercadoria importada, depois de nacionalizada com o desembaraço, merece o mesmo tratamento tributário da produzida no país, que não tem cobrança de IPI na mera revenda.
Doutro lado, a União (e Fiesp/Firjan) sustentam que a cobrança é autorizada pela Constituição e pela legislação do IPI, que equipara o importador à industrial. Ademais, alegam que essa tributação serviria para igualar o preço dos produtos (nacionais e nacionalizados) no país, evitando um processo de desindustrialização.
Estudo elaborado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) trazido aos autos pela CNC demonstra em números que a dupla incidência do IPI tem promovido um aumento desproporcional e desigual da carga tributária sobre as operações com produtos importados, gerando, inclusive, um aumento indireto de outros tributos incidentes sobre essas mercadorias, a exemplo das operações que se sujeitam ao ICMS-ST, e, por essa razão, onera sobremaneira o preço final de revenda desses bens. Com isso, a manutenção dessa dupla incidência de IPI gera um custo fiscal que (i) diminui a competitividade das empresas comercializadoras de mercadorias importadas, em termos de preços e custos; (ii) afeta o poder de compra dos brasileiros; (iii) restringe o livre acesso a produtos específicos, que não necessariamente são produzidos pela indústria nacional; e, (iv) em última instância, acirra o domínio do mercado pelas empresas comercializadoras de produtos nacionais.
Contrariamente ao estudo da FIPE, a Fiesp e a Firjan alegam, também com base em números, que a dupla incidência do IPI é necessária para proteger a indústria nacional contra a entrada menos onerosa de produtos importados, sendo que a ausência desse ônus tributário adicional colocaria em desvantagem os preços das mercadorias produzidas no Brasil.
Como se vê, os dois lados possuem fortes argumentos, tanto jurídicos quanto econômicos. Este artigo não pretende se aprofundar nas teses das partes do processo, mas sim apresentar o que podemos aguardar da manifestação do STF. Afinal, por se tratar de um Tribunal que julga as mais relevantes questões constitucionais do país, ele deve orientar suas posições no sentido de harmonizar o sistema tributário, de modo a compatibilizar as leis ao que a própria Corte já interpretou da Constituição.
Nesse sentido, convém lembrar que o STF, em 2016, apreciou a incidência do IPI sobre a importação de veículos por pessoa física. À época, a Corte compreendeu ser válida a tributação, pois, ainda que a pessoa física não promova qualquer industrialização, esta ocorreu fora do país, o que estaria no campo de incidência quando da entrada da mercadoria no país. Ademais, tal tributação colocaria em igualdade a indústria nacional e a internacional, o que não ocorreria se o produto importado entrasse no país sem pagar o IPI no desembaraço.
Tal precedente é de extrema relevância para a atual controvérsia, pois nele vemos que o STF sinalizou que a Constituição, para fins tributários, demanda algum processo de industrialização prévio para que a União possa cobrar o IPI sobre determinada operação (seja de saída da mercadoria que já está no país, seja na entrada quando ela vem do exterior). Ou seja, dentro desse racional, no caso dos veículos importados por pessoas físicas, seria válida a incidência no desembaraço, visto que houve industrialização prévia à entrada do bem no país. Nos casos ora em julgamento, também seria válida essa cobrança do IPI no desembaraço, mas a saída dessa mesma mercadoria, quando já nacionalizada, só permitiria nova incidência se esta sofresse nova industrialização.
Confirmando que essa é a posição da Corte sobre o tema, o Ministro Marco Aurélio Mello, relator dos dois processos ora em julgamento no STF, disponibilizou seu voto no sítio eletrônico do STF. O Ministro é textual em dizer que a “interpretação que a União busca conferir ao termo ‘operações’, como passível de levar a tributação de qualquer negócio comercial a envolver produto industrializado, consubstancia verdadeiro desvirtuamento do figurino constitucional, possibilitando, inclusive, eventuais abusos por meio da proliferação de equiparações desvinculadas de qualquer correspondência com a produção industrial em si.”
Acreditamos que a maioria dos integrantes da Corte seguirão o voto do relator justamente porque a questão constitucional de fundo já foi definida no precedente mencionado. Com efeito, a despeito de as partes terem trazido aos autos dados e argumentos econômicos relevantes para ilustrar os reflexos da causa, acreditamos que o STF deverá seguir sua tradição e, exercendo seu papel de intérprete e guardião da Constituição, realizará um juízo estritamente jurídico e coerente com sua própria jurisprudência para declarar que a incidência do IPI na revenda de bens importados quando não há nova industrialização, beneficiamento ou recondicionamento é, como já se manifestou, incompatível com o texto da Constituição.
*Flavio Eduardo Carvalho, membro da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/DF e sócio do Schneider, Pugliese Advogados
*Tiago Conde, presidente da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/DF, sócio do Sacha Calmon, Misabel Derzi Advogados e professor do IDP
*Alberto Medeiros, membro da Comissão de Assuntos Tributários da OAB/DF, sócio do Stocche Forbes Advogados e professor do IDP
Contribuinte obtém na Justiça o direito a novo julgamento no Carf
Sentença tem como base a Lei nº 13.988, que acabou com o voto de desempate
Por Adriana Aguiar — De São Paulo
Uma empresa do Rio de Janeiro obteve na Justiça Federal o direito a um novo julgamento no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), por ter perdido disputa com a Receita Federal pelo chamado voto de qualidade - o desempate pelo presidente da turma julgadora. A sentença é a primeira que se tem notícia com base na Lei nº 13.988, que acabou com a prática e determina a vitória do contribuinte em caso de empate.
A decisão é da juíza Geraldine Vital, da 27ª Vara Federal do Rio de Janeiro. Ela determinou a volta do caso ao Carf apesar de o pedido de anulação do julgamento ter sido apresentado pelo contribuinte antes da edição da Lei nº 13.988, de 14 de abril.
O caso é de uma empresa do setor de alimentos que importa insumos para fabricar uma espécie de carne desidratada, posteriormente exportada. Ela discute autuação fiscal por ter usufruído, entre 2004 e 2007, dos benefícios do drawback suspensão - que permite desoneração de impostos na importação vinculada a um compromisso de exportação. A Receita Federal entendeu que o contribuinte não teria preenchido todos os requisitos formais necessários para a obtenção dos benefícios.
A empresa foi autuada em cerca de R$ 25 milhões, montante que conseguiu reduzir desde a análise do caso pela primeira instância - Delegacia da Receita Federal de Julgamento (DRJ). O valor atual está em cerca de R$ 800 mil e inclui Imposto de Importação, IPI, PIS, Cofins.
Em julho de 2016, a empresa conseguiu derrubar a autuação na 1ª Turma da 4ª Câmara da 3ª Seção do Carf, mas acabou perdendo na Câmara Superior, por meio do voto de qualidade, que restaurou em parte o auto de infração (acórdão nº 93030 07.378). Com a derrota, resolveu questionar o desempate desfavorável no Judiciário.
Segundo o advogado Gustavo Falcão, sócio da Manucci Advogados, que assessora a empresa, o voto de desempate proferido pelo presidente da Câmara Superior, contado em dobro, desequilibra a relação processual, viola o devido processo legal e os princípios da isonomia, legalidade e da moralidade. “O julgamento estava quatro a três a favor do contribuinte. Se o voto do presidente contasse como o dos outros, haveria empate no julgamento. E em caso de empate, deve prevalecer o entendimento favorável ao contribuinte”, diz.
A empresa entrou com ação judicial em novembro. Com a edição da nova lei que veda o voto de qualidade no Carf, em abril, os argumentos apresentados ganharam ainda mais força, de acordo com o advogado. A Fazenda Nacional, porém, defende no processo a legalidade da medida e destaca a possibilidade de o contribuinte levar a discussão de mérito ao Judiciário.
Ao analisar o caso, a juíza Geraldine Vital observou que, como o julgamento no Carf é feito por turmas paritárias, “não raro há casos de empate no resultado, em que necessário ser decidido por voto de qualidade do presidente da turma de julgamento”. Diferentemente dos processos judiciais, acrescentou, em que o presidente da sessão não toma parte na votação e “resolve o impasse do empate pelo chamado voto de minerva”.
Para a juíza, as normas regimentais que preveem o voto de qualidade não podem se sobrepor à prescrição contida no artigo 112 do Código Tributário Nacional. Pelo dispositivo, “a lei tributária que define infrações, ou lhe comina penalidades, interpreta-se da maneira mais favorável ao acusado, em caso de dúvida. No caso, o placar, antes do voto de qualidade, estava em quatro a três para o contribuinte.
Por fim, ela destacou que agora vigora o artigo 28 da Lei nº 13.988/2020. Determina que em caso de empate no julgamento do processo administrativo não se aplica o voto de qualidade, “resolvendo-se favoravelmente ao contribuinte”. “Considero, contudo, que como a lei em tela foi superveniente ao julgamento dos recursos administrativos, cuja matéria foi judicializada, deva-se garantir ao próprio Carf o rejulgamento do caso, afastado o instituto do voto de qualidade na espécie”, afirma em sua decisão.
Ainda cabe recurso, mas se prevalecer a sentença deve ser realizado um novo julgamento do mérito no Carf, segundo o advogado Gustavo Falcão. Para ele, a decisão deve servir de precedente para casos semelhantes, em embates nos quais os contribuintes perderam por voto de qualidade.
Maurício Faro, sócio do BMA Advogados, considera a decisão importante por abordar e aplicar a lei nova, mesmo em ação judicial anterior à sua edição. “É uma boa notícia para diversos contribuintes que estão na mesma situação”, diz o advogado.
Em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informa que “pretende impugnar a decisão oportunamente, por meio do recurso cabível, ressaltando que ainda não ocorreu a intimação da Fazenda Nacional”.
De acordo com o coordenador-geral de Contencioso Administrativo Tributário, Moisés de Souza Carvalho Pereira, “a juíza não aplicou a nova regra de desempate no Carf, conforme o trecho da sentença transcrito na resposta inicial”. Se houvesse aplicado o artigo 28 da Lei nº 13.988/2020 (ou seja, o artigo 19-E da Lei nº 10.522/2002), acrescentou, a sentença teria exonerado o crédito tributário.
Reforma Tributária em tempos de crise: necessidade x cautela
Lucas Simões de Andrade
O presente artigo busca analisar eventuais benefícios e malefícios que as propostas colocadas à mesa do Congresso Nacional podem trazer aos contribuintes brasileiros, bem como as consequências que uma reforma imediatista poderia causar.
Introdução
A necessária reforma do sistema tributário nacional é um tema que vem sendo amplamente ventilado nos últimos meses nos corredores do congresso nacional, tendo em vista a recente aprovação da reforma na previdência, e o constante caos econômico e político em que se encontra o Brasil nos últimos anos.
Assim, muitos políticos, empresários e a sociedade como um todo, vem tratando a reforma tributária como uma das pautas essenciais para que o Brasil possa visualizar uma luz no fim do túnel na sua economia. Ou seja, uma medida de suma necessidade para retomar as diretrizes positivas do cenário socioeconômico do país.
Entretanto o presente artigo busca analisar eventuais benefícios e malefícios que as propostas colocadas à mesa do Congresso Nacional podem trazer aos contribuintes brasileiros, bem como as consequências que uma reforma imediatista poderia causar.
Antes de adentrar especificamente às modificações que referida reforma traria ao sistema tributário brasileiro, cumpre ressaltar a principal questão que envolve toda essa alteração normativa do sistema de arrecadação nacional, qual seja: a criação de um único imposto federal que tem por objetivo unificar os tributos que, atualmente, são as maiores fontes de arrecadação da União, dos estados e dos municípios.
Imposto sobre Bens e Serviços (IBS)
Conforme supra destacado, a proposta de reforma tributária traz como principal alteração a criação de um imposto federal unificado, o IBS (modelo de Imposto Sobre Valor Agregado – IVA, utilizado em vários países).
A criação do imposto em questão tem como principal característica a centralização e desburocratização do sistema arrecadatório.
Atualmente no congresso existem duas propostas de emendas constitucionais que são vistas como as principais para reforma do sistema de tributação brasileiro: A PEC 45/2019 (prevê a extinção do PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS) e a PEC 110/2019 (prevê a extinção do PIS, COFINS, IPI, ICMS, ISS, IOF, salário-educação, CIDE-combustíveis e Pasep).
No presente estudo vamos dar um enfoque maior na proposta trazida pela PEC 45/2019, que tem sido a mais aceita nas mesas de debate, com a finalidade de demonstrar como será realizada a instauração desse novo sistema.
Resumindo, a instituição do IBS levaria à extinção, ou melhor dizendo, à substituição do PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS, sendo estes as principais fontes de arrecadação em matéria tributária do estado brasileiro.
Mas como se daria a arrecadação por meio deste novo imposto?
Basicamente o IBS é um imposto de caráter nacional, cuja alíquota será formada pela soma das alíquotas no âmbito federal, estadual e municipal, e incidirá sobre base ampla de bens e serviços.
Ademais, referido imposto terá caráter não-cumulativo (adoção do regime de crédito financeiro), sendo cobrado em todas as etapas da linha de produção e comercialização. Ou seja, serão tributadas todas as utilidades destinadas ao consumo.
A ideia é de que a transição tributária ocorra em 10 anos, nos quais:
(i) Nos dois primeiros anos haverá um período de teste no qual será implementada uma redução gradativa da alíquota apenas do COFINS, bem como a implementação de uma alíquota fixa de 1% referente ao IBS;
(ii) A partir do terceiro ano as alíquotas de todos os tributos atualmente existentes (PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS) serão reduzidas em 1/8 por ano até a extinção de todos, e a alíquota do IBS será aumentada para repor a arrecadação anterior.
Por fim, toda a arrecadação do imposto será destinada a um caixa separado do Tesouro Nacional, de tal forma que a União, os estados e os municípios teriam acesso automático aos seus recursos.
Dá análise inicial e superficial da proposta, parece, aos olhos dos contribuintes, que a unificação dos tributos relacionados aos bens e serviços traria enorme simplificação no sistema de arrecadação e no planejamento tributário das empresas, bem como uma diminuição nos encargos fiscais suportados atualmente.
Entretanto, a partir de uma análise mais aprofundada do tema, é possível verificar diversos pontos de relevante controvérsia e significativo prejuízo que os contribuintes possam vir a sofrer. Vejamos:
Contras
Fatores econômicos e sociais:
- Em primeiro lugar, vale ressaltar que a proposta visa única e exclusivamente simplificar o modelo de arrecadação, mas não tem como finalidade reduzir a carga tributária suportada pelos contribuintes. Ou seja, as empresas continuariam, de forma simplificada, pagando o mesmo valor pago atualmente nos tributos cuja extinção se propõe.
Tal ponto é de extrema relevância pois a grande reclamação dos contribuintes hoje em dia se dá em dois planos: sistema tributário complexo e enorme carga tributária.
Segundo levantamento realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a alíquota do IBS se aproximaria do nível de 27%, o que colocaria o Brasil entre os países com maior alíquota do mundo, ao lado de Noruega, Hungria, Dinamarca e Suécia (países de primeiro mundo). Assim, nossa arrecadação continuaria sendo uma das maiores em escala global!
A alta carga suportada não é correspondida em contraprestação aos contribuintes, contrariando um princípio fundamental do direito tributário brasileiro, qual seja o da destinação dos recursos públicos (princípio da retributividade tributária). Ou seja, as pessoas físicas e jurídicas hoje no Brasil não enxergam uma atuação por parte do estado, de forma a fazer valer a quantidade exorbitante de tributos pagos.
Portanto, a reforma tributária acaba por tratar de apenas um dos dois pilares que envolvem a necessidade de revisão do sistema de tributação brasileiro como um todo.
- Ademais, analisando a unificação dos tributos, chega-se à conclusão, de forma prática, que qualquer tratamento de favorecimento para um determinado setor exigirá que as alíquotas sejam mais elevadas para os demais setores, o que acaba por gerar um descompasso e um desequilíbrio econômico, bem como afronta uma igualdade que deveria, ao máximo, permear todos os setores da economia.
- Não obstante, o entendimento trazido pela proposta é o de que o IBS não deve ser utilizado com fins extrafiscais, pois o objetivo da criação de um único imposto seria o de só cumprir o papel de arrecadação.
Ocorre que, neste novo sistema as empresas que hoje fazem jus a benefícios fiscais (e que teriam tais benefícios cancelados), teriam um aumento significativo na sua carga tributária. Além disso, os benefícios fiscais têm como objetivo promover e incentivar o desenvolvimento dos estados mais pobres. Assim, a extinção de tais benefícios poderia beneficiar somente os estados mais ricos, em que as empresas, naturalmente, buscariam investir.
Da administração tributária e os reflexos nos contribuintes:
- Com relação às operações interestaduais e intermunicipais, tanto para a instituição de alíquota como para a cobrança do imposto, seria adotado como competente o local de destino (princípio do destino).
Entretanto, a transição de distribuição de receitas entre os estados e entre os municípios, ou seja, a distribuição entre os entes públicos dos proveitos advindos do IBS e do ISS/ICMS, teria um tempo estimado de 50 anos! À primeira vista, referida transição em nada afetaria o bolso dos contribuintes, mas caso a esse processo não seja realizado de forma totalmente regular e coordenada, poderia vir a ocasionar um aumento na carga tributária suportada;
- Além disso, o projeto prevê que os créditos tributários que os contribuintes fazem jus, seriam substituídos por títulos públicos. Na prática, os contribuintes não poderiam compensar os valores referentes aos créditos que faziam jus, bem como entrariam na enorme e morosa fila de recebimento de títulos públicos;
- Por fim, outro o tema que traz grande atenção e impulsiona grandes discussões sobre a reforma, diz respeito à ameaça do federalismo, bem como necessidade de adesão dos estados ao novo sistema dotado.
Isto porque, o plano é de que cobrança do imposto seja gerida pela União, estados e municípios de forma coordenada e harmonizada, mas o ato arrecadatório seria realizado apenas pelo ente federal. Eventuais litígios seriam tratados da seguinte maneira: contencioso administrativo (primeira instância: estadual; segunda instância: federal) e contencioso judicial (federal). Tal modelo levanta muitas dúvidas acerca da autonomia dos entes federados (tendo em vista a predominância da atividade do ente federal), bem como demandaria uma completa adesão por parte dos estados e municípios, para que se evite conflitos com a União.
Certo é que eventual conflito entre os entes federados, seja por discordância no processo de fiscalização, arrecadação, contencioso ou de distribuição, acabaria, ao final das contas, recaindo em ônus sobre os contribuintes.
Neste ponto, cumpre esclarecer que a proposta trazida pela PEC 110/2019, estipula a criação de uma mesma alíquota de IBS para todos os entes, fixada por lei complementar. Neste sistema, caberia aos estados e aos municípios apena a gestação e regulamentação. Ou seja, esta outra proposta traz ainda mais dúvidas acerca de uma ameaça ao sistema federalista do Brasil.
Prós
- Sentido contrário, é inegável que a unificação dos tributos torna o sistema arrecadatório muito mais simples, além do que tende a reduzir drasticamente o contencioso tributário (tanto administrativo como judicial) e torna muito mais transparente o financiamento de políticas públicas.
A criação de um Imposto sobre valor agregado, traria uma simplificação na verificação da ocorrência do fato gerador (tendo em vista que amplia a base de cálculo, diminuindo a diversidade de formas de incidência), e diminuiria as discussões acerca do montante exato a ser pago (diminuição na multiplicidade de alíquotas), além de possibilitar a tão sonhada solução ao problema da guerra fiscal enfrentada hoje pelos estados e seu contribuintes.
- Não obstante, o novo modelo tem como proposta trazer a desoneração às exportações e aos investimentos, o que fomentaria o mercado interno, atrairia investidores estrangeiros, bem como traria uma maior igualdade na competitividade entre as empresas brasileiras.
- Cabe também ressaltar a questão da celeridade no ressarcimento de créditos acumulados pelos contribuintes pelo novo sistema, sendo este prazo de 60 dias contado a partir do pedido formulado e, em caso de indícios de irregularidade na constituição dos créditos, o prazo seria estendido por mais 120 dias. Entretanto, é necessário se atentar ao fato de que os procedimentos administrativos no Brasil são muito morosos, e o caixa do estado brasileiro não se encontra nos seus melhores dias, de tal forma que a determinação de um prazo célere para realizar referida restituição poderia gerar mais problemas de inadimplência do estado.
- No que diz respeito à destinação da arrecadação tributária, a nova proposta determina a redução na rigidez orçamentária, sem, no entanto, afetar as destinações atuais de recursos. Isto porque, cada alíquota específica do IBS (destinadas a saúde, educação, etc.) seria gerenciada individualmente pelos municípios, estados e União. Desta forma, a possibilidade de decomposição das alíquotas específicas tornaria mais transparentes aos contribuintes as destinações e investimentos de políticas públicas adotadas pelos entes federados.
- Por fim, os defensores da reforma tributária afirmam que (ao contrário do citado no tópico sobre os pontos contrários) os estados mais pobres se beneficiariam do novo imposto. Isto porque, a distribuição da receita teria uma proporção referente à produção e uma proporção referente ao consumo, de tal forma que os estados que consomem mais e produzem menos se beneficiariam dos estados que produzem mais e consomem menos.
Outros pontos
Além dos principais temas que recaem sobre a criação do IBS, outros pontos de debate também devem ser discutidos, estando alguns deles já relacionados à proposta de reforma tributária, e outros não relacionados.
- Diversos tributaristas entendem que acima do nosso complexo sistema de arrecadação, um dos grandes fatores que levam o enorme número de litígios, se deve pela ausência de diálogo entre os contribuintes e a fiscalização. A busca pelo diálogo traria uma diminuição significativa na quantidade de autuações que as empresas sofrem atualmente.
- Outro ponto que também visa diminuir o contencioso tributário e que deve ser pauta de discussão na reforma tributária, é a possibilidade de se implementar um tribunal arbitral de matéria tributária.
Assim como a transação tributária, o processo arbitral não precisaria necessariamente ser regulado pela constituição federal. A ideia é que uma reforma no sistema tributário preveja a possibilidade de criação de um tribunal arbitral, determinando, somente, as diretrizes básicas que o procedimento arbitral deveria seguir.
- Continuando a listagem de outros temas que devem ser objeto de amplo debate, agora no que diz respeito a temas já tratados na proposta de reforma, cabe ressaltar a possibilidade de criação de um imposto seletivo federal incidente sobre produtos que se entende por serem prejudiciais à sociedade, como por exemplo bebidas alcoólicas e cigarros. O debate pela criação de referido imposto tem como fundamento a afronta do princípio da igualdade, bem como da liberdade econômica dos empresários que atuam nesses mercados.
Seria este realmente a forma correta de buscar combater o uso de tais produtos? Ou o enorme encargo tributário trazido por tal seleção teria como único efeito apenas atentar contra o bolso do contribuinte final?
- Outro tributo cuja criação o Governo Federal defende como necessária, seria o imposto sobre pagamentos digitais. O atual ministro da economia defende que a criação deste novo imposto possibilitaria a diminuição da alíquota de IBS em até 11%, o que estimularia o mercado interno.
Entretanto, o tema é visto pelo poder legislativo (presidentes do senado e câmara dos deputados) como inviável, pois o brasileiro não suportaria a criação de mais este imposto, principalmente relacionado sobre suas movimentações financeiras. O diretor do Centro de Cidadania Fiscal também é contrário à instituição deste imposto único sob o argumento de que o mesmo não dispõe de isonomia, transparência e neutralidade.
- Outro ponto de complexidade que merece um debate aprimorado, seria o da criação de um modelo que se adequasse ao atual modelo do simples nacional.
O projeto da reforma traz duas opções para as empresas optantes atualmente pelo Simples Nacional, quais sejam:
(i) manutenção do formato atual, no qual as referências aos atuais tributos seriam substituídas pela IBS. Neste modelo, as empresas, por óbvio, não fariam jus aos créditos do IBS e nem transfeririam créditos do imposto;
(ii) adoção do regime de crédito e débito normal do IBS (o mesmo adotado pelas demais empresas), sendo que as alíquotas incidentes sobre o faturamento seriam adequadas às parcelas atualmente destinadas ao PIS, COFINS, ICMS, ISS e IPI (as demais incidências do SIMPLES sobre o faturamento seriam mantidas).
- A desoneração folha de pagamento é um dos temas estudados que pode integrar a proposta já posta à mesa na câmara dos Deputados. Com isso, para fins de se compensar tais perdas, se estuda a possibilidade de tributação de dividendos.
A reforma tributária é de tanta complexidade e abrangência que ainda caberia mais discussões sobre possíveis alterações que poderiam vir a ter, como as propostas da PEC 110/2019 acerca da: Incorporação da CSLL pelo IRPJ; do ITCMD passar a ser de competência federal; do IPVA passar a atingir novos veículos automotores (aeronaves embarcações), mas excluir outros (veículos destinados à pesca ou transporte público).
Enfim, a reforma tributária abrange muito mais que apenas a unificação de diversos tributos em um único IVA, sendo certo que tais mudanças são tão significativas e merecem o devido destaque nas discussões a serem travadas.
Comentários finais
Conforme mencionado no início, o presente artigo não tem como finalidade apresentar questões de extrema técnica e especificidade, não busca trazer somente os pontos negativos ou somente os pontos positivos da proposta de reforma tributária, e não levanta todos os pontos de debate que a alteração no sistema tributário venha a trazer.
O objetivo aqui é trazer reflexão sobre a necessidade confrontada com a complexidade que uma reforma tributária feita e sancionada às pressas poderia refletir.
Acrescente a tal discussão a crise financeira que o coronavírus trouxe ao mercado brasileiro, cujas consequências serão suportadas durante meses ou anos, razão pela qual os contribuintes buscam na reforma tributária uma suposta solução de melhoria nos seus caixas.
Ao nosso ver, uma reforma que não se atente a todas as futuras consequências que se possam ter, possibilita um aumento nos encargos fiscais suportados pelos contribuintes, bem como um aumento na litigiosidade, indo em sentido contrário ao objetivo da nova sistemática.
Entretanto, cabe destacar que o modelo apresentado parece estar alinhado com a necessidade de evolução no nosso sistema tributário (unificação de tributos), visando a sua simplificação e desburocratização, o que, sem sobra de dúvidas, impulsionaria o mercado nacional.
Por fim, também vale refletir e acalorar as discussões sobre demais pontos que já envolvem, ou poderiam envolver, uma reforma tributária em outros aspectos que também visem a desburocratização do sistema: proximidade entre fiscal e contribuintes durante o processo de fiscalização; possibilidade de se implementar a arbitragem tributária no brasil; a previsão na criação de programas que estimulem o pagamento efetivo de tributos por contribuintes inadimplentes; uma maior atenção às possibilidades não só de criação, mas também de estimulo à adesão, das transações tributárias.
Em suma, a reforma, que visa uma simplificação no sistema tributário nacional, deve ser abarcada por uma vasta bagagem de discussões acerca de diversos temas (não podendo ser tratado de forma simplória), para que se obtenha, ao final, uma sistemática benéfica tanto aos contribuintes com ao estado brasileiro, frisando sempre pela celeridade, responsabilidade e cautela na aprovação deste projeto.
Onda de pedidos de recuperação está no início e afeta mais empresas menores
Segundo as principais consultorias brasileiras no assunto, este ano podem ser registrados até 5 mil pedidos de recuperação judicial
A onda de pedidos de recuperação judicial por parte de empresas, que atinge principalmente setores como turismo, eventos e produções, hotelaria, academias e restaurantes, pode estar apenas no início. É o que adverte o advogado empresarial Victor Passos Costa, que verifica o aumento do número de processos na Justiça envolvendo o tema.
Segundo as principais consultorias brasileiras no assunto, este ano podem ser registrados até 5 mil pedidos de recuperação judicial, o que leva ao maior patamar da história (que até então é de 1,8 mil casos, em 2016). "Pesquisas mostram também que as micro e pequenas empresas são mais vulneráveis neste momento de crise, por terem menos capital de giro", comenta Passos Costa.
A dificuldade de acesso ao crédito é um dos fatores que dificulta a vida das empresas menores, mas essa dificuldade tende a ser atenuada pela publicação da MP (Medida Provisória) 975/2020, nessa terça-feira (2), que faz alterações em duas leis na tentativa de destravar o crédito para as pequenas e médias empresas do País durante a pandemia do novo coronavírus.
Mas o que seria, na prática, a recuperação judicial? "A recuperação judicial nada mais é do que um processo mediado pela Justiça que busca evitar que uma empresa com dificuldades financeiras encerre definitivamente suas atividades. Por meio desse processo, as empresas conseguem um prazo para continuar operando sem pagar dívidas, enquanto negociam seus débitos junto aos credores", explica Victor. No Espírito Santo, de março a 15 de maio, mais de 1,5 mil empresas foram fechadas, segundo a Junta Comercial.
O Especialista acredita que, com a pandemia, o processo de recuperação judicial tende a ser desmistificado. "Muitos empresários acham que pedir recuperação é vergonhoso e que perderão o controle da empresa. Mas esse é um dos problemas e é um mito. Quanto mais se espera, mais a situação da empresa fica insustentável e, consequentemente, há uma falsa sensação de que pode se resolver sem a recuperação", adverte.
Passos Costa orienta que caso a empresa já possua uma dívida impagável mediante formas convencionais, mas possível de ser assumida por meio de um plano de parcelamento longo, por conta da existência de alguma receita, a recuperação judicial não deve ser evitada nem postergada. E uma das razões para isso é o tempo que pode levar para ela ser aprovada.
"Normalmente demora-se ao menos 30 dias para um pedido bem feito, farto do ponto de vista documental. E o advogado tem uma função primordial nesse momento, que é orientar a empresa sobre quais documentos levantar e como se preparar para o que virá pela frente", afirma.
Atualmente, existe um Projeto de Lei já aprovado pela Câmara (1.397/2020) que estabelece regras transitórias para recuperação de empresas durante a pandemia da covid-19. O objetivo é o de prevenir a recuperação judicial e a falência de agentes econômicos e preservar empregos. Ele segue agora para análise do Senado. Na opinião de Victor, caso seja aprovado, será de grande valia para o momento. "Nossa lei, apesar de recente, se mostrou inefetiva em alguns pontos. Por isso, são realmente necessárias algumas alterações", conclui.
Governo pode mandar reforma tributária ao Congresso entre julho e agosto, diz Mansueto
O secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, destacou nesta segunda-feira a importância de se avançar com reformas fiscais passada a crise do coronavírus, principalmente a tributária, dizendo acreditar que "possivelmente" o governo federal encaminhará ao fim do mês de julho ou início de agosto a proposta da equipe econômica ao Congresso.
"Eu acredito, novamente, que até final de julho ou início de agosto a proposta do governo vá ao Congresso, e a gente vai ter todo o segundo semestre para discutir aí e criar algum consenso para aprovar algo de reforma tributária", pontuou Mansueto em webinar organizada pela Câmara Britânica de Comércio e Indústria no Brasil.
De acordo com ele, a orientação das discussões é "muito clara". "A gente tem que reduzir o número de impostos, tornar regras mais simples e avançar, como falei, em uma certa estabilidade", disse, destacando necessidade de maior segurança jurídica para investidores.
Ele também disse que a reforma tributária é uma das mais importantes dentre as que o Brasil precisa fazer, embora não seja fácil e necessite de muito debate. Mansueto afirmou ainda ser preciso acelerar a agenda de concessões e privatizações.
CÂMBIO
Sobre a recente dinâmica da taxa de câmbio, Mansueto afirmou que uma forte valorização do dólar norte-americano ante o real nos últimos dois e três meses decorreu de aversão ao risco no cenário internacional e também de fatores domésticos.
"Quando os investidores começaram a ficar mais otimistas em relação ao resto do mundo, isso também teve um impacto no Brasil. A taxa de câmbio saiu de quase 6 reais por dólar para menos de 5, que era a cotação da última sexta-feira", afirmou.
O dólar à vista caía 2,3%, a 4,8729 reais na venda, às 16h30 desta segunda-feira.
Mansueto disse que um processo de saída de capitais do Brasil começou no ano passado e se intensificou em 2020. Segundo ele, parte desse movimento é explicado pela redução da taxa de juros pelo Banco Central (BC).
Em 2019 até julho, o saldo de investimento em carteira no Brasil (ações e renda fixa) era positivo em 11,8 bilhões de dólares, mas em outubro ficou negativo no ano em 3,6 bilhões de dólares. Pelo dado mais recente (abril de 2020), o Brasil já perdeu 41,3 bilhões de dólares no acumulado desde janeiro de 2019.
A taxa básica de juros, a Selic, começou 2019 em 6,50% ao ano e, atualmente, está na mínima histórica de 3,00%.
Ao ser indagado sobre possibilidade de utilização de recursos para mitigar riscos de variação cambial em contratos de longo prazo como forma de atração de investimentos internacionais, Mansueto disse ser um debate "em aberto".
Para ele, nenhum país do mundo conseguirá dar segurança para o investidor em relação ao valor relativo de moedas caso não consiga avançar nas reformas fiscais de que precisa.
"A gente precisa respeitar o debate político, a gente precisa fomentar o bom debate político e fazer as reformas de que o país precisa, fazer (as reformas) para garantir ao investidor que ele vai ter um bom retorno e (que é) seguro investir em um país como o Brasil. Essa é a receita, eu gosto muito mais disso do que de mecanismo de seguro cambial", complementou.
Dentro de 10 dias, Copom vai testar limite da queda dos juros
No mercado, as apostas estão entre um novo corte de 0,75 ponto percentual na taxa, que iria para 2,25%, ou uma redução menor, de 0,5 ponto
A queda do dólar reforçou a convicção do mercado financeiro de que, quando voltar a se reunir, daqui a 10 dias, o Comitê de Política Monetária (Copom) vai promover um novo corte na taxa básica de juros (Selic) da economia. Porém, o comitê está dividido sobre qual deve ser o limite dos juros. A Selic está na mínima histórica de 3% ao ano, mas deve cair mais para tentar minimizar os impactos recessivos da crise do novo coronavírus. No mercado, as apostas estão entre um novo corte de 0,75 ponto percentual na taxa, que iria para 2,25%, ou uma redução menor, de 0,5 ponto.
A divergência do Copom sobre o piso da Selic foi admitida, ontem, pelo diretor de Política Econômica do Banco Central (BC), Fabio Kanczuk. Ele explicou que os membros do Copom fazem contas diferentes sobre qual deve ser a fronteira da Selic. “Cada agente econômico tem um apetite ao risco diferente, e isso se reflete no Copom. Os membros fazem contas diferentes, conforme o mercado vai andando”, disse o diretor do BC.
Kanczuk ressaltou que o cenário da próxima reunião será diferente das demais, já que as condições da economia e das contas públicas brasileiras se complicaram, nas últimas semanas, em função da crise da covid-19.
Ele lembrou que, de um lado, a pandemia reduziu bruscamente a demanda e a renda da população e das empresas, puxando a inflação para baixo, o que justificaria a redução dos juros. Por outro lado, a dívida bruta do governo subiu bastante, o que eleva a curva futura de juros por si só. “Vai ter que chegar a uma conclusão a partir disso daí”, disse.
O diretor afirmou que, na sua opinião, o BC tem que continuar fazendo política monetária neste momento, antes de pensar em alguma outra forma de atuação. “O Brasil não está no zero lower band (juros em torno de zero). Então, deve continuar fazendo política monetária através do juro de curto prazo, da Selic, porque é mais eficaz, mais eficiente e não tem risco de distorcer a curva longa”, afirmou Kanczuk.
Para o mercado financeiro, o que deve acontecer no Copom é uma discussão sobre a magnitude do próximo corte da Selic. Alguns analistas defendem uma redução da 0,75 ponto, o que levaria a taxa básica a 2,25% ao ano. Este, porém, foi o limite imposto pelo Copom para esta reunião, quando, em maio, reduziu a Selic em 0,75 ponto. “A conclusão era de que, no máximo, fazia-se 150 pontos, ou menos do que isso. Nunca foi dito exatamente o valor. A ideia era fazer 75 pontos ou menos do que isso na próxima reunião”, lembrou Kanczuk.
Precificado
Os analistas dizem, porém, que a crise econômica justifica mais um corte dessa magnitude e afirmam que a queda do dólar nas últimas semanas minimiza o receio de que uma nova redução de juros provoque fuga de capitais do país. Segundo eles, o corte já está precificado pelo mercado. Então, se era uma possibilidade quando o dólar estava a R$ 5,50, é uma possibilidade ainda mais forte agora que o dólar está abaixo dos R$ 5.
Outro grupo do mercado financeiro, por sua vez, entende que o novo corte deveria ser de 0,5 pontos, para deixar a Selic em 2,5% ao ano. O argumento é de que, como a magnitude da crise da covid-19 ainda não está clara, o Copom deveria ser mais moderado, agora, para ter espaço maior para agir nas próximas reuniões, quando os dados sobre a queda da economia brasileira já estarão sobre a mesa.

